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Márcio Bueno

Jornalista, autor, entre outros, do livro “A origem curiosa das palavras”, Ed. José Olympio

7 artigos

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Arrancando tudo até de quem não tem nada

Conhecendo a prática criminosa desses vendilhões do templo, que se apresentam como representantes divinos na Terra e prometem prosperidade em troca de doações, explorando até pessoas que passam por dificuldades extremas, é o caso de se perguntar: Como pode tanta gente acreditar que eles acreditam em Deus?

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Há muito tempo, os pastores de algumas igrejas evangélicas vêm se especializando em arrancar tudo o que podem até de quem não tem nada. Os cultos se transformaram em verdadeiros aspiradores das economias dos fiéis. A Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) é uma delas. Agora, o Ministério Público do Rio de Janeiro diz ter encontrado indícios de que a IURD foi usada para lavar dinheiro da corrupção na prefeitura do Rio, cujo titular é o bispo licenciado Marcelo Crivella. Segundo o MP, houve movimentações atípicas de nada menos que R$ 6 bilhões nas contas da IURD, no período de um ano – de 1º de maio de 2018 a 30 de abril de 2019. 

Investigar a prática dessas igrejas já não era sem tempo. Em 1989, o pastor dissidente da Universal, Carlos Magno, divulgou um vídeo em que o bispo Edir Macedo ensinava os membros da cúpula da igreja a avançarem nos bolsos dos frequentadores dos templos. Gesticulando muito e, em tom de deboche, Macedo dizia: “Você tem que chegar e se impor. Olha pessoal, você vai ajudar agora na obra de Deus. Se quiser ajudar, amém, se não quiser, Deus vai escolher outra pessoa para ajudar”. E prosseguia: “Entendeu como é que é? Se quiser, bem, se não quiser, que se dane. Ou dá ou desce. Porque aí o povo vê coragem em você. Se for aquela coisa chocha, não vão confiar em você. Você tem que ser o super-herói do povo.”

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Carlos Magno divulgou também as imagens de uma reunião realizada num hotel 5 estrelas de Angra dos Reis-RJ e acrescentou que, na época áurea da Igreja, havia respeito com o dinheiro doado, que era sagrado para Deus. As reuniões eram na própria sede da Igreja. Depois, segundo Magno, Edir Macedo “mudou a visão e as reuniões passaram a ser feitas em hotéis cinco estrelas, com grupo de mais de cem pessoas, gastos com lanchas, iates, convidados ilustres, como são os casos de deputados”. E essa mordomia toda é bancada, desde então, com o dinheirinho suado dos fiéis, por mais humildes que sejam.

Aí parece estar o início dessa voracidade arrecadadora, que foi adotada também pelos dirigentes de outras denominações religiosas. É o caso de Marco Feliciano, pastor-presidente da Igreja Assembleia de Deus – Catedral do Avivamento. Diz ele, dirigindo-se aos fiéis, que “a benção da prosperidade NÃO vem lá de cima. Vem de onde? Se for homem, coloque a mão no bolso; se for mulher, coloque na bolsa. Vem daí. A prosperidade está no seu bolso.” Com isso, ele quer dizer que só será ajudado por Deus quem doar para a Igreja. E ainda sugere ser magnânimo ao dizer: “Esta noite, eu vou lhe dar uma chance de ser abençoado”.

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Marco Feliciano usa vários argumentos para extrair dos fiéis as doações, que são chamadas espertamente de “sementes”. Inclusive, apelando para a competição com outras igrejas. “Queria que não perdêssemos para outros segmentos do cristianismo. Nós não podemos perder para eles nesta noite.” Em seguida, passa a recolher dinheiro, cheques pré-datados e até cartões de crédito. “(Fulano) doou o cartão, mas não doou a senha. Aí não vale. Depois vai pedir um milagre pra Deus e Deus não vai dar e vai falar que Deus é ruim.” Mas o pastor não se contenta com esse crime. Ele vai em frente, encontrando uma maneira de arrancar dinheiro até de quem não tem um centavo no bolso. “Os que estão sentados é porque não têm nada, com certeza. Então, os que estão de pé devem olhar quem está sentado ao seu lado e emprestar um dinheiro a eles, só para eles não ficarem sentados”. 

O mais chocante é quando um deficiente físico chamado Juscelino Luiz, falando com certa dificuldade, aproxima-se em sua cadeira de rodas e diz que vai doar R$ 1.000,00. Diz ele: “Dias atrás eu vim aqui e disse assim: ah, Gedeão está virado no negócio de ganhar dinheiro. Ali, eu imagino que Satanás tava cegando a minha mente. E hoje, eu quero ver a minha vitória aqui, pela fé: R$ 1.000,00”. Feliciano, ainda visivelmente impactado, diz que Juscelino vai voltar para casa como o homem mais abençoado da festa. Passando a mão na cabeça do doador, o pastor já vislumbra ali uma oportunidade de explorar a sua deficiência: “Ainda vou pregar com você por aí, viu garoto?”

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Silas Malafaia, líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, é outro pastor visto como um espertalhão. Em entrevista a um programa de TV, disse que tinha ouvido o seguinte comentário do apresentador Ratinho: “Cara, sabe o que eu acho interessante em você? É que você diz assim: não adianta tirar dinheiro do pão dos teus filhos nem das tuas contas pra mandar pra mim. Não, porque você vai estar ferrado, Deus não vai quebrar o teu galho, não. Então, cumpra a sua obrigação de cidadão.” 

O único problema destas belas palavras é que estão muito distantes da realidade. E a mentira é de quem, Malafaia ou Ratinho? Porque, na verdade, o pastor diz aos fiéis que, se não tiverem dinheiro nem talões de cheques, não tem problema. Como todas as coisas desse mundo, o cartão de crédito foi criado por Deus. E se Ele criou é para ser usado. Ele não iria criar o cartão pra ficar na gaveta, não teria sentido. Criativo, Malafaia ensina como contribuir: “Por exemplo, eu pago R$ 500,00 de aluguel. Eu vou oferecer uma semente (doação) de um aluguel para que o Senhor possa abrir a porta pra eu ter a minha casa própria.” 

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Mostrando-se extremamente generoso, ele informa que o valor de um aluguel pode ser doado à vista ou então ser dividido entre os meses de abril e dezembro. E da maneira que o doador quiser – em um mês doa R$ 30,00, no outro R$ 50,00, desde que complete o valor de um aluguel até o final do ano. Se não fosse uma fraude, o esquema de realizar o sonho da casa própria por apenas R$ 500,00, é realmente irresistível. Ele tem uma receita também para quem está pagando a casa própria: “Você vai pegar o valor de uma mensalidade e pagar de uma vez ou então dividir, como quiser, entre os meses de abril a dezembro. Isto é para que Deus te dê os recursos até o final para quitar essa casa”.

Ao contrário do que disse Ratinho, Malafaia não perdoa nem quem está morando de favor: “Você vai pegar 30% do que ganha em um mês, e dividir entre os meses de abril a dezembro”. Mas, e se além de morar de favor, a pessoa está desempregada? Aí, é demais. Qualquer bandido comum teria desistido da empreitada, mas não o pastor Malafaia. Ele orienta o fiel a doar 30% do valor de um mês de ajuda. Com isso, Silas Malafaia, que já foi chamado de Silas Maracutaia, ao contrário do que teria dito o apresentador Ratinho, arranca dinheiro até de quem está zerado. O pastor criou uma espécie de “trízimo” para os fiéis.

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Esse esquema criado por Edir Macedo está dando supercerto. Mas apenas para quem recolhe as “sementes”, que germinam, isto sim, no quintal dos bispos e pastores. Hoje, vários líderes dessas igrejas estão milionários e até bilionários, dispõem de jatinhos e mansões cinematográficas. De acordo com a revista Forbes, Edir Macedo é o mais rico, com um patrimônio de nada menos que R$ 4,7 bilhões. Ele mora numa mansão de 4 mil metros quadrados de área construída. No espaço do seu imóvel, cabem nada menos que 100 apartamentos conjugados, de 40 metros quadrados cada um. Macedo controla ainda uma gravadora, a Folha Universal e a TV Record, a segunda colocada no ranking das TVs abertas.

O patrimônio de Waldemiro Santiago, um ex-Universal e fundador da Igreja Mundial do Poder de Deus, é calculado em R$ 1,1 bilhão. O terceiro colocado, R.R. Soares, é detentor de uma fortuna calculada em R$ 625 milhões. Segundo a revista, “se acontecer de você ser um pregador evangélico brasileiro, as chances de ganhar na loteria celestial são realmente muito altas hoje em dia.”

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Conhecendo a prática criminosa desses vendilhões do templo, que se apresentam como representantes divinos na Terra e prometem prosperidade em troca de doações, explorando até pessoas que passam por dificuldades extremas, é o caso de se perguntar: Como pode tanta gente acreditar que eles acreditam em Deus?

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