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Marcelo Zero

É sociólogo, especialista em Relações Internacionais e assessor da liderança do PT no Senado

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Centro do atraso

Colunista Marcelo Zero faz críticas à posição econômica do governo brasileiro que, na contramão do mundo, não prevê mais gastos do Estado para proteger a população. Para ele, a união das oposições no Congresso deveria se sustentar nessa agenda

Rodrigo Maia e Baleia Rossi (Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados)
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A julgar pelas infelizes declarações de Rodrigo Maia, a união do “centro” político no Congresso, com o intuito de se opor a Bolsonaro, ameaça se tornar um Centro do Atraso.

Claro está que a união das oposições contra Bolsonaro é importante e necessário passo para defender o que restou da democracia brasileira e a vida dos nossos cidadãos. 

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Contudo, a simples união contra Bolsonaro não assegura defesa consistente e ampla da democracia. 

A fragilização atual das democracias e dos sistemas de representação política tem forte relação com as consequências socioeconômicas do modelo neoliberal e do capital “financeirizado”. 

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Esse modelo, que começou a ser adotado, nos países desenvolvidos, a partir do final dos 70 e início dos anos 80, produziu, nas últimas décadas, substancial aumento da desigualdade, precarização laboral, fragilização do Estado do Bem-Estar, redução da participação dos salários nas economias, elevado desemprego estrutural  e toda uma série de outras consequências que resultaram numa descrença na capacidade das instituições democráticas de representarem adequadamente os interesses de uma grande massa de deserdados.

Na crise, que se arrasta desde 2009, agora consideravelmente agravada pela pandemia, esse quadro socioeconômico e a pressão que ele acarreta aos sistemas políticos tornaram-se mais agudos. 

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É esse quadro que explica o surgimento do que equivocadamente se denomina “populismo de direita”, forças protofascistas, no sentido lato do termo, como o “trumpismo”, a união pelo Brexit no Reino Unido, a ascensão de partidos de extrema-direita por quase toda a Europa, governos como o de Orbán na Hungria e, não menos importante, o bolsonarismo tupiniquim.

Isso não é novidade histórica. A ascensão do nazismo e do fascismo, na Europa das décadas de 20 e 30 do século passado, também não pode ser entendida sem levar em consideração a profunda crise econômica e social nos países derrotados na Primeira Guerra Mundial, agravada, posteriormente, pelo colapso geral de 1929. 

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Por conseguinte, a adequada e ampla defesa das democracias e de suas instituições implica enfrentamento das causas econômicas e sociais que as fragilizam. 

Claro está que não se pode esperar que a direita tradicional brasileira, eufemisticamente denominada de “centro”, renuncie ao seu obsoleto credo neoliberal. Trata-se, afinal, de forças políticas atrasadas, ainda presas, em geral, a dogmas econômicos e políticos das décadas 80 e 90 do século passado. Vivem num mundo de fantasia, no qual o mercado é uma força divina e infalível e o Estado é o centro de todos os males. Não conseguiram entender o que vem acontecendo no mundo desde 2008. Ou talvez prefiram não entender. 

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Entretanto, no exterior, mesmo aqueles que ainda defendem os princípios do modelo falido, recomendam, na crise atual, a adoção de fortes medidas anticíclicas, destinadas a proteger a população mais vulnerável e a estimular a economia com investimentos estatais.

Nos EUA, terra do liberalismo econômico, a grande discussão atual diz respeito ao aumento do pacote de estímulos, que poderá resultar na distribuição de cheques de US$ 2 mil por pessoa. A política econômica do recém-eleito Joe Biden prevê grandes investimentos estatais em infraestrutura, da ordem de US$ 1,3 trilhão, além dos US 2 trilhões do New Green Deal, para reerguer a economia.

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No continente europeu, a Comissão Europeia acabou de aprovar (dia 10 dezembro) um grande pacote de estímulos de 1,8 trilhão de euros para dinamizar suas economias nos próximos anos. A ideia é aumentar o PIB europeu em 2% e gerar pelo menos 2 milhões de empregos adicionais até 2024.

Nenhum país sério está pensando, no momento, em medidas contracionistas e procíclicas. Todos preveem que será necessário manter ou mesmo ampliar medidas anticíclicas pelos próximos anos.

O próprio FMI, instituição vetusta e conservadora, recomenda essa necessária estratégia. 

Com efeito, em seu mais recente World Economic Outlook, o FMI recomenda que:

Os governos devem fazer tudo o que estiver ao seu alcance para combater a crise de saúde e mitigar a profunda recessão, ao mesmo tempo em que devem se preparar para ajustar sua estratégia política, à medida que a pandemia e seu impacto na atividade evoluam. No caso em que as regras fiscais puderem restringir a ação governamental, sua suspensão temporária deveria ser efetuada.......

Ademais, o FMI também sugere que:

Embora a adoção de novas medidas de incremento de receita durante a crise seja difícil, os governos precisam considerar o aumento de impostos progressivos sobre os indivíduos mais ricos e aqueles relativamente menos afetados pela crise (incluindo o aumento de alíquotas de impostos sobre faixas de renda mais altas, grandes fortunas, ganhos de capital, e patrimônio), bem como mudanças na tributação que garantam que as empresas paguem impostos proporcionais à lucratividade. Os países também devem cooperar na concepção de tributação internacional das empresas para responder aos desafios da economia digital.

Desse modo, essa agenda econômica anticíclica, que põe ênfase em estímulos estatais, na eliminação temporária das restrições fiscais, na proteção da população vulnerável e na redução das desigualdades por meio de reformas fiscais progressivas é, em muitos países, uma agenda defendida por forças conservadoras realistas e pragmáticas, que querem evitar o mal pior do colapso econômico, social, político e sanitário. Agenda essa, diga-se de passagem, que deverá ser mantida pelos próximos anos, pois a crise não será superada da noite para o dia. 

No Brasil, contudo, nossos conservadores parecem estar longe de serem racionais e pragmáticos. Insistem na imposição ideológica e irracional da “Pinguela para o Passado”, a qual representa receita certa para o desastre, principalmente na atual situação do país e do mundo. 

Idealmente, a união das oposições no Congresso deveria se sustentar numa agenda semelhante às que já estão vigor nos EUA e na Europa, sem falar em outras regiões e países. 

Como isso não parece factível, deveria haver, pelo menos, um compromisso mínimo com uma moratória de medidas “liberalizantes”, contracionistas e procíclicas. Com base no princípio da precaução, esse tipo de medida deveria ficar fora da agenda do Congresso até 2022. Afinal, naquele ano teremos eleições, e a população poderá decidir, dessa vez, esperamos, sem discurso de ódio e fake news, se a agenda da Pinguela para o Passado, imposta via golpe, deverá ser mantida ou não.

Os ingleses costumam dizer que senso comum (ou o bom senso), é o menos comum dos sensos. 

No Brasil de Rodrigo Maia e Baleia Rossi, essa parece ser uma triste verdade. E as grandes vítimas são o povo e a democracia. 

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