A ilusão da tela vazia: O que perdemos na educação ao trocar o professor pela plataforma
O escândalo do “aulão” em Minas Gerais e o recuo da Suécia são sintomas de um modelo educacional desconectado
O debate sobre o futuro da educação pública brasileira passa pela decisão fundamental de onde alocar recursos e confiança: no investimento em plataformas digitais e inteligência artificial ou na valorização do capital humano – o professor em sala de aula, é o que pensa a ANPUH-SP que defende o professor de História como peça-chave na formação de cidadãos reflexivos e atuantes para melhores perspectivas de organização sociais e crescimento de uma nação, alertando sobre os riscos de modelos 100% digitais e da desvalorização docente.
Na última quarta-feira, 19, o governador de Minas Gerais, Romeu Zema, protagonizou um evento (com intenções eleitoreiras) que expôs de forma crua a desconexão entre a gestão e a base educacional.
O "aulão" no Mineirão, trouxe a tona o cenário de confusão da educação pública digitale privatizada, revelou a fragilidade de iniciativas midiáticas quando desassociadas da realidade dos alunos, a maioria sem infraestrutura digital adequada e, sobretudo, sem a ponte pedagógica diária com seus docentes.
O episódio é emblemático de uma visão gerencialista que promete "soluções de TI", mas falha em reconhecer que a aprendizagem crítica exige interação humana. A crença de que a digitalização total é o caminho inevitável para a excelência educacional encontra forte oposição em evidências internacionais.
A Suécia, país frequentemente citado como referência em qualidade de ensino, está revertendo sua política de adotar um modelo 100% digital. A decisão não é um repúdio à tecnologia, mas uma reavaliação pragmática, diante de quedas de desempenho e da constatação de que o excesso de telas pode prejudicar a capacidade de leitura profunda e a concentração, o governo sueco optou por investir milhões de euros para retornar aos livros impressos e fortalecer a presença física dos materiais.
O dado sueco é crucial, ele sustenta a crítica de que a tecnologia, quando não mediada por uma pedagogia humana e crítica, pode se tornar uma distração, e não um catalisador. A simples inserção de dispositivos ou a promessa de ensino via IA, sem um professor motivado, bem remunerado e presente, resulta em um processo de ensino-aprendizagem superficial.
A crise de valorização do professorado se manifesta, no Brasil, no ataque a disciplinas essenciais e a associação Nacional de História (ANPUH-SP) tem se posicionado enfaticamente contra medidas de enxugamento curricular, o alerta da entidade é direto: a tentativa de impor um corte de 35% nas aulas de História em São Paulo, por exemplo, não é apenas uma reduçãoorçamentária; é uma ameaça ao processo de formação democrática e cidadã.
A disciplina de História se estabelece como o principal antídoto contra a superficialidade e a desinformação, cabendo ao professor, em sala, a função crucial de estimular a leitura crítica de fontes, ensinando o aluno a questionar narrativas e analisar contextos complexos.
É também por meio dessa mediação humana que se fomenta a consciência cívica, ligando o passado ao presente e capacitando o jovem a entender as estruturas de poder, a desigualdade e as lutas por direitos. Dessa forma, a História contribui decisivamente para a construção do pensamento complexo, oferecendo a visão de que a realidade é multifacetada e exige reflexão aprofundada, em vez de se limitar a respostas binárias, tão comuns em modelos digitais rasos.
Ao precarizar a educação, desvalorizando o docente e cortando o ensino de História, as políticas públicas abrem espaço para a formação de cidadãos com menor capacidade de discernimento, o que fragiliza o próprio tecido democrático. Buscando um debate abrangente e público e diante da precarização e da ilusão tecnológica, a ANPUH-SP lançou a campanha "+ História".
A campanha representa a defesa intransigente de que o futuro da educação de qualidade está na valorização integral do magistério. O professor não é um custo a ser cortado, nem uma peça a ser substituída por um algoritmo, mas o principal investimento social que um estado pode fazer. O apelo da ANPUH-SP é para que a sociedade e os gestores compreendam que o aprendizado crítico e cidadão, a base para uma democracia saudável, não pode ser entregue a modelos massificados e desconectados na melhor das hipóteses.
O debate, a mediação humana e a empatia da sala de aula são irredutíveis. A presença do professor é o que garante que a próxima geração não apenas memorize dados, mas saiba o que fazer com eles.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

