CONTINUA APÓS O ANÚNCIO
Pedro Simonard avatar

Pedro Simonard

Antropólogo, documentarista, professor universitário e pesquisador

92 artigos

blog

Covid-19: crônica de um contágio?

"O moradores da periferia já perceberam que serão as maiores vítimas do Covid-19 porque vivem em moradias apertadas, pouco arejadas, que dividem com muitos outros moradores, o que os impede de isolar seus doentes em cômodos separados e arejados; não raro suas casas não são servidas por água potável e quando o são é muito comum que o fornecimento d’água seja irregular, o que os impede de lavar as mãos e as roupas com frequência, bem como de beber água potável várias vezes ao dia, medidas recomendadas pela OMS", diz o antropólogo Pedro Simonard

(Foto: Reprodução | ABr)
CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

✅ Receba as notícias do Brasil 247 e da TV 247 no canal do Brasil 247 e na comunidade 247 no WhatsApp.

O título desta coluna contém uma interrogação que espelha bem o momento pelo qual passamos. A epidemia alcançou o Brasil e o mundo em um péssimo momento em que boa parte daqueles que detém o poder não passam de indigentes cognitivos. Donald Trump, Boris Johnson, Viktor Orban são exemplos de incapazes intelectuais que dirigem nações importantes. A Itália – “uma cidade” cheia de “velhinhos”, segundo o nosso indigente cognitivo presidente – se livrou de Matteo Salvini. Imaginem se a crise do Covid-19 tivesse atingido o país com ele ainda no governo. No caso brasileiro, nós temos idiotas em excesso: Jair Bolsonaro, Damares Alves, Abraham Weintraub, Edir Macedo, Silas Malafaya, um verdadeiro circo de horrores. 

Na segunda-feira, dia 16 de março, minha companheira acordou se sentindo mal. Febre, dores pelo corpo, dor de garganta e dor de cabeça. Pesquisamos na internet os sintomas do Covid-19 e vimos que ela apresentava alguns deles. Fui à farmácia comprar paracetamol para a febre e alguns outros itens que não achei, como o álcool em gel. À tarde os sintomas melhoraram, mas não desapareceram. Liguei para o telefone 136 e minha companheira falou com a atendente que lhe respondeu que pelos sintomas descritos havia possibilidade de que ela tivesse contraído o Covid-19. Recomendou que permanecêssemos em casa em quarentena e que só procurássemos um hospital se um quadro de dificuldade respiratória se manifestasse. Os hospitais não têm número suficiente de kits para realizar os testes em todos os cidadãos e estão priorizando realizar os testes nos pacientes que os procuram com fortes sintomas da doença e nos profissionais que estão atendendo os pacientes. Desta maneira, ficamos em casa. 

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

No dia seguinte, ela acordou com uma pequena dificuldade respiratória e tosse seca, sintomas que ainda não haviam se manifestado no dia anterior. À tarde os sintomas melhoraram. Isto está de acordo com uma informação divulgada segundo a qual os sintomas do Covid-19 são mais fortes pela manhã. Assustada com esses novos sintomas minha companheira pesquisou no site Livia.bot (https://livia.bot/) onde há um aplicativo com um assistente virtual com dicas de saúde. Ela respondeu a algumas perguntas e, ao final, o aplicativo lhe informou que, segundo as respostas fornecidas, ela apresentava um quadro suspeito de contaminação pelo Covid-19. Foi a segunda informação pública que confirmou a possibilidade de contágio pelo vírus.

Na quarta-feira ela ligou para um serviço disponibilizado pela secretaria estadual de saúde e conversou com uma enfermeira. Descreveu os sintomas. A enfermeira lhe perguntou se ela havia tido contado com alguém positivado e minha companheira respondeu-lhe que não. A enfermeira respondeu que os sintomas poderiam ser do Covid-19, porém, enquanto não apresentasse quadro de falta de ar, que não saísse de casa. Bom, as informações que nos chegam pela televisão e redes sociais afirmam que o vírus sobrevive algumas horas em corrimões de metal, maçanetas, tecidos, superfícies plásticas etc. Logo, o contato direto com alguém infectado não é necessário para que haja a transmissão.

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Não há um protocolo comum a ser seguido para evitar o contágio e estados, municípios e o Governo Federal recomendam ações diferentes para conter a pandemia do Covid-19. É preciso que o Ministério da Saúde, urgentemente, crie um protocolo único, a ser seguido pelos três níveis de governo, para deter o desenvolvimento deste vírus.

Hoje é quinta-feira, dia 19. Já se passaram três dias em que ocorreram as manifestações mais fortes dos sintomas e, até agora, não sabemos ao certo se estamos ou não infectados. Pelo visto, não iremos saber. Artigos científicos dão conta que 85% dos casos na China não foram notificados. Passaram despercebidos, como se fossem uma simples gripe. No Brasil, pelo visto, como só serão confirmados os casos que passarem pelos hospitais e centros de triagem e que forem testados, este percentual poderá ser muito superior. Isto é assustador! Muitos de nós poderemos ter o vírus, não apresentarmos sintoma nenhum ou sintomas fracos e sairmos por aí disseminando o Covid-19.

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Para aqueles que se encontram na mesma situação em que eu e minha companheira nos encontramos restam angústia e algumas questões. Angústia por não sabermos se estamos ou não contaminados e se os sintomas não podem se agudizar, caso estejamos contaminados. Questões, ao menos duas: 1. Se estivermos contaminados e nos curarmos, ficaremos imunes ao vírus ou poderemos ser contaminados mais uma vez? 2. Se formos informados que os pacientes ficam imunes após a cura da doença, deveremos nos tranquilizar ou permanecer preocupados, já que não sabemos se estamos, realmente, contaminados porque não fomos testados? Em caso de estarmos infectados e nos curarmos e se precisarmos sair às ruas para reabastecer nosso lar, permaneceremos com a possibilidade de sermos vetores do Covid-19, mesmo que fiquemos imunes a ele. A incerteza gera muita angústia e insegurança.

Outro fato importante é chamarmos o vírus pelo seu “nome”: Covid-19. Por quê? Ontem conversando com um rapaz que passeia com nossos cachorros falamos sobre os perigos do Covid-19. Pouco tempo depois ele nos enviou por WhatsApp um vídeo de um irresponsável que havia levado seus cachorros para vacinar. Uma das vacinas dadas aos bichinhos foi a Vanguard HTLP 5/CV-L, utilizada para imunizar os animais contra “Cinomose, Adenovírus Tipo 2, Coronavírus, Parainfluenza, Parvovirose, Leptospira icterohaemorrhagiae e Leptospira canicola”. Isto mesmo que você leu. Entre as doenças está o corona vírus. No vídeo em questão, o autor afirma que “o vírus [corona vírus] não é novo” e que o pânico causado era uma consequência dos “malucos orientais que querem fazer a economia deles crescer”. Tive que explicar para o rapaz que compartilhou o vídeo que corona e o nome de uma família de vírus, que causam síndromes respiratórias graves, algumas em animais também. Para combater a maioria dos tipos de corona vírus, como o H1N1, já existem vacinas, mas que não existe ainda vacina para o Covid-19 e que ele é extremamente perigoso por ser extremamente transmissível. Como se não bastasse a lenta e imprecisa reação do governo, ainda tem aqueles que, devido a algum interesse escuso ou à ignorância, desinformam a população. 

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Creio que esta situação pela qual eu e minha companheira estamos passando deve estar se repetindo ou se repetirá muitas enquanto a pandemia estiver fora de controle no Brasil. Se a informação é o melhor remédio para combater o Covid-19 o teste para sua detecção deveria ser feito em todos que apresentem algum tipo de sintoma que possa ser identificado como uma possibilidade de contágio pelo Covid-19. Aliás, é esta a recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) que toda a população seja testada. Contudo, para que isto seja feito é preciso que haja um governo que se preocupe com a população e este não é o caso do Brasil atual. O cínico e mal-intencionado ministro Paulo Guedes apresentou como solução para superar o problema causado pela paralisação da economia antecipar o dinheiro do próprio trabalhador para superar a crise econômico-sanitária. Enquanto outros países estão injetando dinheiro na economia, Paulo Guedes continua com sua necropolítica neoliberal que coloca em risco a vida de milhões de brasileiros. 

O moradores da periferia já perceberam que serão as maiores vítimas do Covid-19 porque vivem em moradias apertadas, pouco arejadas, que dividem com muitos outros moradores, o que os impede de isolar seus doentes em cômodos separados e arejados; não raro suas casas não são servidas por água potável e quando o são é muito comum que o fornecimento d’água seja irregular, o que os impede de lavar as mãos e  as roupas com frequência, bem como de beber água potável várias vezes ao dia, medidas recomendadas pela OMS. Também não poderão trabalhar em casa nem evitar transportes coletivos superlotados. Como bem lembraram pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz/Fiocruz e a deputada federal Jandira Feghali do PCdoB/RJ, até agora, os governos e as instituições responsáveis pelo controle da epidemia no Brasil “não estão falando para o povo” e é preciso falar para ele e informá-lo. Por falta de comunicação com o povo estourou a Revolta da Vacina, em novembro de 1904. Vídeos já começam a povoar as redes sociais com críticas dos trabalhadores às medidas profiláticas propostas pelo governo. Ontem a classe média urbana já mostrou sua insatisfação contra o governo Bolsonaro em diversos e retumbantes panelaços em bairros onde moram grande parte de seus apoiadores. Os trabalhadores já começaram a perceber que as medidas profiláticas propostas não irão resolver seus problemas práticos. A situação política e social tende a ficar cada vez mais explosiva. 

iBest: 247 é o melhor canal de política do Brasil no voto popular

Assine o 247,apoie por Pix,inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista:

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Cortes 247

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO
CONTINUA APÓS O ANÚNCIO