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Fernando Bretas

Administrador com especialização em gestão estratégica e desenvolvimento sustentável

5 artigos

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Aqui não é o Haiti, é Macondo

Brumadinho ainda conta seus mortos no crime perpetrado pela Vale. Mesmo assim torce para que as operações da empresa assassina continuem pois, de acordo com a lógica impecável dos economistas e contadores de plantão, os cofres do município não podem ficar vazios

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A julgar pelas mais recentes manifestações dos políticos vitoriosos nas últimas eleições, cuja legitimidade só não é questionada pela velhinha de Taubaté e pela mídia oficial (pelo menos até que a reforma da previdência seja votada), vivemos momentos tão insólitos que fazem lembrar a eterna cidade perdida nos meandros da genialidade e da memória afetiva de García Marquez.

Para além da violência gratuita de governos estaduais amalucados que provocam o pânico através do terrorismo implantado nas comunidades mais pobres do seu território. Que tornam a ação paramilitar de hordas de milicianos política de Estado e que assassinam pessoas do alto dos helicópteros.

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Para além de outros governantes que estreiam em Estados importantes da Federação e demonstram todo o seu despreparo ao constatar que dirigir politicamente um território é bem mais complexo que administrar lojinhas de 1,99 ou rede de postos de gasolina e cujos incautos eleitores agora, atônitos, assistem ao Novo praticar o velho toma lá dá cá, abdicando da articulação política a entregando-a aos mesmos e eternos lobos de sempre, representantes dos interesses que manietam governos, Macondo vai fazendo história e se instalando paulatina e inexoravelmente em nosso inconsciente coletivo. Em nosso espírito de povo. Em nossa matriz cultural.

Mas não fica apenas aí. Macondo se materializa também nos municípios. Brumadinho ainda conta seus mortos no crime perpetrado pela Vale. Mesmo assim torce para que as operações da empresa assassina continuem pois, de acordo com a lógica impecável dos economistas e contadores de plantão, os cofres do município não podem ficar vazios. Estamos a completar três meses da tragédia. 300 pessoas mortas. Não há rua da cidade que não tenha perdido um morador. Mataram um rio. E setores importantes do município fazem coro com o discurso irresponsável da diretoria assassina e chantageia a população da cidade, que pensa seriamente em abandonar suas raízes e sumir dali na primeira oportunidade que as indenizações permitirem.

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Há precedentes? Sim. A mesma empresa, em conluio com outra multinacional do setor, matou um lugarejo, Bento Rodrigues, 19 pessoas e um dos mais importantes rios do Brasil. Destruiu municípios de dois Estados da federação. Usando dos mesmos estratagemas comprou o silêncio de alguns, os laudos necessários de outros e segue sem reparar as vítimas e muito menos os danos ambientais irreversíveis. Mesmo assim o desastre se repete e a mesma lógica se estabelece. O dinheiro aplacará a dor e daqui a alguns anos a tragédia, o crime anunciado, será mais um retrato pendurado na parede da memória.

Macondo ainda se materializa em meio a esta tragédia anunciada, de forma ainda mais cruel, insidiosa e mesmo odiosa, quando os poderes municipais escolhem, de forma política, a quem oferecer ajuda:

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Primeiro Ato: Donativos recolhidos de todo o Brasil chegam em profusão a Brumadinho. A solidariedade humana aliada a um sentimento de culpa coletivo que ainda será devidamente estudado pelos especialistas, proveu a cidade de todo tipo de material. Ao ponto dos responsáveis pela gestão solicitarem que as pessoas parassem de enviar donativos pois não havia mais necessidade. Cai o pano.

Segundo Ato: Acampamentos do MST em São Joaquim de Bicas. Margens do Paraopeba morto pelo crime. 10 minutos de distância de Brumadinho. 720 famílias acampadas em busca de seu quinhão. Ocupam terras de multinacional falida. Terra fértil que proporciona metade destas famílias a viver dela, plantando e vendendo sua produção. No seu trabalho usam a água do rio para irrigar suas plantações. Todos a usam para beber e cozinhar. Água boa límpida, água de cachoeira...Agora rio morto pelo crime ambiental cometido. Proibida sua captação e utilização. Água passando na frente das casas e pessoas com sede e com fome. Cai o pano.

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Terceiro ato: Pedido de ajuda desesperado das famílias. A sociedade civil se mobiliza. Aciona os poderes públicos. Uma semana se passa. Nada de donativos. A segunda semana passa mais rápido. As famílias dividem o que não tem. A sociedade civil cobra providências urgentes. MP secretarias de municípios se reúnem... agora vai!!! Nada. Os donativos não são para os atingidos. São para cidadãos com título de eleitor. Reconhecidos e reconhecíveis. Não interessa se precisam. Os critérios são políticos. Quem precisa não recebe. Cai o pano. Fim da peça. Fim da esperança nas instituições.

O realismo fantástico de Marques, mais uma vez, se mostra presente quando Brumadinho sofre uma invasão. Instituições de todas as partes: advogados oportunistas, pastores charlatães, ONGs que ninguém nunca soube da existência. Outras que fazem o coração das primeiras damas da elite endinheirada (pasmem, mas Brumadinho tem elite e endinheirada) pularem de contentamento pelas fotos que renderão páginas e páginas de Facebook ou de Instagram.

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Curtidas e likes pulularão como os peixes do Paraopeba nunca mais o farão. Entretanto sofrem ao lado destas, instituições que tem anos de experiência na resistência contra a mineração. Movimentos sociais com currículos respeitáveis tentam abrir os olhos dos atingidos. Demonstrar que unidos terão mais chance de fazer a assassina pagar pelo crime cometido. Organizar a resistência da população é o primeiro passo para impedir Marianas. Dar voz, vez e protagonismo a ela deve ser o principal objetivo. O trabalho é grande. Muita gente precisa ser acolhida e orientada. E exatamente ai Macondo novamente se manifesta. Movimentos e ONGs se digladiam. Quem representa verdadeiramente a população atingida?. Ataques são desferidos. A cizânia se instala. A empresa assassina se tranquiliza.

E os oportunistas batem palmas. Finalmente Mariana triunfará. E o povo.... Esperará por outra Macondo, em pleno Haiti.

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