A crise de Alcolumbre: empurrar o corvo Rodrigo Pacheco ao Supremo sob o risco de repetir erros históricos
O país precisa de um Supremo comprometido com direitos humanos, com a justiça social e com a soberania
Davi Alcolumbre, presidente do Senado Federal, protagoniza uma das mais graves manobras políticas contra a prerrogativa presidencial e contra a Constituição de 1988. Ao suspender a sabatina de Jorge Messias, indicado por Lula ao Supremo Tribunal Federal, fabricar um conflito institucional e operar nos bastidores para impor seu aliado Rodrigo Pacheco no STF, ele tenta colocar na Corte mais um ministro liberal — um “corvo togado” comprometido com os interesses do mercado e não com os direitos do povo. O ditado espanhol “Cría cuervos y te sacarán los ojos” (crie corvos e eles arrancarão os seus olhos) resume com precisão o risco: criar figuras que, depois de fortalecidas, se voltam contra quem as investiu de poder.
A vaga aberta pela aposentadoria de Luís Roberto Barroso é decisiva para o futuro do país. Não se trata apenas de substituir um ministro, mas de definir se o Brasil continuará preso à conciliação que marcou a última década ou se buscará reconstruir o espírito social da Constituição de 1988. O Supremo que enfrentou o golpismo bolsonarista foi o mesmo que, antes disso, legitimou a terceirização irrestrita, o negociado sobre o legislado e decisões que esvaziaram o sindicalismo. A atuação de Barroso simbolizou essa ambiguidade: firme contra o autoritarismo, mas defensor das reformas liberais que corroeram direitos trabalhistas. A sucessão dessa vaga pode encerrar ou aprofundar esse ciclo.
É nesse terreno que Rodrigo Pacheco surge como o verdadeiro objetivo de Alcolumbre. Sua imagem de político moderado contrasta com sua prática: apoiou a reforma trabalhista, a reforma previdenciária e a agenda de austeridade que empurrou o país para o abismo social. Representa o pacto liberal das oligarquias regionais, o Senado que se acostumou a servir ao mercado financeiro e que hoje reivindica, para si, a tutela da política nacional. Transformar Pacheco em ministro seria cristalizar essa hegemonia por décadas, entregando ao STF alguém alinhado exatamente às forças que minaram a Constituição Cidadã.
Por isso Alcolumbre trabalha para inviabilizar Messias. A suspensão da sabatina, a pressão pública sobre o Planalto e a tentativa de reposicionar o Senado como poder moderador do Supremo fazem parte de um único movimento: abrir caminho para o nome que lhe interessa. A proximidade de 2026 torna essa articulação ainda mais urgente. Com o fim de seu mandato se aproximando, Pacheco vê no STF a saída ideal — uma vitrine de poder sem riscos eleitorais, longe das incertezas de Minas Gerais e alinhada ao projeto liberal do qual é um dos principais operadores.
E é exatamente aqui que reside o maior perigo. O país já viu ministros escolhidos em nome da “moderação” que depois se revelaram guardiões dos interesses econômico-financeiros, votando sistematicamente contra direitos sociais. A busca pela conciliação produziu uma geração de “corvos togados” que ampliou desigualdades e restringiu a capacidade do Estado de proteger trabalhadores e setores vulneráveis. Repetir o erro, indicando alguém com o perfil de Pacheco, seria perpetuar o ciclo que enfraqueceu a Constituição Cidadã e fortaleceu o poder do mercado dentro do Judiciário.
A vaga aberta é uma oportunidade rara para corrigir esse rumo. O país precisa de um Supremo comprometido com direitos humanos, com a justiça social e com a soberania popular — não de um tribunal capturado pelo liberalismo institucional. A escolha de Lula tem peso histórico: pode fortalecer a democracia social ou reforçar o poder das elites que sempre trabalharam para limitar seu alcance.
O Brasil não precisa de novos corvos no Supremo.
Precisa de uma Corte que sirva ao povo — e não aos senhores do mercado.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

