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José Álvaro de Lima Cardoso

Economista

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Banco Central independente e o poderio dos bancos na realidade brasileira

Não pode haver dúvidas que a instituição deveria também contribuir com políticas que possibilitem o crescimento da economia e do emprego no país

(Foto: © Ueslei Marcelino / Reuters)
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Como é de conhecimento público em fevereiro de 2021 entrou em vigor a lei que estabelece a chamada autonomia do Banco Central (Lei Complementar 179), que, dentre várias mudanças, estabeleceu mandatos de quatro anos para presidente e diretores dessa autarquia federal, em períodos que não coincidem com o mandato do presidente da República. Entre os defensores da independência do banco central predomina a concepção de que esse órgão deve tratar exclusivamente da estabilidade econômica (controle da inflação), colocando em segundo plano o crescimento da economia e do emprego. Esta visão é predominante nesse debate, inclusive entre setores com posições políticas consideradas progressistas em outros assuntos. 

O certo é que, do ponto de vista técnico, a independência do banco é uma posição mais difícil de sustentar, é mais fácil defender a posição contrária.  No entanto, nessa discussão, a mídia dominante veicula quase tão somente as posições de interesse do capital. Como de resto ocorre em temas cruciais como esse, centrais para a gestão econômica (a política monetária é essencial, especialmente nesta época de predomínio dos bancos na economia). Para complicar, trata-se de tema árido, afeito aos especialistas, de difícil compreensão para a população em geral, que não tempo ou formação para se concentrar nesses assuntos.

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Mas é certo que economistas e outros profissionais, que têm uma posição nacionalista e desenvolvimentista e argumentos sólidos contra a independência do Banco Central, praticamente não dispõem de espaço na mídia para veicular suas ideias. Praticamente só se assiste à posição dos defensores da independência do banco central, o que se explica até pelo poderio financeiro dos bancos.  

 Se os diretores do Banco Central do Brasil (BCB) não têm subordinação hierárquica, de caráter público, sua atuação fica sem mecanismos de controle. A medida correta neste grave momento que o Brasil atravessa seria justamente a ação oposta, ou seja, aumentar o controle e a transparência do Banco, colocando as suas políticas ao serviço do país. A independência do BCB, considerando como funcionam no Brasil essas estruturas burocráticas, na prática garante o controle do Banco Central pelos banqueiros, por meio de seus representantes. 

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Vale lembrar que antes da chegada da lei da independência, o BCB já tinha total autonomia operacional no Brasil, ou seja, ele operava a política definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). Criado em 1964, o CMN compõe a estrutura básica do Ministério da Economia e tem como responsabilidades gerais a de formular a política nacional de moeda e de crédito e garantir a estabilidade da moeda. O Conselho tem reuniões mensais nas quais seus membros analisam as tendências da economia e indicam políticas a serem encaminhadas pelo governo. O CMN é composto pelo Ministro da Economia, que exerce sua presidência, pelo Presidente do Banco Central e pelo Secretário Especial de Fazenda do Ministério da Economia. O certo é que antes da independência o BCB tinha grande liberdade para agir dentro de determinados marcos e atingir o seu primeiro objetivo legal previsto, que é o de combater a inflação.

Por exemplo, Henrique Meirelles, presidente do BCB entre 2003 e 2011, gozava de total liberdade para fazer suas políticas no Banco, que inclusive, de certa forma colidiam com a perspectiva mais desenvolvimentista de outras áreas do governo à época. Sintoma dessa independência era o fato de que o vice-presidente naquela ocasião, José Alencar Gomes da Silva, se queixava recorrentemente da política de juros explosivos praticada por Meirelles. Salvo a hipótese de ser mero jogo de cena, o fato indica que o BCB exercia na prática independência técnica e política. 

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Isso acontecia mesmo com a existência, na ocasião, de um governo popular moderado e de seu presidente ter conhecimento dos prejuízos decorrentes das elevadas taxas de juros para a economia e para a população. Era uma política claramente antinacional, contra o desenvolvimento da economia e operada exclusivamente em benefício dos rentistas. Henrique Meirelles havia sido recrutado diretamente das fileiras do Banco de Boston, um grande conglomerado financeiro internacional. 

Apesar da retórica dos liberais de que o Banco Central deveria cuidar apenas da estabilidade de preços – utilizando, ademais, uma arma limitada, que é a taxa de juros –, não pode haver dúvidas que a instituição deveria também contribuir com políticas que possibilitem o crescimento da economia e do emprego no país. O Banco Central não pode desenvolver política monetária que desconsidere a estratégia mais geral do governo, de crescimento da economia. A defesa de mandato único do Banco Central (o controle da inflação) explica em parte o Brasil praticar durante décadas as taxas de juros mais elevadas do mundo, interesse visceral e direto dos bancos que embolsam fortunas com essa política. 

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Há todo um esforço dos setores conservadores no sentido de apresentar discutíveis razões técnicas, para algo que é, fundamentalmente, de interesse dos banqueiros e seus apaniguados. O banco central sempre foi dominado pelo capital financeiro, guardadas as devidas especificidades de cada período histórico. É evidente, inclusive, que com a onda neoliberal, que alcançou o Brasil ainda no final da década de 1980, essa dominação amplificou, fato comprovado até pela citada presença de Henrique Meirelles nos governos do Partido dos Trabalhadores. 

Com o golpe de 2016 assumiu como novo presidente do Banco Central o economista-chefe e sócio do Itaú Unibanco, Ilan Goldfajn, saído diretamente do cargo de economista-chefe do Itaú Unibanco, maior banco privado brasileiro. Na ocasião formalmente Goldfajn se desligou do banco, medida totalmente proforma, visto que toda a sua formação política e acadêmica está diretamente ligada ao pensamento conservador e aos bancos. Coincidência ou não, em 2017 o governo de Michel Temer garantiu o perdão de uma dívida de aproximadamente R$ 30 bilhões para Bradesco, Itaú e Santander. 

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Enquanto os bancos apoiavam uma campanha pública de liquidação de direitos dos trabalhadores operada pelo governo federal, demitiam milhares de bancários, terceirizavam os serviços e precarizavam de todas as formas as condições de trabalho, o governo simplesmente perdoava suas dívidas. Era a própria “ponte para o futuro” em plena ação de beneficiamento dos bancos com dinheiro público. Somente o Itaú, instituição de origem do então presidente do Banco Central, acumulava R$ 25 bilhões de dívidas com a Receita Federal, contraídas no processo de aquisição do Unibanco. 

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