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Fernando Nogueira Costa

Professor Titular do IE-UNICAMP

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A professora e seu mandato político: baixe o livro de Maria da Conceição Tavares

Maria da Conceição Tavares seguramente é uma testemunha lúcida dos acontecimentos do seu tempo, viveu uma experiência excepcional de ser uma mulher num domínio reservado aos homens que é a política e a economia

(Foto: ANTONIO CRUZ/ABR)
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Coautoras:

Hildete Pereira de Melo - UFF
Glória Maria Moraes da Costa - Mackenzie

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Maria da Conceição chegou ao parlamento nacional em momento muito delicado para o ideário de esquerda propugnado pelo seu partido, o PT (Partido dos Trabalhadores). A economia heterodoxa estava derrotada no mundo acadêmico e político – o neoliberalismo imperava. Sua chegada à Câmara Federal na abertura da legislatura em fevereiro de 1995 foi saudada não só como vitória da heterodoxia econômica, mas também das mulheres. Eram tão poucas nos espaços de poder que a professora Maria da Conceição representava uma esperança de que era possível ampliar a participação feminina naquele espaço de poder. 

Sua passagem pela Câmara dos Deputados transcorreu no auge dos anos neoliberais da década de 1990 e foi um mandato popular de oposição na Câmara Federal, que contribuiu para formar um novo ciclo de elaboração programática nacional para o PT. Naquele meio masculino, a ressonância da sua competente voz acadêmica foi significativa no combate à hegemonia dos conservadores. Era preciso estabelecer as relações entre a geopolítica das finanças internacionais e adesão do Brasil a esta política neoliberal. 

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Com dureza fez seu trabalho parlamentar, mas, a vida política não era pautada pelo pensamento critico e as reflexões sobre os grandes temas nacionais não prosperavam no ambiente parlamentar. Como não aceitava fazer um mandato tradicional de formular “projetos” localistas de grupos ou não, decidiu que sua passagem pela Câmara Federal seria voltada para um mandato coletivo relacionado ao seu partido: sua proposta era que devia-se privilegiar projetos da bancada do partido e não individuais. Mas, a tradição da Casa não é essa e nem seu partido aderiu. A maioria não concordava, decidiu então que pelo menos ela se comportaria desta forma. 

Assim, seu mandato foi posto a serviço da bancada do seu partido o PT. Naturalmente seus títulos acadêmicos e seu reconhecimento como eminente professora de Economia a transformaram nestes anos em “professora da bancada do PT” na Câmara Federal. Este convívio e camaradagem com a bancada do PT e do Partido Comunista do Brasil (PcdoB) foi segundo seu depoimento o que lhe deu forças para resistir à onda neoliberal que assolou o país nos anos de seu mandato parlamentar. 

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Este tempo compreende os anos de seu mandato dedicados, sobretudo, à resistência às políticas de desmantelamento da Constituição de 1988, propostas pelo governo Fernando Henrique Cardoso (FHC). O que estava em jogo naquele momento para os donos do poder era fazer “projetos de futuro” que prometiam ora a grandeza nacional ora o paraíso na terra. 

O desmonte do Estado estava relacionado à retirada do Estado de setores de infraestrutura que ao longo do processo de industrialização tinham sido implantados na economia nacional. Vale dizer aço/ferro, petróleo, energia elétrica e telecomunicações. Vaticinando o encilhamento do Estado brasileiro os economistas ortodoxos argumentavam com a necessidade de vultosos investimentos para os quais o Brasil não tinha como atrair capitais para alavancar estes negócios, era preciso privatizá-los! 

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Como a questão inflacionária estava vencida pelo Plano Real, o ataque estava centrado no setor estratégico de infraestrutura e as privatizações passaram a ser a principal plataforma do governo de Fernando Henrique Cardoso. 

Indignada subiu na tribuna e afirmou que tinha chegado havia 41 anos neste País e já tinha assistido a muitas tentativas de reformas do Estado e da Constituição perversas, mas, era a primeira vez que via uma operação de desmonte da base econômica de um setor estratégico da importância do petróleo, que atravessou todos os tipos de regime e de vicissitudes. Em nome do que estaria sendo desmontado? Pela ineficiência? Pela incapacidade da Petrobrás para enfrentar a situação de globalização por que passava o mundo. Certamente que não! 

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Foram palavras ao vento, nada adiantou, foram derrotados e foi aprovada a Lei 9.478 de 6 de agosto de 1997 que dispunha sobre a política energética nacional, quebrava a exclusividade da Petrobrás na exploração de petróleo e criava a Agência Nacional de Petróleo (ANP).

Contra a venda da Companhia Vale do Rio Doce fez artigos e gritou aos quatro ventos, mas tudo foi em vão. E todo o pensamento de esquerda e as forças democráticas e nacionalistas foram impotentes para impedir o leilão da Companhia na bacia das almas. Esta companhia era um dos poucos sistemas globais que o País possuía, com capacidade autônoma de atrair investimentos e financiamentos externos e realizar parcerias estratégicas, mantendo uma inserção competitiva num mercado internacional altamente oligopolizado. 

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O projeto das telecomunicações foi um dos menos discutidos na sociedade e foi improvisado pelo governo de FHC, mas não teve pelo lado das oposições uma fundamentação teórica sólida para enfrentar a onda liberalizante que soprava no mundo naqueles anos. Acabou que o sistema Telebrás-Embratel foi fragmentado e entregue seu controle para operadoras estrangeiras, seu mandato lutou contra, mas foi outra batalha perdida. 

Seu mandato foi uma permanente luta contra os rumos que a política econômica comandada pelo seu antigo aluno – Pedro Malan - tomava naqueles anos. Comemoravam-se naquele ano 1997, três anos do Plano Real e a deputada Maria da Conceição denunciava a desorganização sem precedentes na vida econômica nacional propiciada pelo plano de estabilização que traziam desemprego e degradação das condições de trabalho, déficits crescentes nas transações comerciais e de serviços com o exterior. 

Destemida denunciava a ação predatória sobre o Estado, o desmonte do setor público, o sucateamento da infraestrutura de serviços básicos e a desnacionalização acelerada da produção. Sua participação na Comissão de Economia e Finanças foi à melhor contribuição que seu mandato deu à Nação. 

Combatia às “políticas negativas” que os desequilíbrios potenciais do balanço de pagamentos, a crise fiscal e o desemprego estrutural provocavam no Brasil. Denunciava o imenso custo social que a política de estabilização provocava no mercado de trabalho nacional. 

Interessada num mandato coletivo atrelado ao partido trabalhou com paixão no projeto que tratava da tributação das grandes fortunas, nos termos do artigo 153, inciso VII da Constituição Federal. A primeira iniciativa de instituí-lo foi do senador Fernando Henrique Cardoso, que o aprovou no Senado (Projeto de Lei complementar (PLP) nº 162 de 1989 e encaminhado a Câmara dos Deputados). Foi relatora dele na legislatura de 1995 e na de 1996. 

Até o Deputado Delfim Netto, ex-czar da economia nos governos militares assinou o seu relatório e convenceu vários deputados correligionários a fazerem o mesmo, sua justificativa era que este relatório não seria aprovado no plenário da Câmara Federal, mas as assinaturas deles seria um reconhecimento ao seu esforço. 

Sua vida parlamentar transcorreu em tempos amargos para o pensamento progressista de esquerda. Havia uma unanimidade em bater no velho Estado de bem-estar, que nem havia se completado inteiramente no Brasil. O que aconteceu foi que houve retrocesso social aqui e em todas as partes do mundo onde as políticas sociais foram o eixo para a estabilização fiscal. O ano de 1998 foi marcado pelas eleições presidenciais e o Presidente Fernando Henrique Cardoso em uma manobra política aprovou a reeleição e candidatou-se, ganhou no primeiro turno ainda no rastro do sucesso da política anti-inflacionária. 

Lúcida, Conceição decidiu que não seria mais candidata a nenhum cargo eletivo, reconhecia que uma intelectual crítica tem muito pouco a ver com um ambiente parlamentar, onde imperam valores diferenciados derivados dos acordos e negociações políticas. Estes passam longe do debate de ideias prevalentes no ambiente acadêmico e universitário. 

A desistência da vida parlamentar não era jogar a toalha para seus ideários, significava voltar para a vida de intelectual crítica e professora do Instituto de Economia da UFRJ. Pensar o Brasil e continuar na luta para transformá-lo, continuou na militância partidária e viu aconteceu a débâcle do segundo governo FHC. 

Cheia de esperanças participou da nova tentativa do PT e de seu candidato Luiz Inácio Lula da Silva ao cargo de presidente da República. O ciclo neoliberal na política e na sociedade estava exaurido e a vitória histórica do PT nas eleições de 2002 a encheu de novas esperanças com a sociedade progressista nacional. Nem a Carta aos Brasileiros de julho de 2002 assinada pelo PT no meio da campanha eleitoral, apesar de a ter contrariado, foi “quase” esquecida, diante da vitória retumbante.

Durante os governos do PT, sem ocupar cargo algum, a “Professora”, como é carinhosamente chamada por alguns alunos, continuou a desempenhar seu papel de intelectual crítica, sendo constantemente chamada para debates e discussões relevantes. 

Continuou, mesmo já com certa idade, a participar dos cursos ministrados no IE-UFRJ, de debates e bancas acadêmicas, de avidamente ler novas teses e artigos sobre economia brasileira e internacional, sem abdicar do prazer de ler romances e novelas policiais. 

Nesse período, à frente da Diretoria Acadêmica do Centro Celso Furtado, novamente nas dependências do BNDES, promoveu grandes ciclos de debates que contaram com a participação de ministros de Estado e de especialistas, do governo ou não, dispostos a apresentarem suas visões sobre os entraves ao desenvolvimento, fazendo suas exposições sob a avaliação crítica da mestra de tantos deles. Agora ela coordenava os debates, quando antes fora discípula de Celso Furtado, de Aníbal Pinto e de Ignácio Rangel. 

Maria da Conceição Tavares seguramente é uma testemunha lúcida dos acontecimentos do seu tempo, viveu uma experiência excepcional de ser uma mulher num domínio reservado aos homens que é a política e a economia. Tendo vindo ao mundo num tempo de uma história aberta pela crise de 1929, com guerras e revoluções da socialista ao fascismo, como ela gosta de afirmar é [foi] uma moça do século XX, dominada pela esperança de justiça e liberdade. Mas, ela teve um destino diferente das suas contemporâneas, sua trajetória acadêmica a colocou no rol dos grandes economistas heterodoxos do século XX na sociedade mundial e mais a importante economista da América Latina e do Brasil (A Biographical Dictionary of Dissenting Economics, Ed.2000, p.660-664). 

O Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para o Desenvolvimento e a Fundação Perseu Abramo publicam, em uma coletânea, seleção de textos da Professora Maria da Conceição Tavares escritos ao longo dos últimos 50 anos. 

A escolha dos textos desta coletânea foi feita com ela e por uma geração de profissionais com a qual Maria da Conceição Tavares contribuiu para suas formações, embora nenhum deles tenha sido orientando dela ao longo das suas respectivas pós-graduações. A organizadora foi a professora Hildete Pereira de Melo (UFF) com a colaboração da professora Gloria Maria Moraes da Costa (Mackenzie Rio). A introdução foi escrita por mim, Fernando Nogueira da Costa (Unicamp).

Os textos apresentados foram publicados nos livros e coletâneas produzidos por ela ao longo do tempo. Estes representam sua contribuição teórica e empírica ao processo de desenvolvimento das economias latino-americanas e, particularmente, da brasileira.

Baixe (e divulgue) o livro eletrônico:  Livro da Professora Maria da Conceição Tavares

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