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Paulo Henrique Arantes

Jornalista há quase quatro décadas, é autor do livro "Retratos da Destruição: Flashes dos Anos em que Jair Bolsonaro Tentou Acabar com o Brasil". Editor da newsletter "Noticiário Comentado" (paulohenriquearantes.substack.com)

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Brics incomoda Trump e o Estadão

O editorial do Estadão de 21 de julho é sintomático

Brics incomoda Trump e o Estadão (Foto: Ricardo Stuckert/PR)

Jornalões e TVs posicionaram-se de pronto ao lado de Lula e do Brasil contra o teratológico ato sancionatório de Donald Trump, modo de pressão solidário ao seu capacho Jair Bolsonaro, prestes a ser condenado à prisão por crimes contra o Estado Democrático de Direito. Não durou muito. A velha mídia neoliberal retoma em parte seu rumo natural: contorciona-se para encontrar meios de responsabilizar o presidente brasileiro pela medida insana do mandatário americano.

O editorial do Estadão de 21 de julho é sintomático.  “Está ficando cada vez mais evidente que o crescente ataque de Trump ao Brasil é, na verdade, parte de uma ofensiva contra o Brics – bloco que, a despeito das fantasias lulopetistas sobre alternativas de desenvolvimento, se presta exclusivamente a projetar o poder da China em contraste com os EUA e o Ocidente, tendo como subproduto o respaldo ao imperialismo da Rússia de Vladimir Putin”, escreveram os reacionários do bairro do Limão. 

Claro está que o Brics incomoda Trump e soma-se ao fator Bolsonaro para fomentar as loucuras do presidente americano. O detalhe é que as razões econômicas e geopolíticas para o Brasil buscar o fortalecimento do grupo-síntese do Sul Global são inatacáveis sob quaisquer pontos de vista, excetos os do Estadão e dos vassalos dos Estados Unidos.

O que jornal do Limão chama de “fantasias lulopetistas sobre alternativas de desenvolvimento” pode ser analisado de várias formas, uma das quais é lembrando que o PIB agregado dos países do Brics, incluídos os novos membros, alcança cerca de 30% do PIB global. E que mais de 50% da população mundial vive nos Brics.

A despeito de alguns dos países-membros não serem exatamente democracias, nenhum deles é governado por um político tão autoritário e tirânico quanto o americano Donald Trump, e nem de longe representam riscos de surpresas comerciais nas relações com o Brasil – ao contrário.

Junto com o Brasil no Brics, livre de maluquices, encontra-se a China, segunda maior economia ao planeta, com seu ritmo de crescimento impressionante, potência rival dos Estados Unidos e nossa maior parceira comercial. Conosco está também a Índia, com uma economia em vertiginoso crescimento e papel fundamental no setor de serviços, especialmente em tecnologia da informação.

Ao lado do Brasil de Lula vem ainda a Rússia (imperialista para o Estadão, mas, no mundo real, muito menos que os Estados Unidos de Trump), que, embora com um PIB menor que os de China e Índia, tem influência significativa devido às suas vastas reservas de recursos naturais, especialmente petróleo e gás, além de ser uma das maiores exportadoras de energia do mundo. 

Ja África do Sul tem posição estratégica no continente africano. Trata-se da maior economia da África e um centro importante para a mineração de metais preciosos, como ouro e platina. Além disso, é um hub financeiro no continente.

Quanto aos novos entrantes, a Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos são grandes exportadores de petróleo e gás natural, o que fortalece o Brics no setor energético global. A Argélia, de sua parte, é um dos maiores produtores de gás natural e petróleo da África, portanto também adiciona valor ao bloco em termos de recursos energéticos.

É esse composto de países e realidades econômicas, em rápida síntese, que o Estadão considera “fantasia lulopetista sobre alternativas de desenvolvimento”. Torta visão. Na verdade, quem tem o Brics não precisa dar muita bola para a autocracia trumpista. As vias para um comércio alternativo no âmbito do Sul Global estão se desenhando rapidamente.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.