Pedro Maciel avatar

Pedro Maciel

Advogado, sócio da Maciel Neto Advocacia, autor de “Reflexões sobre o estudo do Direito”, Ed. Komedi, 2007

563 artigos

HOME > blog

Brasil real x Brasil dos bolsonaristas

As leis que instituem as chamadas autoanistias já foram rechaçadas globalmente

Plenário da Câmara dos Deputados (Foto: Adriano Machado / Reuters)

Ontem foi aprovada uma PEC da impunidade ou da blindagem, ela foi aprovada por 344 votos favoráveis a 133 contrários, contudo, não vou escrever sobre esse tema hoje porque ainda não me debrucei sobre o texto e porque muita gente que eu respeito votou favorável ao texto, mas fica o registro.

Hoje quero escrever sobre o projeto da anistia, aliás, a única pauta dos bolsonaristas, além das hipócritas e ficcionais pautas de costumes.

Enquanto o governo federal, governos estaduais e municipais vivem o Brasil real, os bolsonaristas vivem num mundo paralelo.

O Brasil real afirmou sua soberania e, apesar da ilegal tarifa imposta pelo governo Trump, obteve superávit de US$ 6,133 milhões em agosto de 2025, um aumento de 35,8% na balança comercial, face ao mesmo mês do ano anterior. 

O resultado positivo foi impulsionado pelo crescimento nas vendas de petróleo bruto, soja e milho, repita-se, apesar das tarifas impostas pelos EUA, e pela queda nas importações de derivados de petróleo e veículos. 

O Brasil real, que o bolsonarismo não vê e não quer ver, tem o PIB em crescimento, o desemprego em queda e as reservas cambiais enormes; a relação dívida x PIB está ruim para os padrões dos governos Lula (graças aos desastrosos governos de Temer e Bolsonaro), mas quando os juros Selic caírem a relação vai melhorar gradativamente, pois, está mais do que comprovado que a nossa persistente inflação, que varia de 4,5% a.a. a 5,5% a.a., não tem relação com demanda.

Outra realidade que o bolsonarismo não quer ver é a “Nova Indústria Brasil”, coordenada pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços. A NIB está transformando as potencialidades locais em vetores de desenvolvimento, impulsionando o crescimento sustentável e a geração de emprego em todo o país. 

Os investimentos da NIB já somam R$ 472,7 bilhões em mais de 168 mil projetos relacionados às seis missões da política industrial até março deste ano; no total, o “Plano Mais Produção” conta com R$ 611 bilhões de recursos para o desenvolvimento industrial, em linhas de crédito e não reembolsáveis, com foco em inovação, produtividade, sustentabilidade e exportação.

Mas para o bolsonarismo isso não existe e sabem por quê? Porque eles não recebem essas informações nas correntes de WhatsApp que os aprisiona e intoxica sua cognição.

Um grande Viva para Alckmin e Lula!

Mas vamos lá, vamos falar da “pauta dourada” dos bolsonaristas: a anistia. Ao leitor eu pergunto: o Congresso deveria se ocupar de um projeto com baixo apoio popular e, acima de tudo, inconstitucional? Evidentemente que não.

A abrangência da anistia que se busca é algo excepcional e, creiam, inconstitucional.

A anistia pretendida alcançaria apoiadores do bolsonarismo alcança atos e fatos desde antes de 30 de outubro de 2022, os financiadores e organizadores de atos, usuários em redes sociais e aqueles que violaram normas do processo eleitoral; busca alcançar crimes políticos, crimes conexos, infrações eleitorais em sentido amplo, visando inelegibilidades e multas. 

É verdade que anistias com sentido político são comuns em processos de transição de regimes autoritários ou de conflito que buscam se transformar em democracias; o que justifica e fundamenta uma anistia é a o desejo de reconstrução da oposição política minada por regimes de exceção. 

Senhores, a oposição no Brasil é livre, coloca milhares de pessoas em manifestações nas ruas, fala o que quer, as vezes ofende quem quer e ninguém vai para o pau-de-arara.

Apesar de a “anistia” ser prerrogativa do Congresso, o “indulto” do presidente e o “perdão judicial” do STF, esses institutos não são a “casa da mãe joana”, como tudo numa democracia, tem regras, limites e condições. 

As leis que instituem as chamadas autoanistias, por exemplo, aquelas que visam imunizar agentes de um regime, ou que sejam concedidas “em branco” para alcançar crimes contra a humanidade, já foram rechaçadas globalmente, basta que se consulte a jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos, como bem lançado por Emilio Peluso Neder Meyer, Professor de Direito Constitucional da UFMG e pesquisador do CNPQ, no artigo “Anistia inconstitucional”.

Se não pode “autoanistia” também não podem ser anistiados os crimes que visam à extinção da democracia. Anistiá-los é uma contradição em seus próprios termos que apenas estimula mais golpes de Estado. Crimes contra o Estado Democrático de Direito não podem ser anistiados uma vez que isso equivaleria à desnecessidade de criminalizar tais condutas, algo irresponsável ante o risco que democracias correm hoje. 

A Constituição de 1988 se refere ao instituto da anistia no sentido de que ele alcança opositores da ditadura de 1964-1985. O art. 8º do ADCT, ao regular a anistia, trata dos atingidos por atos institucionais e complementares da ditadura. Não há indicação de que a anistia cobriria torturadores e agentes do regime, nesse sentido, anistias no Brasil não podem nem alcançar crimes contra a humanidade, nem crimes contra o Estado Democrático de Direito. 

Esse é o ponto. 

Que me perdoem os que divergem da minha opinião, mas de 2019 a 2022, o Brasil viveu sob um governo que desprezava democracias e constituições, o governo Bolsonaro tentou descredibilizar o STF, o congresso de diversas instituições de Estado. 

Bolsonaro e sua horda perderam a eleição e tentaram um golpe de Estado, não conseguiram, mas tentaram, a lei é dura mas é a lei.

Se aprovada tal anistia, claramente inconstitucional, o Congresso estará a criar, como escreveu Lênio Streck, uma crise institucional, com objetivo “proporcionar um desgaste ao Supremo Tribunal encarregado da fiscalização da constitucionalidade das leis”. 

Eu pergunto: quem ganha com a manutenção desse estado de tensão? Eu mesmo respondo: apenas aqueles que não tem apreço pela democracia.

Essas são as reflexões.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.