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Marcelo Zero

É sociólogo, especialista em Relações Internacionais e assessor da liderança do PT no Senado

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Biden pode ser um tiro no pé dos Democratas

"A aposta no conservador Biden para enfrentar o também conservador Trump pode ser equivocada", escreve o colunista Marcelo Zero. "Biden deve perder a disputa do voto conservador para Trump e, por outro lado, não motivar o eleitorado jovem, o eleitorado mais progressista, o eleitorado hispânico e o eleitorado mais pobre"

(Foto: REUTERS/Bastiaan Slabbers)
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Os resultados da Super Tuesday, ocorrida neste último dia 3, mostram que a poderosa máquina do Partido Democrata foi colocada a serviço do pré-candidato Joe Biden. 

Biden, que tinha ido muito mal nas prévias anteriores, à exceção da Carolina do Sul, ressurgiu das cinzas para ganhar em 9 estados: Arkansas, Alabama, Massachusetts, Minnesota, North Carolina, Oklahoma, Tennessee, Texas e Virginia.  Em alguns desses estados, como Minnesota e Massachusetts, lugares nos quais se esperava a vitória de Sanders, Biden ganhou sem sequer fazer campanha. 

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Já Sanders assegurou a vitória no maior colégio eleitoral (Califórnia) e em Vermont, Utah e Nevada. O resultado do Maine continua indefinido. 

As projeções indicam que Biden deverá ter algo em torno de 670 delegados e Sanders ao redor de 590. São necessários 1.991 para assegurar a nomeação como candidato oficial do partido.

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Assim, Sanders continua no páreo, mas consideravelmente enfraquecido. Biden emerge como favorito e os outros candidatos, como Warren e Bloomberg já não têm mais nenhuma chance. 

A ascensão de Biden foi conseguida graças ao apoio dos eleitores afro-americanos, dado o apoio de Obama ao seu antigo vice, e à afluência, de última hora, de eleitores democratas conservadores aos locais de votação para apoiar Biden, convocados que foram pela máquina partidária. 

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Há uma grande campanha dos democratas conservadores, da plutocracia norte-americana e da imprensa convencional contra a candidatura independente de Sanders, exclusivamente financiada por doações de pessoas físicas. 

Essa campanha se baseia, fundamentalmente, em três argumentos falaciosos.

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O primeiro é o de que Sanders seria muito velho (78 anos), além de ter sofrido recentemente um ataque cardíaco. Portanto, não teria condições físicas de assumir plenamente a presidência. Ora, Biden é apenas um ano mais novo que Sanders (tem 77 anos). Além disso, o ataque cardíaco sofrido por Sanders não foi grave e ele está plenamente recuperado. Sanders é incansável. 

O segundo argumento é o de que Sanders não teria condições de derrotar Trump. Apenas Biden, que é mais moderado, seria capaz de derrotar o candidato republicano. Essa falácia foi decisiva, nesse resultado da Super Tuesday. Ora, não é o que dizem as pesquisas. 

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A pesquisa mais recente, feita pela Fox News, indica que Sanders ganharia, hoje, de Trump, no voto popular, por 49% a 42%. Segundo a mesma pesquisa, Biden também ganharia de Trump por 49% a 41%. A vantagem de Biden sobre Sanders seria, desse modo, de apenas 1%. Outras pesquisas, como a da Yahoo News, dão uma vantagem maior para Biden (3%), mas mantêm a previsão de que Sanders poderia derrotar Trump. 

Há de se considerar que Biden é mais forte nos estados conservadores, onde se espera a vitória de Trump. Biden deverá perder a disputa do voto conservador para Trump. 

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Já o afastamento de Sanders da disputa poderá afugentar o voto dos jovens e do eleitorado mais progressista, pois nos EUA o voto é facultativo. Foi esse tipo de voto, associado a uma grande afluência às urnas, que conduziu o Partido Democrata à grande vitória de Obama, em 2008. Na época, também diziam que Obama não teria muitas chances. Contudo, Obama ganhou o pleito por esmagadora maioria, a maior diferença em meio século, justamente por ser um candidato “diferente”. 

O terceiro argumento, vinculado ao segundo, tange à suposta “radicalidade” do senador de Vermont. Sanders é constantemente caracterizado como um candidato “muito radical”, “populista” e “socialista”, cujas propostas são “perigosas” e “inexequíveis”.  

Uma análise mais acurada, porém, mostra que a agenda econômica de Sanders, que ele chama de “21st Century Economic Bill of Rights” (Declaração de Direitos Econômicos do Século XXI), nada mais é que a agenda que a socialdemocracia europeia implantou no pós-guerra do século XX. 

Sanders afirma, com razão, que é não é normal que o país mais rico do mundo tenha 40 milhões de pessoas abaixo da linha da pobreza, 34 milhões de cidadãos sem nenhuma assistência à saúde e metade de sua população mal tendo o suficiente para sobreviver. 

Ele quer que todo cidadão norte-americano tenha acesso à educação pública gratuita em todos os níveis (inclusive o universitário), a um sistema de saúde gratuito e de qualidade, à habitação a preços acessíveis e a uma aposentadoria decente. Ressalte-se que, hoje em dia, os cidadãos dos EUA estão afogados em dívidas com hipotecas de habitação (US$ 9,44 trilhões), financiamentos de estudos universitários (US$ 1,6 trilhão) e saúde (US$ 82 bilhões). 

Bernie que acabar com essas dívidas ou reduzi-las e financiar sistemas públicos e gratuitos, em saúde e educação, taxando a especulação financeira e os muito ricos. Além disso, Sanders propõe aumentar o salário mínimo para US$ 15 a hora e incrementar a taxa de afiliação a sindicatos, com o objetivo de ampliar a poder de barganha dos trabalhadores.

Enfim, Sanders quer salvar o capitalismo norte-americano do beco sem saída da desigualdade, da pobreza e das dívidas impagáveis dos trabalhadores e das classes médias. Quer construir, com décadas de atraso, um Estado de Bem-Estar digno da nação mais rica do mundo. Quer fazer o que a maior parte dos países europeus importantes e o vizinho Canadá já fizeram.  E quer reconstruir a outrora pujante e afluente classe média dos EUA.

É por isso que ele vem empolgando os eleitores mais jovens e progressistas, assim como os hispânicos, que historicamente comparecem muito pouco às urnas, mas que estão bastante comprometidos com Bernie. Sanders, do alto de seus 78 anos, representa um sopro de verdadeira renovação na mesmice conservadora da política dos EUA. 

Portanto, a aposta no conservador Biden para enfrentar o também conservador Trump pode ser equivocada. Biden deve perder a disputa do voto conservador para Trump e, por outro lado, não motivar o eleitorado jovem, o eleitorado mais progressista, o eleitorado hispânico e o eleitorado mais pobre. Este último, frise-se, também comparece pouco às urnas. 

Considere-se que a questão do comparecimento, num país com voto facultativo, é fundamental. Com o carismático Obama, em 2008, o comparecimento foi de quase 59%. Com o conservador e apático Gore, em 2000, o comparecimento foi de 50%. Gore perdeu para Bush, mesmo ganhando no voto popular. Já Obama ganhou fácil, tanto no voto popular quanto no Colégio Eleitoral (365 contra 173). 

A polarização e o consequente estímulo ao comparecimento às urnas poderiam favorecer os democratas, na disputa de novembro. A mesmice tende a favorecer os respublicanos.

Com o morno e conservador Biden, a coisa pode se complicar. Pode ocorrer o que normalmente ocorre: só sairão em grande número para votar os brancos conservadores. Os que poderiam fazer a diferença ficariam em casa, sem estímulos para votar.

A aposta em Biden e a demonização de Sanders e de suas propostas podem ser um tiro no pé dos democratas. 

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