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Francisco Calmon

Ex-coordenador nacional da Rede Brasil – Memória, Verdade e Justiça; membro da Coordenação do Fórum Direito à Memória, Verdade e Justiça do Espírito Santo. Membro da Frente Brasil Popular do ES

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Declínio moral e da democracia dos EUA

Uma análise crítica da crise ética, política e imperial que expõe a deterioração interna e externa da maior potência do Ocidente

Donald Trump (Foto: Reuters)

Os Estados Unidos atravessam um momento de queda livre: queda da moralidade, do respeito internacional e da máscara de “indestrutível” do seu imperialismo predatório.

O “sonho americano” já não serve mais como a utopia preciosa vendida aos países subdesenvolvidos.

Dentro dos Estados Unidos, apenas 39% aprovam a gestão de Trump. O sentimento de desunião da sociedade, provocado pela polarização política, está em alta, e a sua democracia atualmente está à beira do despenhadeiro, sendo tratada como um cenário distópico perante o mundo. Especialmente pela forma como a gestão Trump demonstrou, em menos de um ano, capacidade de quase causar uma implosão social interna.

Donald Trump é a figura que, de maneira cruel e bruta, reflete com precisão essa decadência.

Um homem condenado por abuso sexual, com alta probabilidade de estar envolvido diretamente nos “Arquivos de Epstein”, um dos casos mais grotescos de tráfico humano e abuso de menores, cujo cabeça, Jeffrey Epstein, era “coincidentemente” um grande amigo seu e colega de pedofilia. O caso Epstein tornou-se o episódio-síntese da podridão moral: revelações sobre voos no “Lolita Express”, transações financeiras obscuras de bilhões de dólares e a suspeita permanente de um acobertamento pelo Estado.

Pesquisas mostram que a maioria dos norte-americanos desconfia que o governo oculta informações sobre a rede de Epstein, e a aprovação da condução do caso por Trump é pífia.

Seu ego exacerbado transforma todo evento internacional em palco para sua persona, seja na final da liga nacional de futebol americano, na autoindicação ao Nobel da Paz, na invasão da comemoração do Chelsea na final do Mundial dos Clubes ou no sorteio da Copa do Mundo, como uma personalidade infantil que quer ser sempre o centro das atenções.

Mas a vaidade é o menor dos males.

Seu governo normalizou a linguagem do ódio: conselheiros, governadores e agentes trumpistas usaram o pódio oficial para arrotar discriminação, discursos eugenistas e fascistas, dirigidos contra qualquer um que não fosse branco, heterossexual, conservador e estadunidense.

O ódio e o racismo voltaram a ser comuns nas ruas. Crimes sexuais e a pedofilia são reabilitados em debates públicos, em vez de rejeitados com veemência. Tais atos hediondos são inclusive perdoados e esquecidos: basta o autor se declarar um “cristão conservador de família” para estar isento de quaisquer crimes repugnantes.

É uma manobra típica da extrema-direita, e o maior beneficiário dela é o próprio Trump.

Quando uma nação tem um presidente condenado por abuso sexual, é o sinal de que, dali em diante, é só declínio moral.

Essa decadência moral não se limita ao domínio nacional.

O imperialismo estadunidense continua a assassinar no Caribe, sem legitimidade e em afronta ao direito internacional. Trump tentou impor um prazo para o presidente Maduro deixar a Venezuela, um blefe que, se concretizado, significaria o fim da soberania nacional e da autodeterminação dos povos.

O secretário de Defesa dos Estados Unidos, Pete Hegseth, declarou em abril deste ano: “O governo (Barack) Obama tirou os olhos da bola e deixou a China tomar toda a América do Sul e Central, com sua influência econômica e cultural, fazendo acordos com governos locais de infraestrutura ruim, vigilância e endividamento. O presidente Trump disse ‘não mais’, vamos recuperar o nosso quintal”. (Fonte: G1)

É uma confissão em alto e bom som de que a gestão trumpista tem em seu plano de ampliação do imperialismo a recolonização das Américas.

Seguindo esse plano, uma intervenção militar norte-americana na Venezuela, sob o pretexto meticulosamente fabricado de combater o narcotráfico ou restabelecer a ordem, é a mais pura perpetuação da tradição imperialista estadunidense.

Sua interferência em Honduras, ameaçando “consequências severas” caso os resultados eleitorais não lhe fossem favoráveis, expõe o desprezo por processos democráticos alheios e a visão de que países são meras peças nos tabuleiros geopolíticos.

O declínio da hegemonia é uma realidade que bate às portas do império. Embora os EUA ainda tenham o maior PIB nominal, a China já os superou em PIB por paridade de poder de compra; a Índia consolidou-se como a quinta maior economia do mundo, com projeções de crescimento que superam significativamente as taxas dos EUA.

Por trás da figura grotesca de Donald, há um vasto histórico de corrupção e ilegalidades: fraudes financeiras em suas empresas, condenações por falsificação de registros, esquemas de pagamento de “hush money” (suborno, pagamento para manter alguém calado), sonegação fiscal na Trump Organization, fraudes educacionais na Trump University e conflitos de interesse escancarados, como negócios bilionários com fundos estrangeiros durante a sua presidência.

Tudo isso revela um sistema que, longe de conter a degeneração, a alimenta.

Trump personifica a implosão ética de uma potência que outrora vendia falsa moralidade, mas, na atualidade, exporta o caos, o discurso de ódio e a quebra de leis.

A decadência moral que os EUA enfrentam hoje é a manifestação de uma crise estrutural, em que a liderança máxima espelha e amplifica a violação de soberanias, o desprezo pela verdade e a normalização da barbárie.

O mundo assiste, não mais com inveja, mas com horror e repúdio, à queda livre de um império que trocou qualquer pretensão de virtude pela exaltação descarada de sua própria decadência.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.