Congresso deu punhalada fatal na legislação ambiental brasileira
Em meio ao “pacto pela vida” assinado na COP-30, o Congresso derruba vetos e abre espaço para devastação ambiental no Brasil
O contraste é brutal — e revela a verdadeira prioridade do Congresso Nacional nestes dias de debate climático global. Enquanto o país sediava a COP30 em Belém, prometendo um “pacto pela vida das florestas, oceanos e da humanidade” sob a liderança do governo federal. Ao mesmo tempo, nesta quinta-feira (27), os parlamentares votaram para derrubar — em ampla maioria — 52 vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a um projeto de lei que flexibiliza drasticamente a legislação de licenciamento ambiental.
O resultado dessa contradição é quase surreal: um país que na terça-feira parecia determinado a mostrar ao mundo que leva a sério a crise climática — e as promessas de redução de emissões e proteção de biomas —, acorda agora com um Congresso que entrega o passaporte para a devastação.
Na abertura da COP30, o presidente reafirmou que o evento deveria servir como “a COP da verdade”, um momento de compromisso real com metas climáticas — incluindo redução significativa de gases de efeito estufa, preservação de florestas, oceanos e biodiversidade. Entre os compromissos do país estavam: a promoção de energia renovável, o fortalecimento da agroecologia e da agricultura familiar, a garantia de segurança hídrica e a preservação da biodiversidade — com atenção aos biomas além da Amazônia, como as regiões do Nordeste. Sob a presidência brasileira, a COP30 buscou ligar “a agenda climática global” com “a vida cotidiana das pessoas”, enfatizando a urgência de proteger florestas nativas, oceanos, garantir justiça climática e assegurar participação de povos indígenas e comunidades tradicionais — pilares defendidos como caminho para um desenvolvimento sustentável.
Mas logo após o fim da convenção da ONU, o próprio Congresso Nacional virou as costas para os compromissos climáticos e ambientais: ao rejeitar 52 vetos presidenciais, devolveu ao Brasil a versão mais agressiva — e destrutiva — de um projeto apelidado como PL da Devastação.
Com a derrubada dos vetos:
- Retorna a modalidade de autolicenciamento para obras de porte médio — sem necessidade de estudos ambientais prévios (Licença por Adesão e Compromisso, LAC).
- Volta a ser permitida a supressão simplificada de vegetação na Mata Atlântica, removendo o bioma da regime especial de proteção.
- Passa-se ao Legislativo e aos estados a definição de parâmetros ambientais — inclusive o que é porte médio/pequeno, o que é “baixo ou médio potencial poluidor”, e que tipologias precisam de licenciamento.
- Retira-se obrigações de consulta prévia a povos indígenas e comunidades quilombolas, além de enfraquecer o papel de órgãos como ICMBio, Funai e Fundação Palmares no licenciamento.
- E ainda libera diversas atividades da exigência de licenciamento — inclusive manutenção de infraestrutura, obras rurais com registro pendente no CAR, obras de saneamento, entre outras.
Em resumo: estrutura jurídica do licenciamento ambiental desmontada, agora com dependência de autorregulação, definição difusa de critérios e ampla abertura para empreendimentos sem controle ambiental consistente.
O que está em jogo é a própria viabilidade do equilíbrio ambiental no Brasil. A flexibilização imposta por essa lei favorece o lucro imediato e especulação sobre terras, mas condena o bioma, a biodiversidade, o clima e as gerações futuras.
Além disso, as populações indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais — justamente aquelas frequentadoras dos debates da COP30 — ficam ainda mais vulneráveis. Sem consulta adequada, com remoção de salvaguardas legais e com fragilidade dos órgãos de fiscalização, seus territórios e modos de vida correm risco real.
Esse passo atrás da lei ambiental também representa um desinvestimento estrutural na governança ambiental — em fiscalização, prevenção e transparência. Um desmonte que dificilmente será revertido a curto prazo.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

