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Vladimir Falcón Lamar

Engenheiro em Automática formado pela Universidad Tecnológica de La Habana "José Antonio Echeverria" em 2001. Mestre em Relações Internacionais no Instituto Superior de Relações Internacionais "Raúl Roa García" de Havana em 2004

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Cuba trabalha no fortalecimento do sistema elétrico nacional, apesar do bloqueio

Os esforços realizados na ilha para enfrentar esta situação esbarram em um bloqueio recrudescido pelos EUA

Instalação do sistema elétrico cubano na província de Cienfuegos (Foto: Rey López/Granma)

Na última quarta-feira, 10 de setembro, ocorreu uma desconexão do sistema elétrico nacional em Cuba, devido a uma saída imprevista da Central Termoelétrica Antonio Guiteras, uma das mais importantes do país. O serviço foi restabelecido às 13h32 do dia seguinte, graças ao esforço e à experiência dos trabalhadores da União Elétrica Nacional.

A referida desconexão, bem como os frequentes apagões, evidenciam os desafios que Cuba enfrenta para garantir o fornecimento de eletricidade à sua população. Em um cenário caracterizado por usinas geradoras com mais de 40 anos de exploração, dependência em mais de 50% da importação de combustível, aumento da demanda nacional de eletricidade e diminuição dos recursos disponíveis para manutenção, compra de combustível e investimentos necessários para resolver o déficit de geração.

Os esforços realizados na ilha para enfrentar esta situação esbarram em um bloqueio recrudescido pelos EUA, que se expressa na intensificação da perseguição ao acesso a fontes de financiamento externo e ameaças aos fornecedores de combustível à ilha.

Apesar disso, Cuba está realizando um importante investimento com a instalação de parques fotovoltaicos em todo o país que, segundo as autoridades do setor, devem garantir 24% da geração nacional até 2030 e, uma vez concluídos, fortalecerão consideravelmente o sistema elétrico nacional.

Como está estruturado o sistema elétrico cubano (SEN) e quais são seus principais desafios.

Em Cuba, o Sistema Elétrico Nacional é constituído pelos seguintes componentes:

1- Sete Centrais Termelétricas (CTE), que agrupam 22 unidades de geração térmica. A maior dessas unidades é a CTE Antonio Guiteras de Matanzas, que possui uma única unidade com capacidade de 300 MW.

As CTE são responsáveis pela maior parte da geração elétrica do país.

O combustível que utilizam, em sua maior parte, é petróleo nacional, considerado pelos especialistas como “petróleo pesado”, devido à sua maior viscosidade e densidade, o que faz com que seja necessário realizar paradas mais frequentes nas unidades para manutenção das caldeiras. O uso do petróleo bruto nacional tem a vantagem de não precisar ser importado e oferece independência energética nesse sentido.

2- Geração distribuída,

Recebe esse nome porque é composta por geradores menores do que as centrais termelétricas (grupo gerador) e estão distribuídos por toda Cuba.

Estes foram instalados entre 2005 e 2010, quando se desenvolveu a chamada Revolução Energética, que consistiu em colocar grupos geradores em diferentes locais do país como apoio em caso de contingências do sistema elétrico e para prestar serviço em caso de fenómenos meteorológicos. Da mesma forma, os grupos geradores garantem a reserva necessária que o SEN deve ter, acima da demanda, para garantir a estabilidade do sistema.

944 grupos geradores, quase 2/3 do total, utilizam diesel como combustível. Estão distribuídos por todo o país e agrupados em 154 centrais. Além disso, existem 507 grupos geradores que utilizam óleo combustível, agrupados em 35 centrais.

O combustível necessário para estas unidades de geração é importado, pelo que está sujeito à flutuação dos preços no mercado internacional e à disponibilidade de recursos no país para a sua aquisição. A falta de dinheiro para importar óleo combustível, inclusive o diesel, é uma das causas fundamentais do déficit na geração de eletricidade. A isso se soma a perseguição do governo dos Estados Unidos contra possíveis fornecedores de petróleo a Cuba, bem como contra as empresas de navegação que realizam o transporte e as seguradoras necessárias para esse tipo de atividade. Tais ações têm um efeito dissuasivo sobre os fornecedores, e encarecem o preço de venda do petróleo por aqueles que decidem comercializar com a ilha.

3- Geração pelo uso de gás associado ao petróleo

Este tipo de geração elétrica é realizado utilizando o gás dos poços de petróleo, cujo uso para gerar eletricidade é muito conveniente. Esta geração concentra-se no oeste do país. Foi desenvolvida com uma empresa mista com a companhia canadense Sherritt, denominada Energás. Constitui o quilowatt mais barato produzido em Cuba.

4- Geração com fontes de energia renováveis.

Aqui estão incluídas as fontes hídricas, energia fotovoltaica, eólica e biomassa.

De acordo com o plano aprovado no país, este tipo de geração deve contribuir com 24% de toda a energia produzida em Cuba em 2030. E a projeção é continuar crescendo neste tipo de geração, para diminuir a obtida por combustíveis fósseis.

Um dado importante é que a geração de eletricidade em Cuba é financiada pelo orçamento estatal, pois a tarifa elétrica das residências é subsidiada (61% do consumo nacional), apesar do aumento sofrido em 2024, com o objetivo de incentivar a poupança.

O bloqueio e seu impacto no sistema energético cubano

A crise energética que Cuba enfrenta deve-se, em grande parte, ao ataque econômico a que está sujeita pelo governo dos Estados Unidos, o bloqueio econômico, comercial e financeiro em vigor há mais de 60 anos. O relatório apresentado por Cuba ao Secretário-Geral da ONU em 2024, sobre os efeitos dessa política, contém abundantes exemplos.

Entre março de 2023 e fevereiro de 2024, os impactos no setor de energia e mineração foram notórios e ascenderam a nada menos que US$ 388 milhões, 239 mil e 830 dólares. Uma das ações mais repudiáveis, por violar o Direito Internacional e por sua crueldade, foi a proibição do transporte de combustível para Cuba a partir de 2019. Somente nesse ano, 53 embarcações e 27 empresas foram penalizadas pelo governo dos Estados Unidos. Trata-se de uma modalidade diferente do bloqueio, não aplicada anteriormente, mas que responde diretamente aos esforços para ameaçar, exercer coação, infundir medo e sancionar todos os que se envolvem no fornecimento de combustível ao país, desde companhias marítimas até seguradoras, resseguradoras, bancos, pessoas e governos. Os danos decorrentes dessa perseguição são consideráveis.

O cerco econômico também exacerbou as limitações financeiras e de acesso ao crédito para reparar as usinas termelétricas do país, adquirir as tecnologias necessárias e o combustível exigido para garantir um fornecimento estável de eletricidade à população e aos setores estratégicos da economia nacional. Como resultado, foi necessário aplicar interrupções constantes no serviço elétrico, o que gera estresse, esgotamento emocional e angústia na população, compromete o sistema de refrigeração e cozimento nas residências, ao mesmo tempo em que impacta transversalmente a produtividade e impede o funcionamento do país.

Estratégia de Cuba para fortalecer o sistema elétrico nacional

O ministro de Energia e Minas de Cuba, Vicente de la O Levy, em entrevista à mídia cubana no último dia 11 de setembro, explicou que a recuperação da geração de eletricidade depende do avanço da estratégia de transição energética que o país está implementando.

Isso implica, destacou o dirigente cubano, a recuperação da produção de hidrocarbonetos, o impulso da geração com fontes renováveis e o aumento do armazenamento de energia para estabilizar o sistema.

Ele acrescentou que este ano há uma ligeira recuperação na produção nacional de combustível em relação ao ano anterior, e que foram inaugurados 30 parques fotovoltaicos até agora, representando quase 60% dos 55 previstos para serem construídos até 2025, que contribuirão com mais de 1000 MW para o sistema. A demanda máxima diária de eletricidade em Cuba é de quase 4.000 MW.

Um ponto enfatizado pelo ministro foi a próxima incorporação de sistemas de acumulação de energia. Ele revelou que a falta desses sistemas foi a causa de mais de 500 interrupções (disparos) no sistema elétrico nacional em 2024 por falta de regulação. Além da instalação dos parques fotovoltaicos, são necessários sistemas de baterias para estabilizá-los. Uma das tecnologias mais eficientes para regular é o armazenamento de energia”, afirmou. Este plano terá duas fases: uma inicial para estabilização e outra posterior para fornecer energia por horas ao sistema.

O ministro concluiu que o maior objetivo é a transição energética que está sendo implementada no país, que inclui também a intervenção de cinco usinas termelétricas este ano para melhorar sua eficiência e confiabilidade. A estratégia integral aposta na redução da dependência das importações de combustíveis e na geração com recursos próprios, consolidando a soberania energética nacional.

Cuba sairá da crise energética graças à capacidade e ao trabalho árduo de seu povo, e com o apoio de países irmãos e amigos solidários, que não são poucos. Na década de 90 do século passado, a ilha enfrentou dificuldades semelhantes e saiu vitoriosa, o que demonstra que é possível. O bloqueio, tudo parece indicar que será mantido, mas só fará com que a proeza do povo cubano seja ainda maior.

  1. https://www.ecured.cu/Sistema_El%C3%A9ctrico_Nacional
  2. https://cubaminrex.cu/sites/default/files/2024-09/InformeB2024.pdf
  3. http://www.cubadebate.cu/noticias/2025/09/11/la-recuperacion-del-sistema-electrico-nacional-video/
  4. http://www.cubadebate.cu/noticias/2025/08/20/union-electrica-pronostica-afectacion-de-1790-mw-en-la-maxima-demanda-de-hoy/

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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