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Ronaldo Lima Lins

Escritor e professor emérito da Faculdade de Letras da UFRJ

217 artigos

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Trégua e reflexão

O que se deixou constantemente para o dia seguinte, um amanhã nunca de fato atingido, foi a possibilidade da paz

Manifestação pró-Palestina em São Paulo (Foto: Paulo Pinto / Agência Brasil)

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Ainda que precária e sujeita a erupções em toda parte, e de parte a parte, a trégua estabelecida por israelenses e palestinos na faixa de Gaza pode servir quem sabe para uma reflexão. A instalação de Israel (provavelmente um erro histórico) numa região já habitada há dois mil anos por outras etnias, gerou dramas incontornáveis com as vitórias dos primeiros, enquanto levavam os tradicionais habitantes da região a uma constante defensiva, empurrados aos limites de suas forças. Eram confrontos desiguais, devido ao apoio logístico e belicista dos Estados Unidos, pendendo a balança sempre em favor do Estado judeu. Nas circunstâncias, ficou evidente que a fração de origem árabe não tinha como prosperar, premida contra uma força colonialista e o estabelecimento de um apartheid étnico.

A trégua permite respirar um mínimo de oxigênio, enquanto as forças se reorganizam e se preparam para continuar. Em semelhante contexto, seria permitida uma reflexão a respeito dos traumas e das soluções frente ao embaraço de notória má gestão dos conflitos locais. O que se deixou constantemente para o dia seguinte, um amanhã nunca de fato atingido, foi a possibilidade da paz. Pois de onde ela viria, quando já se matou tanto? A Alemanha de Hitler conheceu os efeitos da crueldade, enquanto perseguidora e opressora dos frágeis, a favor de uma hegemonia jamais obtida. Aprendemos que a crueldade conduz à crueldade, numa volúpia inesgotável de feitos e contrafeitos. Felicidade não advém daí. Fala-se na hipótese de dois Estados, um israelense e um palestino, o que exigiria vontade e extraordinárias doses de diplomacia, além de proporções infinitas de generosidade. Isto por que um só Estado democrático reunindo as duas comunidades se declara de antemão impossível.

No entanto, não pertence à alma humana acomodar-se a tais impasses. As Nações Unidas criaram o monstro que agora afia os dentes e as garras sedento de morte. Tem, até por causa disso, uma responsabilidade dupla de desenvolver projetos que ponham luz na escuridão, doa a quem doer. A limpeza étnica de Israel contra os palestinos coloca-se como inaceitável. Vivemos o apartheid nos Estados Unidos, entre os colonos do sul, e a proposta ruiu, envenenada pela estupidez e pelas noções de justiça. Na África do Sul, igualmente, o apartheid convenientemente desabou, construindo um novo poder com os negros à testa do governo. E alguém ainda crê que prosperará no Oriente Médio por força da opressão desoladora? Ledo engano. O mais pobre e debilitado opositor se erguerá para lutar contra isso e não descansará enquanto não ganhar a guerra...

Com a ferocidade dos armamentos nucleares, hoje não se ignora que os conflitos podem, de repente, se tornar mais perigosos e definitivos do que antes. Convém respeitá-los. E que não se imagine que somente um dos lados recorrerá, eventualmente, à solução final. O clube cresceu às claras ou secretamente e ameaça romper os ditames da lógica, o que aumenta a responsabilidade do mundo. Inaceitável é deixar que as desavenças cheguem tão longe. Um concerto de nações deve evitá-lo e com a balança da justiça, se desejamos realmente reprimir o pior.

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