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Eugênio Trivinho

Professor do Programa de Estudos Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP)

11 artigos

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A coerência da bestialidade

O escandaloso show de insolência da extrema direita diante da morte de milhões de pessoas pela pandemia do COVID-19

(Foto: Youtube)
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A história política da bestialidade haverá de catalogar, em futuro próximo, o mais recente pronunciamento oficial do hóspede do Palácio do Planalto (em transmissão anteontem, 24, em cadeia multimediática) como incomparável exemplo de coerência programática em defesa do neoliberalismo incondicional que articula o governo inteiro.

A seguir, ficam três apontamentos sobre essa conduta discursiva, claríssima em sua prospectiva de destruição generalizada.

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1. Como o ocupante do Palácio representa o capital graúdo nacional e as elites afins, não espanta que todos os seus pronunciamentos (formais ou não) obedeçam à pressão econômico-financeira do sufrágio de 2018, ao custo – bancado com prazer autoconfiante – de exposição de seu castelo de delírios. O capital graúdo, fissurado secamente em números e prejuízos, à vista grossa de sofrimentos e mortes, irritou-se com a “invasão” do discurso médico-sanitário global no território brasileiro, que recomenda, contra a expansão do COVID-19, a permanência dentro de casa, a pelo menos um metro do corpo alheio. A opulência ultraconservadora deseja – e recomenda – ruptura urgente com essa tendência hegemônica: vê-a como “desestabilização". Fiel ao figurino da exigência, o orgulho paramilitar obtuso, caudatário da Presidência da República, trata, agora, de elevar a indiferença assassina ao patamar de valor universal. A decisão se articula com ventos brasileiros nos Estados Unidos, conforme abaixo.2. A efeméride factoide exilada na cidade de Richmond, tonitruante a partir do estado da Virgínia, alegou recentemente, em vídeo no YouTube, viral nas redes sociais e depois suprimido, que a pandemia do COVID-19 simplesmente não existe, como se os milhares de óbitos diários no mundo fossem obra espiritual de nihil. Eis que nosso hóspede, pago a impostos caríssimos, prega, obviamente, em eco ao Ministério da Economia, a volta em massa da população aos respectivos postos de trabalho, em nome da saúde de uma economia estruturalmente alquebrada, agora à beira da exposição indiscriminada de tudo e de todos à contaminação letal. O hóspede prossegue leal à palavra da idiotia estratégica, sem sensibilidade para o seu próprio rasgo inoportuno. Em hora errada, a idiotia arrasta o coro: a economia, se em boas condições, galvaniza a reeleição em 2022. Ficar em casa é anticapitalista, insinua o húmus espalhado. Aliás, “O COVID-19 é comunista”, corre na veia desses milhares de fundamentalistas de extrema direita, após a divulgação de imagens do vírus, a cores avermelhadas...

3. A fração da extrema direita atualmente no poder debocha da modernidade tecnocientífica. O desprezo abrange até mesmo conclusões laboratoriais similares obtidas em diferentes lugares do mundo. Logo, do bojo do baixo medievo, também agredido em seus fundamentos culturais, essa descrença irresponsável faz o hóspede desbancar a Organização Mundial da Saúde (OMS) e desautorizar publicamente o Ministro da Saúde local, até então o real Presidente da República no período. A extrema direita castiga a razão mínima, operando a dez doses subsolares da estultícia e da insolência. Esse desempenho cognitivo, reprovável em qualquer ENEM de política trivial, constitui hoje, no entanto, "racionalidade" de Estado. À vista do discurso incorrigível do hóspede, jornais sérios amanhã noticiarão: "Violência institucional atinge estágio de assassinato populacional sem precedentes".

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O ocupante do Palácio, a cada vez que sequestra a linguagem verbal (e a não-verbal também), além de seviciá-la, reinventa, com aperfeiçoamentos seriados, o escândalo da vergonha de Estado, ao lhe conceder escala internacional recorrente. Lê-se no diário literário da improbabilidade, cética em relação a si mesma: “já a ninguém, se provido de mediana seriedade, mesmo que apocalíptica, escapa a sensação de certeza sobre qual país um correligionário 666, senão a própria entidade-mor, escolheu para renovar seu passeio etílico”.

Salvo se a suspeita, também atônita com a avalanche de escabrosidades, estiver sonolenta, o recente discurso da bestialidade tende a ser um dos últimos da “trajetória” do hóspede na cadeira da Presidência, antes de o próprio assento, rubro por ver-se novamente no epicentro involuntário da vergonha mundial, expurgar o usuário da nobreza do cargo.

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