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Carlos Castelo

Jornalista, sócio-fundador do grupo Língua de Trapo, um estilo sem escritor

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Caça ao tatu

(Foto: Samuel Portela/Associação Caatinga)
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No sítio da minha adolescência realizei sonhos que nem sabia que tinha. Cavalgadas, banhos de cachoeira, pesca de traíra, peras no pé, futebol de campinho, amassar uva em tonel. 

Certo dia, sentado na varanda, ouvi o caseiro atestar a seu assistente:

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- A lua tá boa pra caçá tatu.

Era o que faltava para completar minha agenda juvenil. 

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Na noite seguinte embarcamos numa charrete puxada pela mula Juana. Após um trecho de poucos quilômetros surgiu a porção de brenha onde, segundo os caçadores, estariam os tatus. Fui logo recebendo o briefing:
- O patrãozinho fica esperano na charreta, nós vai c’os cachorrinho cevá os bicho e adespois vórta aqui.

Passava da meia-noite, fazia frio e garoava. Fechei até em cima o zíper da japona, coloquei o chapelão nos olhos e me espraiei no banco da carruagem. 

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Não me recordo quanto tempo se passou. Contudo, quando despertei, me vi estatelado no meio da floresta. A charrete despencara num barranco e a mula, lá adiante, mastigava capim-gordura. Sons guturais de pássaros faziam a cama musical.

É o que dava deixar a Juana perto da sua refeição. A burra da mula, seguindo seus instintos primários (se é que tinha secundários), foi entrando mata adentro até tombarmos os dois no grotão.

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Ergui-me ajeitando o pescoço, as costas estalaram. Lá de cima veio o bramido:

- Patrãozinho, cadê ocêêê?

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Fui alçado de volta à estradinha de terra por uma corda. A mula seria resgatada apenas ao raiar do dia.  

A caçada foi extensa. O auxiliar do caseiro, nos momentos em que aguardávamos as presas, deu para manguaçar industrialmente. Não sei se o fato colaborou para os pobres resultados de nossa empreitada. Voltamos à chacrinha, nos primeiros sinais da alvorada, com apenas um tatu na gaiola. 

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O animal ficou aos meus cuidados. Antes de me entregar a um merecido cochilo, o coloquei isolado no chiqueiro. Horas mais tarde, a pedido de minha avó, fui buscá-lo para que virasse o almoço. Só havia um buraco no chão da pocilga...

Na outra lua boa de caçar tatu, o caseiro me chamou em particular. Dessa vez era para mostrar a moda de viola que criara sobre o acontecido. É como diz o outro: vão-se os tatus, ficam os lundus.

Fumo pra Aquidauana

Armá as nossas gaiola

Montado na mula Juana

Por ceva pruns tatu-bola

Fui eu e o Zé Bastiana

O Gargalo e o Ditão

Adentremo numa choupana

Nas bimboca do matão

Levemo dois cachorrinho

Dasquele que são mateiro

O Teimoso e o Cuitelinho

Farejador de gaieiro

Tomemo uma água de pinho

Pra fazê o sono passá

Expriquei pros três vizinho

Como nóis ia caçá

O Dito vai pras direita

Leva os cachorro consigo

O Zé fica nas espreita

E o Gargalo vem comigo

Cacemo mais de dez hora

Já tava desacorçoado

Teimoso latiu lá fora

Tinha tatu acuado!

Era um tatu dos crescido

Eu disse: Gargalo acuda!

Gargalo tinha bebido

Tava inté c’a fala muda

Gritei com a voz de brabo

Gargalo não tenha medo

Eu pego o tatu no rabo

E ocê enfia o dedo!

Corcoviei pra apanhá

O bitelo c’as m’ ias mão

Gargalo veio por trás….

…é no do tatu, ô, meu irmão!

Tenha santa paciência 

E um pingo de inducação!

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