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    Eduardo Costa Pinto

    Professor do Instituto de Economia da UFRJ e Pesquisador do INEEP/FUP

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    Bolsonaro e os generais: a guerra continua

    Olavo chamando os militares de frouxos, corte do orçamento das forças, clã Bolsonaro emitindo sinais dúbios a respeito da atuação militar brasileira na Venezuela e as forças armadas deixando explícito que não atuaram militarmente na Venezuela. Será que dá para ligar as pontas?!

    Bolsonaro e os generais: a guerra continua (Foto: ABr | Reprodução)

    O Gal. Eduardo Villas Boas, em discurso de despedida do Comando das Forças Armadas (em 11 Janeiro 2019), afirmou:

    "Excelentíssimo senhor presidente Bolsonaro e senhora Michelle. Festejamos suas presenças, assim como a nação brasileira festeja os sentimentos coletivos que se desencadearam a partir de sua eleição e assunção do cargo. O senhor traz a necessária renovação e a liberação das amarras ideológicas que sequestraram o livre pensar, embotaram o discernimento e induziram a um pensamento único (...)"

    "2018 foi um ano rico em acontecimentos desafiadores para as instituições e até mesmo para a identidade nacional. Nele três personalidades se destacaram para que o 'Rio da História' voltasse ao seu curso normal. O Brasil muito lhes deve. Refiro-me ao próprio presidente Bolsonaro, que fez com que se liberassem novas energias, um forte entusiasmo e um sentimento patriótico há muito tempo adormecido. Ao ministro Sérgio Moro, protagonista da cruzada contra a corrupção ora em curso e ao general Braga Netto, pela forma exitosa com que conduziu a Intervenção Federal no Rio de Janeiro. Todos demonstraram que nenhum problema no Brasil é insolúvel".

    "Liberação das amarras ideológicas". "Rio da história voltasse ao seu curso normal" com a eleição de Bolsonaro.

    E agora recentemente no bate-boca digital com o ideólogo do clã Bolsonaro, Olavo de Carvalho - que repete o pensamento dos paleoconservite norte-americanos -, Villas Bôas afirmou que o ideólogo era o "Trotsky da direita", pois estaria causando a desunião.

    Sim, Villas Bôas é responsável pela vitória do Bolsonaro. Quem afirmou isso foi o próprio presidente em discurso!

    Sim, o Villas Bôas acredita que estaria em curso um projeto de "amarras ideológicas" ("politicamente correto" que é igual ao "marxismo cultural" para os paleoconservite) organizado pela esquerda brasileira!

    A crítica do Villas Bôas é de forma/estratégia/tática operacional e não de conteúdo. O clã Bolsonaro e seu guru querem realizar uma revolução! Se consideram "jacobinos da direita", logo tem que destruir "tudo que tá aí". O núcleo militar quer realizar uma mudança, planejada e estruturada para recolocar o "rio da história" de volta ao seu curso normal.

    Em entrevista recente ao Estadão, o Gal. Chagas, no meio do bate-boca virtual com guru do clã Bolsonaro, afirmou que "ele e seus colegas não precisaram do morador da Virgínia para saber da existência do teórico comunista italiano Antonio Gramsci. Antes de existir Olavo de Carvalho, já se falava sobre Gramsci nos quartéis e a ameaça que ele representa. O general Coutinho (Sergio Augusto de Avellar Coutinho) já falava sobre isso(...)."

    O problema foi e é que parte expressiva dos militares acreditaram e acreditam que existia uma conspiração de esquerda (MCI).

    A obra do Gal. Avelar Coutinho (Cadernos da Liberdade) é uma aplicação da guerra de 4ª geração, desenvolvida por William Lind (um paleoconservite), tendo como inimigo nacional os movimentos de esquerda. A diferença e que nos EUA os teóricos da guerra de 4º geração argumentavam que os inimigos eram os estrangeiros.

    A guerra fria acabou! O que vivemos hoje não é uma disputa entre regimes econômicos (capitalismo x comunismo), mas sim um disputa econômica, política, tecnológica entre os estados nacionais e seus interesses internos vinculados às suas empresas e seus interesses tecnológicos, militares, etc.

    Se há uma conspiração internacional, afirmo sem dúvida alguma que não é a dos comunistas, muito menos da Ursal.

    Por outro lado, o que existe hoje são táticas de guerra não convencional que as grandes potências utilizam para desestabilizar os seus oponentes ou quem não segue as suas linhas. Isso vale tanto para os EUA, na Ucrânia e na Síria, como para a Rússia na eleição dos EUA e para a atuação da China na guerra cibernética.

    Esse tipo de estratégia militar é milenar, como afirma Sun Tzu: “o mérito supremo consiste em quebrar a resistência do inimigo sem lutar”. A questão é que isso ganhou uma nova dimensão com as novas tecnologias, as redes sociais, etc, ganhando um novo nome: guerra híbrida que é um desdobramento da guerra de quarta geração.

    Os grandes estados nacionais (EUA, Rússia, China) utilizam os instrumentos da guerra híbrida para alcançar seus interesses estratégicos.

    Villas Bôas, Olavo de Carvalho não é um "Trotsky da direita", mas sim uma caixa de ressonância dos interesses dos paleoconservite dos EUA (Bannon, Lind e companhia que é um dos apoios do governo Trump) que queria que vocês entrassem numa guerra convencional na Venezuela.

    Carvalho é Bannon (que representa uma ala mais radicalizada do governo Trump), que é Eduardo Bolsonaro, que é Jair Bolsonaro.

    Como vocês não entraram na guerra da Venezuela, Olavo chama vocês de frouxos e Bolsonaro corta 43% do orçamento das forças armadas.

    Enquanto isso o Brasil segue desintegrando e as instituições desmanchando, inclusive agora as Forças Armadas que resolveram entrar no jogo do lado do clã Bolsonaro.

    Os militares que criticam tanto a ideologização acabaram se tornando uma espécie de "Barão de Munchhausen". Em outras palavras, as forças armadas brasileiras tornaram-se uma quinta-coluna dos interesses dos Estados Unidos sem necessariamente desejar assumir esse papel. Isso ocorreu em virtude do diagnóstico do alto comando do exército, e de Villas Bôas, de que o problema do Brasil seria fruto das estratégias da esquerda que estaria dividindo o país.

    A guerra fria acabou! Achar que o PT estava realizando uma revolução grasmicista silencia em direção ao comunismo é no mínimo inusitado! Quando será que as Forças Armadas vão superar o trauma da "intentona comunista" de 1935? Haja Freud!

    Não é a "revolução gramicista" ou o "politicamente correto" que está dividido o país, nos termos de Avellar Coutinho e de Villas Bôas, respectivamente. Estamos sob influência dos efeitos de uma guerra híbrida (interesse dos EUA) em curso que está dilacerando a nação.

    Olavo chamando os militares de frouxos, corte do orçamento das forças, clã Bolsonaro emitindo sinais dúbios a respeito da atuação militar brasileira na Venezuela e as forças armadas deixando explícito que não atuaram militarmente na Venezuela. Será que dá para ligar as pontas?!

    Provavelmente, se algum militar ler esse artigo vai me acusar de ser "o Trotsky da esquerda" querendo dividir a direita. Mais ainda: vou ser classificado de um “intelectual orgânica” (um verdadeiro marxista cultural perigoso) querendo criar um senso comum modificado e criar a cisão na direita!

    Pode até ser, mas enquanto isso a guerra de todos contra todos continua, o país segue numa entropia e os militares tomando esculacho do ideólogo do Clã Bolsonaro por serem contra a atuação militar do Brasil na Venezuela!

    Seguimos ladeira abaixo...

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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