Afinal, para que serve a violência?
A expansão da força fora do controle do Estado revela o enfraquecimento da democracia e a urgência de políticas que promovam justiça social
A violência é um instrumento ruim. Serve-se da lei do mais forte. Quem tem mais força, ganha. Não vale a pena.
A força deveria estar concentrada nas mãos do Estado, que deveria utilizá-la para fazer cumprir a lei, inclusive para evitar que setores indevidamente se valham da violência. Entre eles, está a condenação do uso da violência para o roubo, a apropriação ilegal de bens de outras pessoas.
Mas, de repente, vê-se que a violência está disseminada em vários setores da sociedade, especialmente nas periferias das grandes cidades, onde grupos armados agem para impor sua lei sobre uma população indefesa. São territórios aos quais o Estado não chega, não tem capacidade de impor as leis. Ou, pior ainda, várias vezes a polícia, que representa o Estado, está envolvida em interesses privados, em vez de zelar pelo interesse público.
Não se trata do armamento do povo para se defender da violência do Estado e das gangues armadas, mas de gangues armadas frequentemente vinculadas ao narcotráfico.
Muitas vezes, o Estado só chega a amplos setores das periferias das grandes cidades por meio da polícia. E da violência da polícia.
O monopólio da violência devia estar nas mãos do Estado. Devia, mas não está.
A violência está disseminada em tantos lugares da sociedade, especialmente onde as pessoas ficam vulneráveis a serem atacadas, roubadas, agredidas.
A democracia se enfraquece conforme a violência se dissemina pela sociedade, quando tanta gente é vítima e não consegue se defender.
Uma sociedade democrática é uma sociedade pacífica, sem violência. Mas ela é, ao mesmo tempo, uma sociedade justa, com pouca desigualdade, em que as pessoas têm acesso ao fundamental para poder viver de forma digna.
Quanto mais desigual a sociedade, mais violência. Quanto maiores as desigualdades, maior o grau de violência na sociedade. Não que a violência seja uma resposta às injustiças e às desigualdades.
A violência faz parte de uma sociedade em que o Estado é incapaz de zelar pela paz social, pelos direitos das pessoas, pela própria democracia. O Brasil tem ficado menos desigual como sociedade e, estatisticamente, os crimes de violência têm diminuído. Mas estamos ainda muito longe da igualdade e da ausência de violência na sociedade.
Os acontecimentos recentes no Rio de Janeiro revelam como o uso da violência pelo próprio governo não gera a paz, não gera a convivência pacífica entre as pessoas, não permite que as periferias tenham, no dia seguinte dos acontecimentos, uma vida mais tranquila, mais pacífica, com menos violência.
A violência está estreitamente vinculada, no Brasil, ao tráfico de drogas. Uma forma de diminuir esses efeitos é legalizar o consumo de drogas leves. O Uruguai fez isso já há vários anos, com grande sucesso. Não dá para entender como essa iniciativa não seja discutida, nem seja conhecida pela população.
É um exemplo de como se pode atacar, pelo menos em parte, a violência — aquela vinculada ao tráfico. Pelo visto, parece haver interesses que se opõem a essa legalização, porque faturam às custas dessa ilegalidade.
Se é possível diminuir a violência, ela é absolutamente indispensável para que cheguemos a ter uma sociedade democrática e fraternal.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.




