HOME > blog

Anistia nunca mais!

Um olhar sobre a anistia e os caminhos da humanidade diante da desigualdade, do fascismo e da luta do povo palestino

São Paulo (SP), 07/09/2025 - Ato em defesa da soberania e contra a anistia aos golpistas, na Praça da República (Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil)

O que é anistia? Teria perguntado Alice ao coelho que, momentos antes, havia lhe dito: “quem não sabe onde está não precisaria saber para onde vai a estrada pela qual caminha”.

Embora sua lógica de conhecimento estivesse limitada à sabença do lugar por onde caminhamos, o coelho não se esquivou em responder à jovem: “anistia é uma estrada que sempre volta ao lugar de origem”.

Temos sido Alice em um país de maravilhas desde que a estética da dominação, esgrimida na colonização dos costumes, nos bateu às portas, europeizando nossa essência na busca de uma maravilha que as cousas do mundo nunca refletiram, ainda que as circunstâncias parecessem maravilhosas.

Em que pese parecer distópica minha visão, apresso-me a apaziguá-la, em colorido terreno, lembrando aos que moram em condomínios cercados por muros de desigualdade que não é o concreto a nos proteger, mas sim o desconhecimento da estrada pela qual caminhamos.

Alice não sabia onde estava – é fato –, mas queria conhecer para onde a estrada pela qual caminhava a levaria. Podemos criticá-la?

Para você que aprendeu a odiar, teria algum sentido lamentar a morte de um herói seu que construiu um caminho de ódio tão intenso e sem qualquer sentido que, finalmente, lhe custou a própria vida?

Vocês conhecem a estrada pela qual caminham?

A humanidade segue por um fio ao tempo em que a empatia descortina a estrada pela qual deveríamos todos caminhar – é o desconhecimento que nos puxa pela manga, dizendo que amar é para os tolos...

Deveras, a história que o fascismo busca escrever não considera nossas circunstâncias, naquilo que nega o caminho, justamente para obnubilar o lugar em que estamos.

Não somos hipótese. Somos carne, sonhos e osso, a serviço da querença de nossos sentimentos. Somos o que a estrada jamais será: um fim em nós mesmos...

Ainda que não pareça importante o destino, tampouco o caminho que percorremos, a estrada a nos conduzir não é senão o pó que nossos passos esparramam pela trilha.

Nessa estrada nos perdemos e, perdidos, não somos senão uma pálida sombra do que poderíamos ter sido, enquanto o cara na cruz pedia ao pai que nos perdoasse, pois não sabíamos o que fazíamos.

Ainda em seu instante derradeiro, o cara lembrou que a estrada que leva ao desconhecido não elide as conjunturas que o caminho nos preparou, uma vez que não importa para onde vamos, e sim como vamos.

Meus sessenta anos estão represados na dor dos palestinos, na angústia das mães palestinas em seu universo bestial, onde o desencanto do desconhecimento da estrada não conduz a lugar algum – a não ser à morte.

Sou um latino que se tornou cidadão palestino, na conta dos caminhos por onde andei e, andarilho mundano, já não convivo com a crença do desconhecimento de minhas circunstâncias justificando a desilusão dos meus predicados.

Sigo firme em meus sentimentos, em que pese já não saber onde estou e não me importar para onde vai a estrada pela qual caminho, na crença de que viver é mais do que ter – afinal, viver segue sendo plural, enquanto a posse é transitória e unilateral.

O tempo que abraça o vento (seria o contrário?) não me conduz. Quem me diz o caminho são as histórias que assentam minhas desilusões, enquanto as circunstâncias se desligam de mim muito rapidamente, uma vez que vivo a segurança dos que não são bombardeados ao buscar comida.

Vou lhes contar um segredo que um anjo torto me confessou: não há terra santa alguma. Há terra e há gente. Santos são aqueles que convivem em paz, nesta terra, com esta gente.

Desde pequeno soube que a estrada não valia a gente que caminhava por seu pó, ainda que este pó guardasse o caminho dos muitos passos que a vida pedia dos caminhantes.

Palestina forever – Wakanda segue sendo o lugar onde os heróis imaginários descansam.

Há, entrementes, muito a construir. A luta é cotidiana, ainda que não saibamos onde estamos, tampouco para onde vai a estrada que nos conduz.

Tristes trópicos.

Saudade, pai.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.