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Daniele Barbosa Bezerra

Doutora em Educação (UFC), professora, pesquisadora de gêneros biográficos e memorialísticos, contista e cronista.

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Adeus ao meu pai

Há 15 dias, entrou no hospital para uma cirurgia de urgência por conta de uma aderência no intestino, mas nesse tempo pegou uma broncopneumonia, o intestino parou de funcionar, e por fim, uma septicemia geral que o levou, no dia do nascimento de Jesus, ao patamar das saudades eternas

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Como se não bastasse o ano de 2020 permeado por sentimentos tão antagônicos, oscilando entre o otimismo e a desesperança, o trabalho árduo e o ócio culpado, encerro esse ano, tão traumático, sepultando o meu pai. Há 15 dias, entrou no hospital para uma cirurgia de urgência por conta de uma aderência no intestino, mas nesse tempo pegou uma broncopneumonia, o intestino parou de funcionar, e por fim, uma septicemia geral que o levou, no dia do nascimento de Jesus, ao patamar das saudades eternas.  A partir daí, entrei para as estatísticas daqueles que perderam seus entes queridos nesse ano funesto, sentindo o peso quase insuportável do luto. 

Durante esse tempo em que estive acompanhando-o no hospital, pegava-me em meio à insônia da madrugada refletindo sobre as possibilidades de desfecho para ele. Os sentimentos oscilavam entre o medo de me tornar órfã por completo, pois minha mãe já havia partido, e a coragem de seguir sozinha; entre a vida que se reiniciaria com a sua melhora ou a morte que transformaria a vida que se vai e a vida dos que ficam. 

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Julgava que não contestaria o rumo tomado pela sabedoria universal, acreditando-me madura e espiritualizada o suficiente para não contraditar os desígnios divinos. Mas que nada! O grito abafado e censurado que saía da minha garganta, após o conhecimento do seu óbito, foi quase o grito da menina que chorava de saudades -EU QUERO O MEU PAI- quando ele estava pelo mundo viajando pela Marinha do Brasil, para sustentar sua família e dar as melhores condições de vida e de educação para nós. A saudade era grande, mas a certeza de sua volta também. Agora era diferente, ele não mais voltaria. A partir daí, a criança ferida pela dor da perda teve que engolir o choro e se levantar, mesmo que manca, para resolver as burocracias tão desrespeitosas com a dor alheia. 

 Após a minha saída do hospital, sem o meu pai, constatei, ao olhar para o horizonte, que a paisagem se encontrava cinza, sem cores, mas tudo funcionava como antes. Os ônibus circulavam normalmente, as pessoas nas ruas encaminhavam-se para os seus afazeres, a banquinha do vendedor de café, na rua do hospital, já se encontrava aberta e lotada de trabalhadores. Num arroubo narcísico momentâneo, achei um absurdo que todos se encontrassem alheios à minha dor. Afinal, um bom pai havia partido e uma filha se desesperava! Todavia, voltando à razão, lembrei-me das 200.00 pessoas que se foram pela irresponsabilidade do governo genocida com a Covid-19, e aglutinei a minha dor a de outros órfãos de pai, mãe, filho, amigo, sobrinha, tia, tio, avô, avó, marido, esposa, irmão, irmã...e compreendi que a “dor da gente não sai no jornal”.    

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Assim, começarei em 2021 um novo ciclo em minha vida, a de ser órfã do Sr. Alberto, todavia com a certeza de que fui amada e cuidada por ele, mesmo que em muitos momentos não me sentisse assim, por querer dele, sempre mais. Eu te amo meu pai. 

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