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    Joaquim de Carvalho

    Colunista do 247, foi subeditor de Veja e repórter do Jornal Nacional, entre outros veículos. Ganhou os prêmios Esso (equipe, 1992), Vladimir Herzog e Jornalismo Social (revista Imprensa). E-mail: joaquim@brasil247.com.br

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    A guerra da Paper Excellence agora é contra o Brasil

    Ao tentar levar disputa em torno da Eldorado Celulose para Paris, empresa sino-indonésia trata Judiciário brasileiro como puxadinho de república bananeira

    Eduardo Bolsonaro e Jackson Wijaya (Foto: Reprodução X)

    A CPI que apurou os atos antidemocráticos de 8 de janeiro tentou investigar a Paper Excellence, mas, nos bastidores, manobras da extrema direita impediram a convocação do então número 2 da empresa, Josmar Verillo. O executivo deixou o grupo, mas não conseguiu apagar os rastros de sua militância contra as instituições democráticas brasileiras.

    Suspeita de fomentar a horda fascista que depredou o STF, a Paper agora tem uma militância aberta contra o Judiciário brasileiro. Seu controlador, o bilionário Jackson Wijaya, contratou algumas das mais bem remuneradas bancas de advogados do Brasil para tentar levar a disputa que trava com o grupo brasileiro J&F para Paris, sede de uma empresa de arbitragem. 

    Nas peças que instruem a ação, os advogados tentam justificar a transferência com ataques sem precedentes ao Judiciário brasileiro, além de achincalhar o Incra e do Cade, instituições administrativas onde a Paper também teve derrotas. 

    “É como se o Brasil fosse uma república bananeira. Nunca vi isso, e me surpreende que advogados de renome se submetam a uma lide desse tipo”, diz um jurista que acompanha o caso. 

    “Se esses colegas entendem que a Justiça brasileira não presta, fica difícil para outros clientes acreditem que poderão ter êxito em suas ações. Com que régua estão medindo o nosso Judiciário?”, reflete.

    Conforme revelou o jornalista Cláudio Magnavita, os escritórios são: Mattos Filho, Veiga Filho, Marrey Jr. e Quiroga Advogados; Ferro, Castro Neves, Daltro & Gomide Advogados; Bermudes Advogados; e M Nasser Advocacia Estratégica.


    A peça construída por eles afirma:  "a CA ( CA Investment, controladora da Paper) não poderia ter previsto que a J&F iria abusar do acesso ao Poder Judiciário e às instituições administrativas do Brasil por meio de sua conduta imprópria para se esquivar das obrigações que assumiu no SPA e impedir a CA de fazer valer os seus direitos.”

    A gravidade dessa afirmação só encontra paralelo nos ataques que Jair Bolsonaro e seus apoiadores desferem contra o Judiciário brasileiro e que resultaram no 8 de janeiro. 

    Não é uma tática nova para o grupo. Até ser exposto, Josmar Verillo jogava gasolina na fogueira quando fazia campanha contra o STF, ao dizer que sentia nojo da corte, xingava ministros de facínoras e os acusava de serem aliados da criminalidade.

    Na época, dava certo, já que, no Palácio do Planalto, estava assentado um inimigo do Judiciário independente. 

    Nessa mesma época, o número 2 da Paper estava por trás de uma campanha contra os empresários brasileiros Wesley e Joesley Batista, fundadores da Eldorado Celulose.

    Por um descuido do jornalista e escritor Cláudio Tognolli, falecido no ano passado, Josmar Verillo foi flagrado em uma troca de mensagens que revelavam que era o mentor de um livro difamatório, Traidores da Pátria, que ganhou publicidade nacional.

    Também estava por trás de uma CPI aberta para investigar o BNDES, mas que, no fundo, tinha um único alvo: a J&F. 

    Por meio das quatro bancas de advogados, a Paper acusa o Judiciário brasileiro de se curvar para a J&F, como se ela própria não estivesse envolvida em alguns dos maiores escândalos corporativos e ambientais do planeta.

    Na Indonésia, o grupo que atende hoje pelo nome de Paper Excellence foi protagonista de um golpe financeiro e é acusado de devastar áreas protegidas. 

    É acusado também de, por conta dessa má fama, ludibriar autoridades do Canadá para esconder seu real proprietário e adquirir propriedades no País. 

    No Brasil, deixou rastro de malfeitos em duas ocasiões, além do livro encomendado e da CPI. Dois executivos foram indiciados por violar o sigilo de comunicações de diretores da J&F, com ajuda de uma empresa vinculada à Kroll, a empresa estadunidense formada por antigos agentes da CIA.

    No trio de arbitragem, contou com um profissional, Anderson Schreiber, que escondeu sua ligação com advogados que lhe prestaram serviços, violando regra de ouro para a solução de conflitos, o dever de informar.

    É justamente esse vício na arbitragem que motivou a disputa judicial, que evoluiu para um conflito maior, a partir de revelações que inviabilizam o negócio.

    Estrangeiros são proibidos de controlarem grandes dimensões de terras brasileiras sem autorização do Incra e do Congresso Nacional.

    A Paper não obteve essa autorização, mas na época em que adquiriu 49,41% da Eldorado, em 2017, empresas nacionais eram castigadas por Sergio Moro e a Lava Jato, e o movimento de desnacionalização das riquezas era nítido.

    Em 2019, o grupo de Jackson Wijaya surfou na onda bolsonarista e conseguiu atrair para seu território – Xangai, na China, e Jacarta, na Indonésia –, dois nomes de destaque do regime de extrema direita: o vice-presidente Hamilton Mourão, e o deputado federal Eduardo Bolsonaro.

    Eles posaram para fotos com um papelão na mão, ao lado de Jackson Wijaya, como se o papelão fosse um cheque. Algumas semanas separam uma foto da outra, mas basta olhar para os valores impressos para concluir que credibilidade não é o forte do grupo.

    Num cheque, o valor é 27 bilhões de reais. No outro, 31. Era a quantia que Wijaya disse que investiria no Brasil. 27 ou 31? Ele nunca disse, porque, a rigor, ele não dá entrevista. 

    Seus comandados e aliados é que falam. Em 2019, Bolsonaro compartilhou a foto do filho e escreveu: 

    – Eduardo Bolsonaro, em Jacarta, recebe um cheque simbólico de R$ 31 bilhões da Paper Excellence, valor que será investido no Brasil até 2022. Tudo em função da volta da confiança no Governo Jair Bolsonaro.

    Seria coincidência o desprezo que ambos manifestam pelo Judiciário no Brasil?

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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