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Ricardo Bruno

Jornalista político, apresentador do programa Jogo do Poder (Rio) e ex-secretário de comunicação do Estado do Rio

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Caso Marielle: Uma delação, alguns indícios e nenhuma prova

É possível que os Brazão sejam de fato os mandantes. O que não é crível é a incapacidade de a Polícia Federal provar a acusação, escreve Ricardo Bruno

Caso Marielle: PF faz operação para cumprir mandados de busca e apreensão (Foto: Mídia NINJA)
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A elucidação da morte de Marielle Franco é um alento para os cidadãos que acreditam na democracia e depositam fé na capacidade do estado brasileiro de se sobrepor às falanges do crime organizado. Durantes os seis anos de investigações inconclusas, declarações enviesadas, pistas fraudulentas e obstruções criminosas perdurou mais do que o sentimento de impunidade. A sensação dominante era de impotência, diante da perspectiva cada vez mais concreta do mal superar o bem. O crime parecia estar vencendo as forças do aparato oficial de segurança. Incrédula, a sociedade assistia a um espetáculo dantesco sem ter a quem mais recorrer.

A frase grandiloquente do ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski , “caso encerrado !” nos deu um alivio profundo, imediato. Era o ponto final de uma história tenebrosa, descrita em 479 páginas de um minucioso relatório da Polícia Federal. A narrativa construída a partir da delação de Ronnie Lessa – sicário confesso – apresenta nexo. As peças processuais se conectam; há verossimilhança nos fatos narrados. Os Brazão, de fato, têm negócios imobiliários em regiões dominadas por milícias. Chiquinho e Marielle estiveram sempre em campos opostos; eram adversários políticos permanentemente; antípodas ideológicos, por excelência.

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No supostamente fatídico projeto de lei de regularização fundiária de glebas na região da Jacarepaguá, mais uma vez, se enfrentaram. E a posição de Chiquinho foi vitoriosa. Venceu no voto pela força política da família na Casa. Dificilmente, um projeto defendido pelos Brazão tinha chances de ser derrotado na Câmara do Rio. O domínio da família era acachapante.

Além da delação de Ronnie Lessa, há no relatório da PF uma considerável coletânea de indícios, um farto material acessório que ajuda a emoldurar cenário do fato criminoso. Mas apenas isso: uma delação e alguns indícios. Faltam provas. Não há interceptação telefônica; troca de mensagens, depósito bancário, recuperação do trajeto dos acusados através das antenas das empresas de telefonia celular; imagens de câmeras das reuniões entre mandantes e sicários. Nada, nada.

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É possível que os Brazão sejam de fato os mandantes. O que não é crível é a incapacidade de a Polícia Federal provar a acusação. Há suspeição de que a investigação não havia sido concluída e, portanto, teria havido precipitação com fins políticos para o anúncio imediato da solução do caso. A fuga em Mossoró teria colocado em xeque a capacidade de ação do governo federal no enfrentamento das facções criminosas. Uma reação no caso Marielle poderia reverter o desgaste.

No Ministério Público do Rio, há o entendimento de que houve sim açodamento na decisão de encerrar o caso mesmo sem a obtenção de provas materiais. Era necessário mais cautela a fim de que o material de corroboração apresentado fosse incontestável. O aparato tecnológico à disposição da PF certamente permite a obtenção de provas de corroboração mais robustas; cabais. Elas não vieram.

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O ministro Alexandre de Moraes concedeu mais 60 dias para a PF avançar nas investigações a partir do conteúdo apreendido na última operação. Esta etapa será essencial para o convencimento de todos os que se ativeram a analisar o caso em minúcias.

Há ainda a hipótese pouco plausível de que os mandantes queriam assustar o então deputado Marcelo Freixo, autor da CPI das milícias na Assembleia do Rio. Se esse fosse o objetivo, o alvo não seria o próprio Freixo ou alguém que ainda estivesse no círculo de colaboradores mais próximos do então parlamentar? A vereadora já tinha vida pública independente embora, obviamente, continuasse amiga do deputado. A versão é pouco convincente.

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Prisões fundamentadas exclusivamente na delação de um criminoso fazem lembrar a finada Lava Jato. Prisões de deputados no exercício do mandato remetem novamente aos métodos de Sérgio Moro. Execração pública de políticos, algemados, e com uniforme de presidiário, era um método recorrente dos magistrados da República de Curitiba.

Diante da fragilidade das provas, a imagem do deputado Chiquinho Brazão, algemado a um cinturão, no momento da transferência para outro presídio federal, lembra o registro do ex-governador Sérgio Cabral andando com dificuldade, acorrentado a grilhões medievais.

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Há nesses fatos desrespeito flagrante à súmula 11 do próprio STF, que proíbe situações humilhantes como essa. “Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado”, diz o documento.

Mesmo sem as provas definitivas, fez-se espetáculo com as prisões – desnecessariamente. O espalhafato em nada ajudou a tornar a solução apresentada mais ou menos convincente.

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Não há aqui, nem de longe, o desejo de inocentar os Brazão. O que se pretende é exigir métodos diferentes daqueles usados pela Lava Jato e a apresentação de provas cabais. A delação é importante. Mas constitui apenas o ponto de partida das investigações. Nunca o ponto final.

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