Cuba trabalha no fortalecimento do sistema elétrico nacional, apesar do bloqueio
Os esforços realizados na ilha para enfrentar esta situação esbarram em um bloqueio recrudescido pelos EUA
Na última quarta-feira, 10 de setembro, ocorreu uma desconexão do sistema elétrico nacional em Cuba, devido a uma saída imprevista da Central Termoelétrica Antonio Guiteras, uma das mais importantes do país. O serviço foi restabelecido às 13h32 do dia seguinte, graças ao esforço e à experiência dos trabalhadores da União Elétrica Nacional.
A referida desconexão, bem como os frequentes apagões, evidenciam os desafios que Cuba enfrenta para garantir o fornecimento de eletricidade à sua população. Em um cenário caracterizado por usinas geradoras com mais de 40 anos de exploração, dependência em mais de 50% da importação de combustível, aumento da demanda nacional de eletricidade e diminuição dos recursos disponíveis para manutenção, compra de combustível e investimentos necessários para resolver o déficit de geração.
Os esforços realizados na ilha para enfrentar esta situação esbarram em um bloqueio recrudescido pelos EUA, que se expressa na intensificação da perseguição ao acesso a fontes de financiamento externo e ameaças aos fornecedores de combustível à ilha.
Apesar disso, Cuba está realizando um importante investimento com a instalação de parques fotovoltaicos em todo o país que, segundo as autoridades do setor, devem garantir 24% da geração nacional até 2030 e, uma vez concluídos, fortalecerão consideravelmente o sistema elétrico nacional.
Como está estruturado o sistema elétrico cubano (SEN) e quais são seus principais desafios.
Em Cuba, o Sistema Elétrico Nacional é constituído pelos seguintes componentes:
1- Sete Centrais Termelétricas (CTE), que agrupam 22 unidades de geração térmica. A maior dessas unidades é a CTE Antonio Guiteras de Matanzas, que possui uma única unidade com capacidade de 300 MW.
As CTE são responsáveis pela maior parte da geração elétrica do país.
O combustível que utilizam, em sua maior parte, é petróleo nacional, considerado pelos especialistas como “petróleo pesado”, devido à sua maior viscosidade e densidade, o que faz com que seja necessário realizar paradas mais frequentes nas unidades para manutenção das caldeiras. O uso do petróleo bruto nacional tem a vantagem de não precisar ser importado e oferece independência energética nesse sentido.
2- Geração distribuída,
Recebe esse nome porque é composta por geradores menores do que as centrais termelétricas (grupo gerador) e estão distribuídos por toda Cuba.
Estes foram instalados entre 2005 e 2010, quando se desenvolveu a chamada Revolução Energética, que consistiu em colocar grupos geradores em diferentes locais do país como apoio em caso de contingências do sistema elétrico e para prestar serviço em caso de fenómenos meteorológicos. Da mesma forma, os grupos geradores garantem a reserva necessária que o SEN deve ter, acima da demanda, para garantir a estabilidade do sistema.
944 grupos geradores, quase 2/3 do total, utilizam diesel como combustível. Estão distribuídos por todo o país e agrupados em 154 centrais. Além disso, existem 507 grupos geradores que utilizam óleo combustível, agrupados em 35 centrais.
O combustível necessário para estas unidades de geração é importado, pelo que está sujeito à flutuação dos preços no mercado internacional e à disponibilidade de recursos no país para a sua aquisição. A falta de dinheiro para importar óleo combustível, inclusive o diesel, é uma das causas fundamentais do déficit na geração de eletricidade. A isso se soma a perseguição do governo dos Estados Unidos contra possíveis fornecedores de petróleo a Cuba, bem como contra as empresas de navegação que realizam o transporte e as seguradoras necessárias para esse tipo de atividade. Tais ações têm um efeito dissuasivo sobre os fornecedores, e encarecem o preço de venda do petróleo por aqueles que decidem comercializar com a ilha.
3- Geração pelo uso de gás associado ao petróleo
Este tipo de geração elétrica é realizado utilizando o gás dos poços de petróleo, cujo uso para gerar eletricidade é muito conveniente. Esta geração concentra-se no oeste do país. Foi desenvolvida com uma empresa mista com a companhia canadense Sherritt, denominada Energás. Constitui o quilowatt mais barato produzido em Cuba.
4- Geração com fontes de energia renováveis.
Aqui estão incluídas as fontes hídricas, energia fotovoltaica, eólica e biomassa.
De acordo com o plano aprovado no país, este tipo de geração deve contribuir com 24% de toda a energia produzida em Cuba em 2030. E a projeção é continuar crescendo neste tipo de geração, para diminuir a obtida por combustíveis fósseis.
Um dado importante é que a geração de eletricidade em Cuba é financiada pelo orçamento estatal, pois a tarifa elétrica das residências é subsidiada (61% do consumo nacional), apesar do aumento sofrido em 2024, com o objetivo de incentivar a poupança.
O bloqueio e seu impacto no sistema energético cubano
A crise energética que Cuba enfrenta deve-se, em grande parte, ao ataque econômico a que está sujeita pelo governo dos Estados Unidos, o bloqueio econômico, comercial e financeiro em vigor há mais de 60 anos. O relatório apresentado por Cuba ao Secretário-Geral da ONU em 2024, sobre os efeitos dessa política, contém abundantes exemplos.
Entre março de 2023 e fevereiro de 2024, os impactos no setor de energia e mineração foram notórios e ascenderam a nada menos que US$ 388 milhões, 239 mil e 830 dólares. Uma das ações mais repudiáveis, por violar o Direito Internacional e por sua crueldade, foi a proibição do transporte de combustível para Cuba a partir de 2019. Somente nesse ano, 53 embarcações e 27 empresas foram penalizadas pelo governo dos Estados Unidos. Trata-se de uma modalidade diferente do bloqueio, não aplicada anteriormente, mas que responde diretamente aos esforços para ameaçar, exercer coação, infundir medo e sancionar todos os que se envolvem no fornecimento de combustível ao país, desde companhias marítimas até seguradoras, resseguradoras, bancos, pessoas e governos. Os danos decorrentes dessa perseguição são consideráveis.
O cerco econômico também exacerbou as limitações financeiras e de acesso ao crédito para reparar as usinas termelétricas do país, adquirir as tecnologias necessárias e o combustível exigido para garantir um fornecimento estável de eletricidade à população e aos setores estratégicos da economia nacional. Como resultado, foi necessário aplicar interrupções constantes no serviço elétrico, o que gera estresse, esgotamento emocional e angústia na população, compromete o sistema de refrigeração e cozimento nas residências, ao mesmo tempo em que impacta transversalmente a produtividade e impede o funcionamento do país.
Estratégia de Cuba para fortalecer o sistema elétrico nacional
O ministro de Energia e Minas de Cuba, Vicente de la O Levy, em entrevista à mídia cubana no último dia 11 de setembro, explicou que a recuperação da geração de eletricidade depende do avanço da estratégia de transição energética que o país está implementando.
Isso implica, destacou o dirigente cubano, a recuperação da produção de hidrocarbonetos, o impulso da geração com fontes renováveis e o aumento do armazenamento de energia para estabilizar o sistema.
Ele acrescentou que este ano há uma ligeira recuperação na produção nacional de combustível em relação ao ano anterior, e que foram inaugurados 30 parques fotovoltaicos até agora, representando quase 60% dos 55 previstos para serem construídos até 2025, que contribuirão com mais de 1000 MW para o sistema. A demanda máxima diária de eletricidade em Cuba é de quase 4.000 MW.
Um ponto enfatizado pelo ministro foi a próxima incorporação de sistemas de acumulação de energia. Ele revelou que a falta desses sistemas foi a causa de mais de 500 interrupções (disparos) no sistema elétrico nacional em 2024 por falta de regulação. Além da instalação dos parques fotovoltaicos, são necessários sistemas de baterias para estabilizá-los. Uma das tecnologias mais eficientes para regular é o armazenamento de energia”, afirmou. Este plano terá duas fases: uma inicial para estabilização e outra posterior para fornecer energia por horas ao sistema.
O ministro concluiu que o maior objetivo é a transição energética que está sendo implementada no país, que inclui também a intervenção de cinco usinas termelétricas este ano para melhorar sua eficiência e confiabilidade. A estratégia integral aposta na redução da dependência das importações de combustíveis e na geração com recursos próprios, consolidando a soberania energética nacional.
Cuba sairá da crise energética graças à capacidade e ao trabalho árduo de seu povo, e com o apoio de países irmãos e amigos solidários, que não são poucos. Na década de 90 do século passado, a ilha enfrentou dificuldades semelhantes e saiu vitoriosa, o que demonstra que é possível. O bloqueio, tudo parece indicar que será mantido, mas só fará com que a proeza do povo cubano seja ainda maior.
- https://www.ecured.cu/Sistema_El%C3%A9ctrico_Nacional
- https://cubaminrex.cu/sites/default/files/2024-09/InformeB2024.pdf
- http://www.cubadebate.cu/noticias/2025/09/11/la-recuperacion-del-sistema-electrico-nacional-video/
- http://www.cubadebate.cu/noticias/2025/08/20/union-electrica-pronostica-afectacion-de-1790-mw-en-la-maxima-demanda-de-hoy/
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.




