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Marconi Moura de Lima

Professor, escritor. Graduado em Letras pela Universidade de Brasília (UnB) e Pós-graduado em Direito Público pela Faculdade de Direito Prof. Damásio de Jesus. Foi Secretário de Educação e Cultura em Cidade Ocidental. Leciona no curso de Agroecologia na Universidade Estadual de Goiás (UEG), e teima discutir questões de um novo arranjo civilizatório brasileiro.

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A nova aparação de barba do Lula e as simbioses políticas

Lula sim sabe a relevância de uma barba aparada; entretanto, sabe tão mais o valor das múltiplas cores na construção do sentido de uma civilização

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Somos um evento estético do cosmo. Somos, portanto, pura estética.

Lula tinha lá em 1989 o melhor projeto - dos que disputavam - para o Brasil. Todavia, Lula tinha uma barba “horrível” aos olhos da “beleza” e “sutilezas faciais” brasileiras. Lula era uma espécie de bicho-papão imagético, porque nossa história se construiu sob a égide de uma verdade e o seu inverso feito em farsa: a violência; e a face da simpatia, de bochechas rosadas que acolhem a caridade e o pacifismo fajutos, portanto, a “não-violência”. Hãmm?!

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Destarte, tudo que tem “cara” de bravo, de “brigão”, de rústico, ou  “escura”, não tem valor estético na fluidez de nossa “evolução” civilizatória. Ora, Lula, em 1989, também em 1994 e 1998, com sua insistência em disputar a(s) eleição(ões) para Presidente do Brasil como sendo “outro tipo” de humano, jamais venceria se não se ajustasse ao paradigma prevalecente, qual seja, o embelezamento virtual de catarse pública. Este Lula de barba “mal” aparada, de discurso rigoroso, de terno em costura torta, precisou ser “tosado”, como se bicho fosse. 

Somado a este jogo em sua imagem física para as fotos de uma semiótica forjada na sociedade e capturada pelos marqueteiros, faltava ainda uma mensagem ao chamado “Mercado”, um oráculo extra-espiritual que domina a superestrutura planetária e as desigualdades sociais brasileiras e que, por sua ordem universal, não permite que “estressados” com as diretrizes econômicas possam vencer uma eleição presidencial. Surge daí a “Carta ao Povo Brasileiro” do ex-metalúrgico, na verdade, uma mensagem de afago e compromissos com os setores hegemônicos.

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Por derradeiro, seria fundamental a Lula não mais “brigar” com seus adversários a todo custo, mostrar-lhes suas faces podres (de alguns, claro!) escondidas as maçãs de rosto, belas, recatadas e do lar dos políticos (das castas) brasileiras. O sindicalista do ABC evita confronto nos debates e entrevistas públicas na campanha de 2002 à Presidência da República. Surge, portanto, o primeiro estereótipo de um “Lulinha Paz e Amor”. E este novo Lula, de barba cuidada, subirá, finalmente, a rampa do Planalto em 2003, consagrado o primeiro operário eleito para comandar a República do Brasil.

Quase 20 anos depois, uma nova encruzilhada estética e semiológica invade o imaginário, primeiro do próprio ex-Presidente, para a seguir, capturar o imaginário das pessoas. Que versão deste novo Lula precisará ser renovada?

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Pois bem! Chego ao esforço de compreensão do que se passa, mesmo sem encontrar competência para entender realmente quais são, a tática e a estratégia ao melhor avanço de um projeto progressista, de esquerda e democrático a trazer o Brasil de volta a fim de continuar sendo mudado de sua era colonial tal como se aduzia nos governos petistas de Lula e Dilma, isto é, esperança de uma potencial decolonialidade político-cognitiva, com oportunidades, direitos, emancipação e liberdade possível.

Trata-se este texto da percepção dialética a partir de uma decisão dos partidos do campo democrático (li a reportagem aqui mesmo no Brasil 247) de estimular os manifestantes ao evento “Fora Bolsonaro” do dia 2 de outubro próximo a que estes possam ir aos milhares, milhões às ruas, destarte, vestindo o verde-amarelo da bandeira nacional.

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Na reportagem que li, o pressuposto alegado é que “as cores verde e amarela não podem ser associadas ao fascismo e precisam ser retomadas” [1]. Faz todo sentido o mérito da questão. Essa gente horrenda não pode simplesmente destruir a democracia (particularmente a partir do Golpe de 16), estimular (com seu negacionismo e apoio ao genocida-mor da República) a morte de quase 600 mil pessoas, debochar (sabendo ou não) das milhões de pessoas que passam fome extrema nesse momento no Brasil e simplesmente tomarem de conta - como se donos legítimos fossem - dos símbolos da nação.

Entretanto, parece-me, sinceramente, uma nova “barba aparada” (como a de 2002). Lula, que lidera com folga as pesquisas eleitorais, é bom lembrar, é um leão-político. Tanto ele, quanto os inúmeros articuladores de sua campanha, sabem que o vermelho, em alguma medida, por alguns setores, segmentos da sociedade, está estigmatizado.  

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Associar o PT ao comunismo e o comunismo a algo ruim; ou o PT à invenção da corrupção, e tudo isso olhada ao fundo, tremulando em ventos frios uma estampilha vermelha é, antes de mais nada, uma falácia, um jogo torpe, hipócrita e mentiroso da direita para incriminar os movimentos sociais e populares, suas bandeiras legítimas e necessárias (na síntese, a luta de classe e por direitos) e que encontram única guarida institucional nos partidos da esquerda. É a forma da direita para capturar os conservadores, e/ou os desavisados de frágil cognição política, e inibir quaisquer chances dessa gente votar no PT ou em outros partidos da esquerda. 

Por derradeiro, aos estandartes vermelhos consagrou-se essa produção de sentidos, essas narrativas, estes discursos levianos quanto à esquerda. Porém, de fato esse anti-vermelho, em alguma medida dá a eles (ou tira de nós) votos consideráveis ao pleito presidencial. São simbioses políticas de semânticas, variáveis e aritméticas que não podem escapar ao farol dos revolucionários (vai: reformistas progressistas humanistas!). 

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Portanto, intuo aqui que, ou por si, ou por aconselhamento, Lula e os demais líderes da esquerda, resolveram “aparar a barba” novamente. Não encontro uma palavra mais didática, mas penso que seja esta: suavizar. Suavizar a imagem, ladeando um pouco a cor vermelha para atrair o “sentimento” verde-amarelo dos não-esquerdistas, agregando ao já consolidado voto dos brasileiros democratas completos, os votos de um grupo que bem recentemente ocupou as ruas, embora ainda confuso do real sentido das cores e das coisas públicas.

Fato ou não o enlace deste texto, a história cuidará de nos ensinar a verdadeira “cor” brasileira: todas elas! O verde (de nossas florestas que se asfixiam com o "Passamento da Boiada"); o amarelo (de nossas riquezas levadas nas lamas de Brumadinho e de todo lugar para alimentar a ganância de poucos); o vermelho (do sangue de nossos ancestrais e heróis que derramaram por nós); o preto (da senzala rebatizada de favela); o marrom (indígena machucado ou dizimado e feito um com a terra); enfim, de todas as nossas gentes “aparadas” pela mentalidade colonial que necessita, esta sim, ser expurgada para nossa plena liberdade brasileira a tremular suas bandeiras diversas em todas as fachadas das casas, praças e lugares deste País... Em todos os nossos corações reluzentes.

Ah, Lula sim sabe a relevância de uma barba aparada; entretanto, sabe tão mais o valor das múltiplas cores na construção do sentido de uma civilização. 

Resta saber como o povo verá as cores – e o futuro – “aparadas”[2] por estas nossas simbioses da política. 

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[1] Retirado da matéria que serve ao escopo deste artigo. 

Acesse pelo link: https://www.brasil247.com/poder/fora-bolsonaro-usara-hino-nacional-e-cores-da-bandeira-nas-ruas-em-2-de-outubro

[2] Peço desculpas aos leitores pelo uso exagerado de aspas neste texto. A questão é que, sei que perceberam, o excerto é polissêmico. Exigiu-me alguma estratégia discursiva adicional. Mas torço para que nos sirva ao debate...

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