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Pedro Simonard

Antropólogo, documentarista, professor universitário e pesquisador

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A democracia representativa como instrumento de poder da burguesia

A democracia representativa ocidental ou democracia burguesa é um dos instrumentos de poder mais eficazes da burguesia que vem definindo suas regras desde o século XVIII, adapatando-as segundo seus interesses de controle social

Demissão de trabalhadores da TELAM, um atentado à liberdade de expressão para esconder o golpe do FMI (Foto: Bernardino Ávila)
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A democracia representativa ocidental ou democracia burguesa é um dos instrumentos de poder mais eficazes da burguesia que vem definindo suas regras desde o século XVIII, adapatando-as segundo seus interesses de controle social. Ela foi recuperada da experiência da Grécia Clássica pelos pensadores burgueses como forma de legitimar o poder de sua classe e de evitar que a aristocracia retomasse o poder político. Intelectuais deram contribuições importantes para que este regime político se desenvolvesse e chegasse até seu estágio atual. Montesquieu, diante do poder absoluto do rei da França, desenvolveu a teoria dos três poderes separados uns dos outros e que se contrabalaçam, se controlam de tal forma que um não se sobrepõem ao outro. Rousseau desenvolveu a ideia da soberania do povo. Os Federalistas aprofundaram a democracia burguesa por meio do conceito de federação e da defesa da república como forma de governo mais democrática do que a monarquia. Muitos outros personagens deram sua contribuição para o desenvolvimento da democracia burguesa e não vou discorrer sobre eles por não ser este o objetivo deste artigo.

O voto dos trabalhadores, o voto feminino e o voto dos analfabetos dão mais requinte à democracia burguesa enquanto instrumento de dominação e controle que, segundo Winston Churchill, é a pior forma de governo, excetuando-se todas as demais. 

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A eleição de representantes de burgueses e trabalhadores, a eleição de representantes das minorias políticas são outros elementos que refinaram a democracia representativa.

A ação revolucionária dos representates dos trabalhadores foi controlada quando eles entraram no jogo parlamentar e foram envolvidos pelas regras de organização dos parlamentos. Todos os ritos e processos que compõem os sitemas parlamentares buscam impor limites a esta ação, determinando como se vestir, como deve se falar, comitês de ética organizados segundo os princípios da moral burguesa, o jeton dos eleitos. Este é um caso exemplar. Segundo alguns autores, o jeton foi uma reivindicação dos representantes dos trabalhadores que tinham dificuldades em comparecer às discussões parlamentares porque teriam que se ausentar do trabalho. Isso dependia da autorização do patronato e representava a perda do salário referente ao dia não trabalhado. O jeton permitiu que esses representantes pudessem se dedicar às atividades parlamentares. Como efeito colateral profissionalizou a representação política de maneira a criar políticos que se distanciaram dos interesses de suas bases e se submeteram fortemente às regras de funcionamento do parlamento e, por extensão, às regras da sociedade burguesa. A vontade de seus eleitores foi, sempre que possível, colocada em segundo plano. Desta maneira, a burgueisa cooptou os representantes dos trabalhadores, oferecendo-lhes migalhas e transformando a representação parlamentar em sinecura.

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Outro elemento que limita a ação dos representantes dos trabalhadores são as normas que regulamentam a formação de partidos políticos que mudam constantemente de maneira a dificultar o crecimento ou aumento da representatividade dos partidos de esquerda. Mesmo com seus quadros profissionalizados e cooptados, estes partidos ainda incomodam a burguesia quando aprovam alguma lei que regulamenta e limita a acumulação de capital. Sua existência força a burguesia a estar sempre vigilante para não perder o poder político.

A regra mais utilizada pela democracia burguesa presentemente na América Latina é denúncia de fraude eleitoral, quando os partidos burgueses são derrotados pelos partidos de esquerda ou por coalizões de esquerda. Foi assim nas eleições venezuelanas quando da última reeleição do Nicolás Maduro, representante do bolivarianismo. Isso se repetiu nas recentes eleições bolivianas, quando a reeleição de Evo Morales levou o candidato de direita, Carlos Mesa, a questionar as eleições devido a suspostas fraudes a favor do candidato vencedor. Evo Morales e a OEA acertaram a auditoria destas eleições, mas o candidato derrotado rejeitou esta proposta e não aceita nada diferente do que ser reconhecido o vencedor das eleições, mesmo tendo sido derrotado nas urnas. 

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Semelhante situação ocorreu no Brasil quando Dilma Rousseff derrotou Aécio Neves. No dia seguinte à liberação dos resultados oficiais Aécio já bradava que a candidata vencedora não governaria.

Este tipo de atitude é radicalmente anti-democrática, mas às favas com a democracia quando esta coloca em risco o poder do burguês.

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Nos casos acima citados a regra foi alterada de maneira a questionar o resultado das urnas, aquilo que Tancredo Neves e Ulisses Guimarães, por exemplo, denominavam “voz das urnas”. Não importa a vontade da maioria; importa é que os donos do poder econômico e político não tenham seus interesses regulados, delimitados e limitados.

Quando a crise do capitalismo se agrava e o resultado das eleições não está de acordo com os interesses da burguesia e esta percebe a possibilidade de perder seu poder político, mesmo mantendo sob seu controle o poder econômico, os burgueses sacam o fascismo do bolso do colete para recolocar tudo em ordem.

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Práticas similares podem ser aplicadas não só sobre o processo eleitoral e os princípios democráticos, mas sobre toda as instituições da democracia burguesa como a justiça, por exemplo. Os diálogos trazidos a público pela Vaza Jato explicitam como a Lava Jato utilizou, sem economizar, este tipo de práticas. Não tem provas substanciais para condenar o Lula? Utilizem-se reportagens toscas, documentos rasurados e, sobretudo, as convicções do Ministério Público e dos juízes federais para condená-lo. O delator não conseguiu ligar os políticos de esquerda a nenhuma prática ilícita? Reduza-se a pena dele, desde que ele colabore criando uma história em que alguém ouviu dizer que um primo do amigo de um colega da tia avó de um filiado ao PT ou ao PCdoB inventava regras para jamais perder suas bolas de gude no jogo de búrica. “Desonestos, corruptos”, acusam os mais desonestos e corruptos! Cria-se um Power Point simplório, que qualquer criança de cinco anos faria melhor, de maneira a que a grande imprensa, ávida por manipulações, possa reproduzi-lo nas manchetes dos jornais, nas capas das revistas e nas imagens da televisão. O importante é que leitor/telespectador tenha algo visual no que possa acreditar. Nesta sociedade oculocêntrica, formada por cidadãos São Tomés é preciso ver para crer, só existe aquilo que pode ser visto.

Se os partidos de esquerda creem que participar do jogo parlamentar é importante e fundamental, é preciso que se aproximem mais dos movimentos sociais e se apoiem nestes para pressionar os parlamentares a alterarem as regras do jogo democrático. Eu, particularmente, não creio que isto seja possível. Em qualquer sociedade quem define as regras sociais é a classe dominante. No modo de produção capitalista é a burguesia quem faz as regras e a democracia burguesa é importante instrumento de manutenção destas. Acreditar no parlamento e nas instutições do regime democrático burguês só legitima os princípios e normas voláteis do jogo da dominação de classe, cujas regras quem domina e desenvolve é quem detém o poder político e econômico em suas mãos. A esquerda deve recorrer ao povo nas ruas, às organizações sindicais e sociais para pressionar as estruturas de poder, derrubá-las e instaurar uma sociedade justa e igualitária. Fora disso, só resta a legitimação daquilo que é ilegítimo.

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