Arrogância e bajulação
Não é a primeira vez que a macheza dá lugar à falta de caráter
Chega a ser chocante a dignidade com que Lula, injustiçado, se apresentou diante do juiz (Sérgio Moro), nas armações que o levaram à detenção por 580 dias na Polícia Federal, em Curitiba. Em compensação, que espetáculo deplorável o de Jair Bolsonaro, humilde, adulador, ao se submeter ao interrogatório de Alexandre de Moraes! Parece difícil prever até que ponto cedem as emoções humanas na eventualidade de certas reviravoltas. Bravatas viram excentricidades de temperamento; palavrões se transformam em humildes pedidos de desculpas; provas de culpa nas conspirações contra o regime democrático, na falta de outros argumentos, se transmutam em risos de adolescente antes do castigo. Não é a primeira vez que a macheza dá lugar à falta de caráter, bem escondido até então, no poder ou fora dele.
Cabe reconhecer que, naquela data, o ex-presidente não foi o único a arranhar antigos papéis de autoridade. O general Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa, se esmerou em se revelar submisso nas justificativas para o magistrado e, segundos depois, com o próprio advogado, evoluiu para a dureza brutal, desprezando e desmoralizando o seu representante a ponto de fazer o público gargalhar. Deve ter se habituado, no decorrer da carreira, a obedecer servilmente aos superiores e esmagar os subalternos como um Grão-senhor. Lições a tirar daquilo: todos os tipos de comportamento que os jovens, à procura da maturidade, não devem reproduzir, sob o risco de ficarem mal na foto.
No ritual do depoimento, se concedia aos réus o direito de mentir. Alguns recorriam ao silêncio, como o esperto general Augusto Heleno, ou a subterfúgios: não se recordavam, a memória os traía, as provas lhes provocavam escândalo, vide o deputado Ramagem, antigo diretor da Abin. Nós, observadores, custávamos a crer no que assistíamos. Que conjunto seleto de pessoas vis! Não é todos os dias que se reúne uma plêiade de gente de tão má qualidade, do chefe aos seguidores criteriosamente selecionados para os mais altos cargos da República. Anderson Torres, aguardava, com paciência nervosa, o que lhe reservavam para distingui-lo nas trapalhadas em que se envolvera, comparsa fiel que fora para o velho e irresponsável líder político. Dessa turma, cada um deles dera a sua contribuição, julgando que os reservariam para postos de destaque, depois de vitoriosos no golpe de força. Sem exceção, esmeraram-se na arrogância e agora na bajulação, técnica de infratores apavorados com a iminência da cadeia.
O país acompanhou perplexo a exibição das fraquezas de caráter entre os atores de segunda que pouco tempo antes seguraram as rédeas do poder, levando-nos para onde desejavam. Como tudo que tem início tem fim, desfrutamos de uma reviravolta eleitoral que finalmente apostou na coragem, na solidariedade e na fraternidade como seus valores. Bolsonaro e Cia. devem, sim, sem anistia, pagar um preço pelo que realizaram em termos de estupidez e prepotência. A simples bajulação não lhe diminuirá a responsabilidade.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

