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Pedro Simonard

Antropólogo, documentarista, professor universitário e pesquisador

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A esquerda liberal carioca e seu inútil voto útil

A esquerda liberal está fazendo campanha pelo voto útil em Martha Rocha. Mas há empate técnico e Benedita ainda pode chegar ao segundo turno

Martha Rocha e Benedita da Silva (Foto: abr | agencia camara)
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Os eleitores do campo de esquerda não ligados a partidos políticos sonharam o sonho impossível de uma candidatura única de esquerda nas principais cidades brasileiras nessas eleições municipais. Em poucas cidades esta unidade se fez entre os maiores partidos de esquerda. Na maioria dos municípios, a cláusula de barreira e as mesquinhas políticas partidárias impediram esta unidade. Como resultado, os candidatos de esquerda correm sério risco de não conseguirem chegar ao segundo turno em muitos municípios. 

Nas cidades onde pelo menos dois dos três maiores partidos de esquerda – PT, PSOL e PCdoB – se uniram, seus candidatos têm reais chances de ir para o segundo turno. Exceção feita a São Paulo onde o eleitorado de esquerda fez, por opção própria, aquilo que os partidos não conseguiram realizar: escolheu um candidato de esquerda, Guilherme Boulos, para apoiar.

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No Rio de Janeiro, a recente pesquisa eleitoral coloca Eduardo Paes (DEM) liderando com 32%, seguido por Marcelo Crivella (Republicanos) com 14%, Delegada Martha Rocha (PDT) com 11% e Benedita da Silva (PT/PCdoB) com 8%. Renata Souza (PSOL) apresenta 4% das intenções de voto. Benedita da Silva, Crivella e Martha Rocha estão em situação de empate técnico. A esquerda no Rio, somando o percentual de Benedita e Renata Souza, alcança 12% das intenções de voto na cidade e teria mais chances de chegar ao segundo turno se estivesse unida. 

Segundo algumas pesquisas, a candidatura de Benedita da Silva é a que vem mostrando uma curva de crescimento maior.

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Em 2019, PT, PSOL e PCdoB deixaram os eleitores cariocas sonharem com um candidato único de esquerda em uma chapa liderada por Marcelo Freixo e com a possibilidade de Benedita da Silva compor como vice-prefeita. O PCdoB faria parte desta coligação. A pequena política interna do PSOL impediu que esta coligação se formasse. Além disso, um erro de interpretação política que considerou o PDT como um partido de esquerda, também prejudicou esta aliança. O PDT está engajado no projeto pessoal de Ciro Gomes de concorrer à presidência da República em 2022 e só irá coligar-se com partidos de centro e centro direita. Como o PDT não quis compor a frente de esquerda (mas o PDT não é mais de esquerda há muito tempo!), Freixo omitiu-se de concorrer para a prefeitura do Rio de Janeiro.

No domingo 8 de novembro a campanha de Benedita da Silva apresentou um videoclipe com a participação de Chico Buarque de Hollanda, Martinho da Villa, Leci Brandão, Chico Diaz, Bete Mendes, Cristina Pereira, Miguel Paiva, Angela Vieira, Rappin' Hood, declarando apoio à Bené. Esses nomes estão ligados à resistência e às lutas da esquerda há muito tempo e referendam a candidatura da petista.Como já foi mencionado, Crivella, Martha Rocha e Benedita encontram-se em empate técnico. Isso não foi levado em consideração pela esquerda liberal do Rio de Janeiro. No dia 10 de novembro, esquerdistas liberais assinaram o manifesto Juntos com Martha Rocha e Anderson Quack, para livrar o Rio de Crivella! Entre as assinaturas mais conhecidas Caetano Veloso, Paula Lavigne, Patrícia Pillar, Ana de Hollanda e Orlando Zaccone.

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A esquerda liberal está fazendo campanha pelo voto útil em Martha Rocha. Mas há empate técnico e Benedita ainda pode chegar ao segundo turno. O mote desta campanha é o desejo de derrotar Crivella e Martha Rocha, segundo este manifesto, poderia derrotar Paes e Crivella no segundo turno. Parece até a história de Ciro Gomes que alegou que o PT deveria tê-lo apoiado para presidente porque as pesquisas indicavam que ele tinha mais chances de derrotar Bolsonaro no segundo turno. Neste momento, às vésperas das eleições, tanto Benedita quanto Martha e Crivella podem passar para o segundo turno e enfrentar Eduardo Paes, segundo as pesquisas indicam.

O manifesto pró Martha Rocha afirma ser “inaceitável ver Crivella avançar impunemente para o segundo turno. É um prêmio que ele não pode receber depois de tudo o que fez. É preciso que a cidadania do Rio de Janeiro lhe dê a resposta que merece”. Nisso todos nós concordamos.

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Em seu segundo parágrafo, o manifesto prossegue afirmando que “entre nós, há eleitores que gostariam de poder votar em outras candidaturas legítimas do campo democrático, como Benedita da Silva, Renata Souza e Bandeira de Mello. Há também entre nós simpatizantes destes e de outros partidos. No entanto, é hora de termos grandeza e sabedoria, e não de alimentar disputas ou rivalidades partidárias entre nós. Não podemos repetir os erros do passado, que tanto nos fizeram sofrer. É hora de fazer, através do nosso voto, a unidade progressista que os partidos por si só não conseguiram fazer”. A política interna do PSOL colocou entraves a esta coligação, mas não podemos nos esquecer que o PDT e o PSB, coligados entorno do nome de Martha Rocha, rejeitaram a coligação tendo Freixo como cabeça de chapa, este sim um candidato que, embora muito equivocado em suas últimas atitudes, teria reais chances de vitória desde que saísse com o apoio da esquerda unificada e dos partidos de centro, como PDT e PSB. Estes dois partidos rejeitaram construir esta frente sobretudo porque caminham lado a lado, tentando dar suporte ao projeto Ciro 2022.

O manifesto prossegue alegando que Martha Rocha “é a única candidata do nosso campo que tem condições de chegar ao segundo turno tirando Crivella, como mostra a mais recente pesquisa Datafolha”. Primeiro é preciso perguntar-se que campo é este. Martha chegou ao PDT vindo do PSD. Os esquerdistas liberais consideram uma candidata com este perfil do mesmo campo que eles? Eu sou uma pessoa de esquerda e não me considero estando no mesmo campo que ela. Martha foi responsável pela repressão aos movimentos sociais durante o governo Sérgio Cabral. Mesmo assim esses esquerdistas liberais consideram-se no mesmo campo que ela.

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O manifesto prossegue proclamando que Martha Rocha “é a única que, também segundo as pesquisas, tem chances de vencer o segundo turno das eleições”. Além de termos que lembrar que para chegar ao segundo turno é preciso colocar-se entre os dois candidatos mais votados no primeiro turno, o manifesto apresenta aqui um terrível problema de sintaxe: ela não pode ser “a única” que tem chances de vencer no segundo turno porque, se houver segundo turno,  será devido ao fato de que nenhum candidato obteve mais de 50% dos votos válidos no primeiro e dois concorrentes disputarão o segundo turno. Logo, os dois terão chances de vencer esta rodada das eleições.  

A esquerda liberal age como a torcida de futebol: torce para que o time jogue bem, mas não faz nada para que isso aconteça. Não participa da organização de sindicatos nem da organização dos movimentos sociais. Não procura debater com os adversários, buscando reverter seu ponto de vista que ela acha equivocado. Ela sonha com um mundo melhor, mas não faz nada para que ele advenha. Quando chega o momento de participar de uma maneira mínima, votando nas eleições em candidatos de esquerda, a esquerda liberal, por desconhecer a realidade, abre mão de seus “sonhos” para apoiar um candidato que ela considera “menos ruim” que vai continuar fazendo tudo aquilo que ela, esquerda liberal, diz combater e contrapor-se a. Agindo desta maneira ela influencia alguns setores de esquerda e de centro a votarem equivocadamente, abrindo mão de suas lutas. 

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A esquerda liberal come três refeições ao dia e pode adiar seus sonhos de um mundo melhor. Egoísta, ela esquece-se que aqueles que não comem três vezes ao dia, aqueles que são chacinados nas favelas ou mortos devido a seu gênero não podem esperar.

Defender o voto útil em uma situação de empate técnico é tomar partido de um candidato e isso não é voto útil. Voto útil caracteriza-se quando escolhe-se um candidato que demonstre reais condições de vencer um outro indesejado, sendo que as outras opções de derrotá-lo não apresentam condições mínimas para fazê-lo. Se temos um empate técnico entre Martha e Benedita é porque ambas têm chances de chegar ao segundo turno e, neste caso, não coloca-se a opção pelo voto útil.

A opção da esquerda liberal por Martha Rocha é fruto de uma análise equivocada que não compreende que o que está por trás desta proposta é o intuito de derrotar uma candidata de esquerda e enfraquecer os partidos progressistas para as eleições presidenciais de 2022. 

A vitória de Martha Rocha posicionaria um candidato de centro-direita, no caso Ciro Gomes, mais palatável do que Bolsonaro e com mais traquejo político do que Huck/Moro, para as próximas eleições presidenciais. Ciro iria consolidar-se como o candidato anti-esquerda. 

Obtendo sucesso, este projeto imporia dificuldades para que uma coligação de esquerda ou centro-esquerda retomasse o controle do Executivo do Brasil e implementasse um governo popular, nacional e democrático.

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