Cinema: Pirandello à procura de repouso

Em “Leonora, Adeus”, seu primeiro filme sem o irmão Vittorio, Paolo Taviani faz conexões aleatórias e peca no ritmo, mas deixa marcas inconfundíveis.

“Leonora, Adeus”
“Leonora, Adeus” (Foto: Divulgação)


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Talvez a maior emoção desse filme de Paolo Taviani esteja na dedicatória ao irmão Vittorio, falecido em 2018. Pela primeira vez Paolo filma sozinho, mas o faz como uma homenagem a um laço que os uniu: a obra de Luigi Pirandello. Ela foi a base do sublime Kaos e do irregular A Gargalhada (Tu Ridi). Agora Paolo toma Pirandello como personagem, iniciando o filme com o registro histórico de sua consagração com o Prêmio Nobel de Literatura de 1934.

Dois anos depois, Pirandello está morto e o governo fascista se nega a cumprir sua vontade de ter as cinzas levadas para o campo na sua Sicília natal. Enterram-nas em Roma. Passam-se dez anos e a II Guerra para só então a urna funerária ser transportada para a Sicília. Aí começa o périplo bizarro de um funcionário da Prefeitura de Agrigento encarregado de trasladar um engradado com a urna, às voltas com as superstições, as reverências e eventualmente a singeleza das pessoas no caminho.

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Paolo tenta mesclar, sem muito sucesso, um tratamento cômico com a dureza de uma Itália maltratada pela guerra e sob ocupação dos EUA. Vemos mais um documento histórico, o julgamento e fuzilamento do capo fascista Pietro Caruso em 1944. Para o retrato desse período contribui também a inserção de cenas de clássicos italianos, como Paisà de Rossellini, A Aventura de Antonioni, Verão Violento de Valerio Zurlini e o próprio Kaos. A opção por essas vinhetas resulta bastante cifrada, de intenções confusas, quando não aleatórias. O mesmo se pode dizer do título, pertencente a um conto de Pirandello, mas que não deixa qualquer ressonância perceptível em Leonora, Adeus (Leonora Addio).

Depois de um segundo funeral, em Agrigento, passam-se mais 15 anos para que as cinzas de Pirandello finalmente repousem em monumento rústico no meio do campo, como ele queria. Nesse ponto, o filme sofre uma inflexão violenta do preto e branco para as cores fortes e da pseudobiografia para a adaptação livre do último conto de Pirandello, O Prego.

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É a história de um menino de origem siciliana que mata uma menina no Brooklyn de Nova York. Os imigrantes seriam, portanto, uma contraparte da ocupação estadunidense na Itália, sujeitos à pobreza e à desassistência social. O desenrolar dessa história vai retomar o tema das exéquias, mas aqui, uma vez mais, a conexão soa arbitrária e pouco consistente. O ritmo do filme é muitas vezes arrastado, com “barrigas” que prejudicam a fluência da narrativa.

De qualquer maneira, algumas marcas do estilo taviânico estão presentes e recompensam o espectador. O uso icônico dos espaços, por exemplo, seja nos grandes ambientes interiores onde se dão as formalidades, seja na expansão dos exteriores campestres. Ou a escolha de rostos incomuns que plasmam uma paisagem humana profundamente siciliana. Ficamos, ainda, com mais uma belíssima trilha musical de Nicola Piovani (96 anos), parceiro habitual dos irmãos Taviani. Paolo estava então com 91 anos, o que faz de Leonora Addio uma façanha de longevidade.

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>> Leonora, Adeus está nos cinemas.

O trailer:

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