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Leonardo Boff

Ecoteólogo, filósofo e escritor. Escreveu Ecologia: grito da Terra, grito dos pobres, Vozes 1995/2015; em espanhol por Trotta, Madrid 1996, Dabar, México 1996

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Carl Gustav Jung e o novo paradigma

Jung foi um antecipador de tudo aquilo que nos últimos anos buscávamos: uma visão integral, complexa e holística da realidade

Carl Gustav Jung (Foto: Reprodução)
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(Publicado no site A Terra é Redonda)

Sigmund Freud e Carl Gustav Jung são os geniais criadores do discurso psicanalítico. Não tiveram mestres. Eles mesmos observando-se a si mesmos e a seus pacientes foram criando os instrumentos teóricos para decifrar os enigmas da alma humana.

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Freud e Jung possuíam sensibilidades diferentes. Enquanto Freud enfatizava o fato sexualidade, desde a mais tenra infância, Jung discordava, pois achava que esta dimensão era importante mas não podia ser o eixo articulador da compreensão da vida psíquica humana. Para ele a libido constituía a energia fundamental que perpassava todo o ser humano para além de sua expressão sexual. Mas não quero entrar nesta discussão que foi, em seu tempo, acalorada entre Freud e Jung a ponto de romperem uma significativa atividade comum e uma longa amizade.

Quero me concentrar em Carl Gustav Jung porque vejo nela um antecipador de tudo aquilo que nos últimos anos buscávamos: uma visão integral, complexa e holística da realidade.

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Para ele a psicologia não possuía fronteiras, entre cosmos e vida, entre biologia e espírito, entre corpo e mente, entre consciente e inconsciente, entre individual e coletivo. A psicologia tinha que ver com a vida em sua totalidade. Por isso tudo lhe interessava, os fenômenos exotéricos, a alquimia, a parapsicologia, o espiritismo, a filosofia, a teologia, a mística, ocidental e oriental, os povos originários e as teorias científicas mais avançadas. Sabia articular estes saberes descobrindo conexões ocultas que revelavam dimensões surpreendentes da alma humana.

Esta visão holística e sistêmica precisamos hoje tornar hegemônica na nossa leitura da realidade. Caso contrário ficamos reféns de visões fragmentadas que perdem do horizonte o todo. Nesta diligência Jung é um interlocutor privilegiado.

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A nova cosmologia, fruto da mecânica quântica, da astrofísica, da astronomia, da nova biologia, da neurociência, da teoria do caos e da complexidade, nos entregou uma nova imagem do universo. Somos filhos e filhas de poeira estelar e cósmica. Formamos um incomensurável sistema uno e diverso, complexo e contraditório.

A psicologia de Jung é uma espécie de cosmologia, pois para ele o ser humano não pode ser entendido fora da evolução total. A psique é tão ancestral quanto o universo, é parte objetiva da natureza. A autorrealização como processo de individuação possui um sentido cósmico. Como dizia ele, “na visão que faço do mundo existe um vasto reino exterior e um outro reino interior, igualmente vasto; entre esses dois mundos, situa-se o homem, ora frente a um, ora frente a outro (Obras 4,777).

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Os numerosos estudos de Jung sobre a alquimia demonstram que estes mundos ultrapassam o humano e alcançam o cósmico. A equação macrocosmos-microcosmos, a coincidência entre a totalidade do humano com a totalidade do extra-humano, conduzem a uma nova consciência capaz de fundar uma nova relação entre homem e universo.

Os astronautas lá de suas naves espaciais nos testemunharam que Terra e humanidade se pertencem. Formam uma única realidade. Ao abordar o inconsciente coletivo e cósmico Jung se confronta com os grandes mitos da totalidade como o do urobos, da mândala, do animus/anima e da Sofia. Há um spiritus mundi e um spiritus terrae. Existe um estrato mais radical e profundo da psique onde já não tem valência as distinções entre psique e mundo, céu e terra. Aí emerge a realidade originaria e total do mundo, antes de qualquer separação e divisão, o arquétipo-raiz o Self. Aí todos nos sentimos um, como bem o expressou a tradição do Tao e filosofia da Índia e que Jung tanto apreciava. É o unus mundus ou a lápis philosophorum.

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Coube a Jung o mérito de valorizar e decifrar a mensagem escondida nos mitos. Eles constituem a linguagem do inconsciente coletivo. Este possui sua relativa autonomia. Ele nos possui mais a nós do que nós a ele. Cada um é mais pensado do que propriamente pensa. O órgão que capta o significado dos mitos, dos símbolos e dos grandes sonhos é a razão sensível ou da razão cordial. Esta foi na modernidade colocada sob suspeita pois poderia obscurecer a objetividade do pensamento. Jung sempre foi crítico do uso exacerbado da razão ocidental pois fechava muitas janelas da alma.

Conhecido foi o diálogo em 1924-1925 de Jung manteve com um indígena da tribo Pueblo no Novo México nos USA. Este indígena achava que os brancos eram loucos. Jung lhe pergunta por que os brancos seriam loucos? Ao que o indígena responde:  “Eles dizem que pensam com a cabeça”. “Mas é claro que pensam com a cabeça”, contestou Jung. “Como vocês pensam”, continuou? E o indígena, surpreso, respondeu: “Nós pensamos aqui” e apontou para o coração (Memórias, sonhos, reflexões, p. 233).

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Esse fato transformou o pensamento de Jung. Entendeu que os europeus havia conquistado o mundo com a cabeça mas haviam perdido a capacidade de pensar com o coração e de viver através da alma (cf. Anthony Stevens, Jung, vida pensamento, Vozes, p. 269). Por isso dominaram o mundo e fizeram tantas guerras.

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