Cobrança seletiva

Tenho lido nos últimos dias um turbilhão de colunistas criticando as viagens da Presidenta Dilma Rousseff e outros vasculhando o histórico de viagens e dias em que a equipe presidencial se instalou em lugares pelo mundo com a justificativa de estarem ali devido às "paradas técnicas". Ouvi também nas rádios alguns especialistas dizendo que o Airbus A319 teria autonomia suficiente para voar de Davos, na Suíça, com destino a Havana, em Cuba. Nada mais justo que cobrar dos nossos políticos o uso correto do nosso dinheiro, afinal os impostos são cada vez mais elevados e temos pouco retorno de tudo isso. Foi por isso que o asfalto ferveu em junho passado e novamente estremece qualquer político quando o assunto vem à tona. Ainda mais políticos governistas, que foram os mais prejudicados com as manifestações.

Mas vamos ao que interessa: eu não assisti a mesma cobrança quando Fernando Henrique Cardoso (PSDB) em 2002, também fez uma "viagem de agenda privada" para a mesma Lisboa com sua esposa, Ruth Cardoso, e estava acompanhado do então governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, de Tassio Gereissaiti, senador pelo Ceará, e do embaixador do Brasil em Portugal, José Gregório.

Também não estou vendo grandes cobranças quando o assunto é o "cartel nos trens de São Paulo" que envolve grandes políticos tucanos e que alguns blogs querem chamar de "Trensalão Tucano". O que vejo é: em se tratando de falcatruas de políticos do PT, a grande mídia denomina de "quadrilha", mas sendo do PSDB denominam de "suposto cartel", dando foco nas empresas corruptas, não nos políticos corruptos.

Quando leio também assustado às cobranças realizadas à Presidenta, me parece que FHC, enquanto Presidente se hospedava em albergues e almoçava em self services para economizar as reservas que o Brasil não tinha e, com isso, não ser necessário pedir mais dinheiro ao FMI. Claro, não era isso que ocorria e à época também não houve cobranças. Outro clássico é o episódio do que disseram ser a "compra de votos para sua reeleição em 1997" e que parece assunto enterrado na grande república.

Essa semana também o filho de um ex-governador de São Paulo infringiu uma lei do Código de Trânsito Brasileiro e matou um policial civil na capital paulista, mas nenhum canal midiático citou que esse ex-governador é do PSDB. Ora, o sujeito infrator é adulto, tem 51 anos, mas já que resolveram dizer que é filho de político, que informasse então que político é esse e a que partido ele pertence. Caso fosse filho de algum político do PT, estaria estampado nas primeiras páginas de todos os jornalões. O caso citado ganhou apenas uma nota nos jornais do eixo Rio - São Paulo.

Infelizmente, o que se vê no Brasil é uma atenção seletiva aos grandes problemas que nos afligem. Se as pessoas, por exemplo, se interessassem e procurassem entender um pouco mais de política, talvez vivêssemos num país melhor. Mas o único discurso que vejo é que o objetivo de 2014 será derrotar o PT, não importa quem vença o pleito de outubro, como declarou o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso numa entrevista recente. O que se vê é uma oposição sem rumo, sem projeto para as mazelas da nossa população. É exatamente por isso que Dilma Rousseff, mesmo tendo construído um governo fraco, é franca favorita a vencer as eleições no 1º turno.