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Nanete Neves

Jornalista e escritora. Depois de uma longa carreira no jornalismo, hoje vive de escrever, editar e ministrar oficinas, além de atuar como editora, leitora crítica e preparadora de originais. É autora do ebook paradidádico Transforme sua vida em livro (2020, Amazon Kindle) e de vários outros livros

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A ruas enrubescem

Só posso deduzir que o povão que há 13 anos começou a vislumbrar que seu destino poderia mudar, hoje se sente confuso. Não percebe que essas gravações obtidas de maneira ilícita e repetidas à exaustão pela mídia foram milimetricamente editadas e divulgadas como parte de um plano para implantar o caos

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Operária das letras, tenho circulado muito pouco. Ontem, sábado, tive rara oportunidade de passear pela cidade. Saí muito cedo, animada para a primeira aula de um dos cursos que ministro. Sem pressa, o roteiro foi café da manhã na padaria da esquina, a banca de jornais e dois ônibus até o meu destino. Acabei chegando a tempo de ainda fazer um passeio no Parque da Água Branca, colado à escola. Queria espairecer no encontro com a natureza e me desligar do romance que venho escrevendo.

Mas não consegui. Na manhã seguinte à grande manifestação pró-democracia que lotou a Paulista – e ao vazamento seletivo para a imprensa das conversas obtidas com grampo ilegal – , meus olhos e ouvidos atentos de cronista iam captando a todo momento fatias de conversas. Do chapeiro com o balconista "Cara, você ouviu? O cara endoidou...". "Como pode um ex-presidente da República falar assim?", perguntava o cobrador ao motorista do ônibus. "Nossa, que boca suja!", comentava o dono da banca com um taxista do ponto. "Mas falar palavrão não é pecado?", murmurava uma senhora, a saia muito comprida e os cabelos atados num coque, com o pipoqueiro na porta do parque. Esse foi o assunto do dia entre pessoas humildes, a voz assustada que se ouvia nas ruas. Quase um lamento.

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Sim, essa gente que votou em Lula, agora está chocada, não tanto pelo que escutou, mas com a forma como ele se expressava nas gravações. Essa gente acostumada com o linguajar elitista dos governantes, e que se encantou com a esperança que vinha na voz rouca de seu líder anos atrás, agora se encabula e se avexa, perplexa.

Tentando compreender por que o palavrão choca tanto, fui consultar o Houaiss: "palavra grosseira e/ou obscena". Mas há quem considere que, na linguagem popular brasileira, o palavrão é empregado via de regra como advérbio de intensidade. Afinal, quem consegue dizer apenas "Nossa, que lamentável!" quando prende um dedo na porta ou quebra um prato na pia? Atire a primeira pedra quem nunca, jamais usa um palavrão, aqui e em todo lugar. A revista Galileu publicou, em dezembro último, matéria baseada numa pesquisa conduzida por psicólogos em Massachusetts, cujo resultado aponta que as pessoas que usam palavrões com frequência possuem um vocabulário mais rico e melhor compreensão do significado das palavras.

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Então eu me pergunto: por que a divulgação de trechos de conversas do ex-presidente e ex-metalúrgico chocou tanto? Só posso deduzir que o povão que há 13 anos começou a vislumbrar que seu destino poderia mudar, hoje se sente confuso. Não percebe que essas gravações obtidas de maneira ilícita e repetidas à exaustão pela mídia foram milimetricamente editadas e divulgadas como parte de um plano para implantar o caos. Ponto para aqueles que trabalham na comunicação dos que querem derrubar a democracia: Lula pode cair no conceito dos eleitores nas próximas pesquisas – com números alardeados pela mídia que mostra gozar a cada divulgação – não pelos erros de conduta que lhe atribuem, não pelas traições e puxadas de tapete que vem sofrendo. Mas por causa de uns palavrões ditos em contexto privado. Pqp!

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