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Mario Vitor Santos

Mario Vitor Santos é jornalista. É colunista do 247 e apresentador da TV 247. Foi ombudsman da Folha e do portal iG, secretário de Redação e diretor da Sucursal de Brasilia da Folha.

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A Argentina é o Brasil de amanhã

"A magnitude transcendente do retorno do peronismo e do kirchnerismo pode suscitar a ideia que fenômeno semelhante ocorrerá, como que por gravidade, no Brasil", analisa Mario Vitor Santos, do Jornalistas pela Democracia

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Por Mario Vitor Santos, para o Jornalistas pela Democracia - Em recente palestra no Instituto Pátria, em Buenos Aires, este jornalista especulou sobre a semelhança e diferença dos processos políticos e econômicos argentino e brasileiro.  Como corpos gêmeos, os países são fortemente interdependentes no comércio exterior. Suas errâncias políticas se espelham e se perseguem, como ondas ou sombras.

A Argentina sucumbe a um contexto social alarmante: fome, emergência alimentar, miséria crescente, desemprego, endividamento galopante, desigualdade extrema, fuga de divisas e derretimento acelerado da moeda. O Brasil pode ir atrás, pois aplica o mesmo credo fundamentalista disfarçado de austeridade.

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O "default" argentino - expressão proibida na mídia corporativa brasileira adepta em peso do neoliberalismo- é o resultado da irresponsabilidade de um experimento econômico radical levado a cabo pelo macrismo: um balão de gás de corte de subsídios, insuflado pelo furor dos consultores do capital financeiro e animado pelos desígnios dos organismos econômicos internacionais.

Como é possível que tanta destruição produtiva tenha sido concebida em nome de uma ciência econômica é uma pergunta relevante. Em sua filosofia, o filósofo holandês Baruch Spinoza (1632-1677), um dos pais fundadores do pensamento moderno, considerava que sob o ímpeto da razão, é possível que os agentes modifiquem sua natureza, aprendam e modifiquem suas ações. Junto a isso há a ideia de que o bem dos outros provoca a alegria. Ou seja, a razão ativa teria um componente afetivo e estaria ligada a uma utilidade geral.

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Se as urnas em 27 de outubro confirmarem o prognóstico de quase todos os analistas em favor de Frente de Todos e Alberto Fernández na Argentina, o potencial de repercussão internacional será imenso.

À beira do abismo, todavia, Macri e a direita argentina ainda se encontram em estado de negação. O presidente abandona-se a regressões infantis, engendra fantasias de desamparo, abusa ainda mais das metáforas futebolísticas, adere a autos de fé e emite apelos ao sobrenatural.

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A magnitude transcendente do retorno do peronismo e do kirchnerismo pode suscitar a ideia que fenômeno semelhante ocorrerá, como que por gravidade, no Brasil. Afinal, a mesma causa econômica, gerando a mesma miséria, o abandono e a mesma  desigualdade, tende em tese a levar aos mesmos resultados eleitorais.

Erra, porém, quem atribuir a eventual vitoria da fórmula Fernández-Fernández a uma derivação automática da crise econômica. Nem sempre as derrotas em eleições são reflexos mecânicos de falências econômicas.

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Deve-se valorizar a princípio a clarividência de quem, no kirchnerismo e fora dele, soube conhecer melhor as transformações por que passava a sociedade. A ideia de fundo é eleições são vencidas sempre pelos que sabem mais e antes sobre o pulso do  eleitorado. Deve-se também valorizar a cultura política mais sólida, de valores menos deteriorados, dos argentinos.

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Ganha, além disso, não apenas quem sabe mais, mas também quem teve capacidade de organizar e lutar, de manter o diálogo com a população, com argumentos claros, simples e, principalmente, conectou-se com as pessoas de opiniões diferentes.

Em poucas palavras, um motor possível dessa eleição está além da fome e da miséria: trata-se de um aprendizado, de uma retomada de consciência política da sociedade argentina. Seria nesse sentido uma reconexão com a própria memória coletiva, de identidades passadas. Um cronista disse que na Argentina todos são peronistas, inclusive os antiperonistas.

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Aí também tem sua influência, reversa, o exemplo do vizinho brasileiro. Macri correu a abraçar Jair Bolsonaro e tentar surfar a onda inicial de popularidade do alucinado presidente brasileiro. Ninguém anda de braços dados com um personagem tão torpe como Bolsonaro, defensor da ditadura e da tortura, misógino, xenófobo e inimigo do meio ambiente e da ciência, e ainda sim escapa impunemente do escrutínio da consciência desenvolvida nas últimas décadas pelos argentinos e seu sofrido processo histórico de perseguições e resgate da memória.

O arranjo da fórmula presidencial peronista é resultado de uma leitura criativa e a seu tempo ousada da nova subjetividade do país. Associa dois personagens paradigmáticos. Uma, Cristina, encarna o anseio por redenção econômica e social. O outro, Alberto, incorpora a defesa da razão como princípio de respeito aos direitos civis. Como traço de união entre ambos, projeta-se o humanismo como perspectiva da política.

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Ademais, a fórmula transcende e reconfigura as biografias de Alberto e Cristina, retendo ambos o que têm de mais essencial: sempre é necessário abrir mão de disputas históricas em busca de objetivos maiores, que representem o resgate de uma nação.

Alberto sempre esteve junto a Lula em sua luta contra o lawfare que o brasileiro à prisão e quase produz o mesmo com a ex-presidente argentina. O apoio de Lula, com sua carga de seu compromisso com os pobres e as mudanças sociais, aponta o quanto pode ser a revirada argentina expressiva de um ponto de mutação mais geral.

É quando uma nação encontra-se em condições de, por sua decisão, contribuir para barrar a barbárie que ameaça tomar o mundo. Se isso ocorrer, não terá sido a primeira vez. A alegria de Spinoza, de uma ação racional que promova o bem geral, está próxima no vizinho.

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