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Paulino Cardoso

Historiador, analista geopolítico e Editor do Mundo Multipolar

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Decapitação: a estratégia estadunidense de mudança de regime na Venezuela

O sonho de enfraquecer os adversários, por meio da eliminação de sua liderança política, ainda está vivo em Washington

Donald Trump e Nicolás Maduro (Foto: Manaure Quintero/Reuters I Piroschka Van De Wouw/Reuters)

A crescente mobilização de forças militares estadunidenses nas costas marítimas da Venezuela tem a intenção de pressionar por uma mudança de regime no país. Muitas notícias indicam a possibilidade de uma invasão terrestre do país caribenho. Entretanto, embora significativa no número de belonaves  e seus milhares de soldados, acompanhados por bombardeiros B 1 e B 52, não são suficientes para uma ocupação terrestre diante da geografia e da mobilização popular na Venezuela.

Ao observarmos os últimos movimentos do Império no seu esforço para impor a paz pela força, há indicações pelo gosto do uso intensivo de bombardeios, que permitem cantar vitória, bem a gosto de Donald Trump, sem ter que enfrentar a impopular recepção de sacos de corpos.

Reparem que recentemente o POTUS 47 não responsabilizou  o Comando Sul, cujo dirigente, almirante Alvin Holsey, está demissionário, mas autorizou a CIA a realizar ações letais encobertas na Venezuela. Não deixa de ser engraçado a revelação, pela primeira vez, de uma decisão, a princípio, secreta, anunciada com toda a fanfarronice pelo governo Donald Trump. Neste jogo, a CIA se tornou o cérebro e o Pentágono o braço da ação dos EUA, no restabelecimento da Doutrina Monroe, versão 2.0.

Se associarmos esta informação ao fato, depois de uma grande pressão do Secretário de Estado dos EUA, Marco Rúbio sob os noruegueses, a indicação e nomeação do Nobel da Paz a líder de extrema direita, Maria Corina Machado, é possível imaginar que veremos na América do Sul, a mesma estratégia utilizada na Ásia Ocidental, em especial, no Líbano, Palestina, Irã e Iêmen. 

O sonho de enfraquecer os adversários, por meio da eliminação de sua liderança política, ainda está vivo em Washington, mesmo acumulando derrotas em série.O Hamas permanece vivo na Palestina, o Hezbollah está se reorganizando e fortalecendo no Líbano, o assassinato do Governo Civil no Iêmen não diminuiu a determinação e prontidão do Movimento Anssarolah de fustigar os interesses econômicos sionistas e do império no Mar Vermelho e Golfo de Adén. No Irã, segundo informações colhidas, a Guerra de 12 Dias, assim nomeada por Donald Trump, a agressão não provocada ao país persa, cuja a tarefa seria produzir a derrota do regime dos Aiatolás, ou mesmo o desaparecimento do Estado, sonho molhado dos sionistas, levou ao fortalecimento do apoio nacional ao governo, a supressão dos pontos frágeis e, por meio da parceria com a Federação Russa e a República Popular da China, a melhoria de suas capacidades militares. 

Para os EUA, a guerra não é a política por outros meios, como diria Carl von Clausewitz, mas a única linguagem possível nestes últimos governos estadunidenses. Uma política que deixa alguns com saudades do Henry Kissinger, um dos mais famosos criminosos de guerra estadunidenses, responsável pelos bombardeios do Laos e do Camboja durante a Guerra no Vietnã, sem contar a instalação de ditaduras na América Latina, principalmente a de Augusto Pinochet no Chile em 1973. 

Kissinger foi responsável pela grande jogada geopolítica do século: a aproximação entre EUA e a República Popular da China. Até Ronald Reagan e sua equipe são lembrados por terem acabado com a Guerra Fria em um diálogo com dirigentes soviéticos como Mikhail Gorbatchov, de triste memória.

Recomendo a todos o esboço da Estratégia Nacional de Defesa 2025, que expressa uma mudança de foco em relação a Administração Joe Biden em diferentes pontos e sinaliza para um recuo dos EUA para questões internas e foco no Hemisfério Ocidental e incentivo aos “parceiros” europeus para assumir a responsabilidade pela segurança do continente, em especial, o financiamento da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) e manutenção da frente ucraniana, por meio da aquisição de armas do complexo industrial-militar estadunidense.

Irá funcionar na Venezuela? Conseguirá Donald Trump desviar os norte-americanos dos graves problemas econômicos e sociais no seu próprio país? Conseguirá colocar as mãos nas reservas de petróleo, ouro e outros minerais preciosos do país de Bolívar? Difícil saber. A Venezuela, diferente do Brasil, aprendeu com os erros de Salvador Allende no Chile e, hoje, tem o controle total das forças armadas, além de contar com milícias populares com cerca de quatro milhões de pessoas.

É possível que a parceria com a República Islâmica do Irã, muito bem sucedida do ponto de vista econômico, também possa colaborar na melhoria da capacidade de resposta do Governo Bolivariano a uma estratégia de decapitação estadunidense. Difícil saber , para além das declarações altissonantes de Rússia e China, os líderes do Sul Global, até que ponto estão dispostos a ajudar Nicolás Maduro e seus liderados. Para o Império do Caos, como apelidou Pepe Escobar, analista geopolítico brasileiro, basta a destruição do Estado, sem pensar nos resultados. 

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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