A farsa do adeus
A emigração para o hemisfério norte, ainda mais agora que declara animosidade aos estrangeiros, pegou mal. Soa como farsa
O “animal político”, desde que Aristóteles parou para pensar no assunto, compunha o perfil de um ser que possuía uma missão. Não deveria se constituir em alguém que apenas atuava para fins pessoais, como melhorar de vida ou ganhar dinheiro. Prestígio também não representava o bastante para que o definisse. Em sua trajetória, apesar dos aproveitadores e oportunistas, havia algo de particular: o desejo de se empenhar para aperfeiçoar os costumes e trazer felicidade para o conjunto. Claro que muito ocorreu desde então e uma prática disseminou, por vezes, o pior do que antes significava. Uma de suas características, na linha do filósofo grego para a sua formulação, convocava a noção de verdade, fora da qual, em vez de benefícios, a comunidade se veria às voltas com prejuízos.
Sem dúvida, os bolsonaros não leram Aristóteles. Não é gente dada a livros ou à cultura, aos quais atacam ferozmente. Nas suas exibições de ignorância, ressalta a vontade de prosperar ocupando o poder... pelo poder. Um exame no inventário de bens da família não deixa hesitações sobre a expansão de seu patrimônio. É assim que, na licença solicitada pelo 03 à presidência da Câmara dos Deputados, não há razões para dúvida. Ele se envolveu com iniciativas que superam os laços que o mesmo solidificara na política. Há ainda, é claro, o que se imagina: a possibilidade de interferir junto à administração de Trump para favorecer o pai. Mas isso não parece tendente a ocorrer num prazo mais ou menos razoável.
As TVs brasileiras já estamparam o tamanho da casa onde se instalou com a mulher (segundo se conta) em Houston, no Texas. Será base para alguma coisa, menos, até pela distância, para se fazer íntimo dos centros de poder situados no Distrito de Columbia. Para os que aqui ficam, o importante é que se trata de um quadro que, como os seus, não trabalha com a ideia de verdade. O adeus temporário aos irmãos, aos adeptos e ao pai, fortemente marcado para a condenação judicial, transmite a sensação de que esconde segredos. Ele deixou para trás o cargo. Desligou-se igualmente da Comissão de Relações Exteriores, na qual só poderá apitar por intermediários. É o que dá, para um projeto fracassado de “animal político”, exibir gostos pessoais muito mais fortes do que os ativos sociais. Não espanta que, para a maioria dos observadores nacionais, a emigração para o hemisfério norte, ainda mais agora que declara animosidade aos estrangeiros, pegou mal. Soa como farsa, ainda que a covardia e o medo da justiça também possam prevalecer.
Seja como for, nós e os seus partidários já vivemos decepções bem maiores. Tudo indica que se aproximam do fim as aventuras do Jair. A presença agressiva, conjugada ao espírito golpista aos poucos perde a chama da atração, mesmo junto aos direitistas extremados. Lembremos que na existência tudo cansa. Logo, vindos dos presídios, gritos e choros deixarão de ferir os ouvidos...
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

