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Valério Arcary

Valério Arcary é historiador e membro da Coordenação Nacional do Resistência/PSOL.

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Direitos Já não é herdeiro das Diretas Já: é uma armadilha

"Estamos diante de um teatro de sombras. O FHC de hoje cumpre o papel de Tancredo de trinta e cinco anos atrás. E querem fazer com Lula em 2020, o que fizeram com Ulysses em 1984", escreve o historiador Valério Arcary

Lula e Ulysses Guimarães (Foto: Ricardo Stuckert | ABR)
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Quem não sabe contra quem luta não pode vencer. A questão central na luta contra Bolsonaro é a disputa estratégica do poder. O fantasma oculto do Ato de sexta é o apoio da oposição liberal a uma tutela do Congresso e STF sobre Bolsonaro e, se não der certo, o apoio à posse de Mourão, se a crise evoluir mais gravemente, daqui a três ou quatro meses.

É o contrário da luta por Diretas Já. A campanha pelas Diretas Já tinha como objetivo derrotar a ditadura, impedindo que a sucessão de Figueiredo se resolvesse pelo Colégio Eleitoral. Direitos Já não tem como objetivo derrotar Bolsonaro, mas enquadrá-lo. É uma operação ao estilo de Tancredo Neves que subiu nos palanques das Diretas, mas na verdade negociava com Figueiredo a ida para o Colégio Eleitoral. O abraço de Tancredo em Ulysses Guimarães era um abraço de urso.

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Agora, outra vez, nada é o que parece ser. Estamos diante de um teatro de sombras. O FHC de hoje cumpre o papel de Tancredo de trinta e cinco anos atrás. E querem fazer com Lula em 2020, o que fizeram com Ulysses em 1984.

O Ato de sexta é uma antecipação de posicionamentos diante do possível, senão provável, agravamento da crise social e política. Infelizmente, já atingiu um dos objetivos da oposição liberal: manipular a ideia poderosa da unidade para dividir a esquerda.

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A unidade de ação democrática entre a oposição de esquerda e a oposição liberal é uma tática legítima, e até necessária contra Bolsonaro, dentro e fora do Congresso. A questão principal não é quem estará presente no Ato de sexta do Direitos Já, embora algumas presenças, como a do general Santos Cruz,  sejam desconcertantes. O critério que deve definir a presença é, se o que o Ato defende é ou não progressivo.

O objetivo central do Ato é a defesa do Congresso e do STF contra o governo. O Ato é uma defesa do papel de Maia. O mesmo Maia que não abre sequer uma CPI diante de dezenas de pedidos de impeachment. Não defende a necessidade de interromper o mandato de Bolsonaro, o Fora Bolsonaro. Quem não defende o fim do governo, se posiciona, objetivamente, pela continuidade do mandato até o fim. Apoiar esta estratégia seria um suicídio para a esquerda.

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Não haveria nenhuma razão de princípios para não estar presente ao lado de quem quer que seja, se o Ato fosse pelo fim do governo Bolsonaro. Mas não é. Podemos estar juntos com a oposição liberal, por exemplo, exigindo a prisão da mulher de Queiroz, a investigação até o fim de quem mandou matar Marielle, ou a transparência de dados sobre a pandemia, ou denunciando a fuga de Weintraub, ou lutando pela extensão do auxílio de emergência sem redução do valor de R$600,00, etc.

      O Ato convocado pelo Direitos Já não merece o apoio da esquerda porque é regressivo. Seu objetivo é fortalecer a pressão do Congresso e do STF sobre Bolsonaro para que aceite uma tutela, como condição para que cumpra o seu mandato até 2022. Em outras palavras é um Ato de apoio a Maia. Não há nada de progressivo nesse projeto. O Congresso já assumiu grande parte da governabilidade, associado ao STF, nos últimos meses. E vem governando em colaboração com Bolsonaro e Guedes contra os trabalhadores e o povo.  

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O álibi invocado é que o Ato seria contra as ameaças de autogolpe de Bolsonaro, em defesa das instituições. Se fosse há três meses, quando Bolsonaro estava na ofensiva, poderia ser levado mais a sério. Mas a conjuntura mudou, e estamos em novo momento. Não há, neste momento, perigo real e iminente de golpe. Bolsonaro se enfraqueceu nas últimas semanas, e está na defensiva. Mandetta renunciou, Moro se demitiu, as investigações sobre a rede subterrânea de fake news impôs uma recuo à operação dos robôs e, finalmente, Queiroz foi preso. Ainda tem forças para ensaiar uma contraofensiva, procura fascistizar sua corrente de apoio, mantém posições nas Forças Armadas e polícias, é um inimigo perigoso, e tem uma estratégia de subversão do regime. Mas está muito mais isolado, e a dinâmica das crises combinadas reforçam esta dinâmica.

O Manifesto Juntos foi um balão de ensaio com a defesa da “lei e da ordem”. Seu papel era pressionar a esquerda a aceitar um papel subordinado e coadjuvante na oposição. Acontece que a oposição liberal foi derrotada, também, em 2018, pelos neofascistas, não somente a esquerda. Agora o novo Manifesto evoca o “pacto social de 1988” para defender a estabilidade institucional. Temem Bolsonaro, mas têm noites de insônia pensando como estará a sociedade, inclusive a classe média, quando daqui a três meses ficar claro as sequelas da tragédia sanitária, econômica e social.

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O Ato de sexta é uma armadilha para a esquerda. A questão de fundo é que o Brasil caminha para a vertigem de uma crise nacional. As consequências apocalípticas da pandemia, superando os cem mil mortos até setembro, associada a uma crise social catastrófica assim que for suspenso o auxílio emergencial, colocam a possibilidade de mobilizações de massas para derrubar Bolsonaro. E o Ato de sexta em defesa de Maia é também uma defesa da posse constitucional de Mourão, caso Bolsonaro caia. O grande medo é que caiam os dois e, portanto, antes do fim do ano possam acontecer eleições presidenciais antecipadas.

Os articuladores do Ato de sexta não têm uma candidatura consolidada e competitiva. Doria não sai intacto da crise da pandemia, e das sequelas da crise econômica. Huck seria uma improvisação atabalhoada. Moro não oferece garantias mínimas. E o julgamento de Lula no STF está pendente do voto de Celso e Melo. Prevalece uma incerteza tão grande que até o PSDB, que apoiou Bolsonaro no segundo turno, precisa que FHC seja, politicamente, ressuscitado para limpar sua imagem de cúmplice da eleição do neofascista.

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A decisão sobre o que fazer na sexta é de inteligência tática. Na política os tempos são importantes. A esquerda deve disputar a liderança da oposição por dentro ou por fora da unidade na ação, quando e como? Nada mais, mas nada menos do que isso. Por isso é um erro que alguns quadros do Psol tenham confirmado presença. Enquanto não há condições de mobilizações de massas, a esquerda deve aceitar que a liderança da oposição caia nas mãos de Maia? Mas, por quê?

O protagonismo da oposição liberal com o apoio da mídia é uma fotografia. A esquerda está sem as ruas. E há sinais de que a audiência da esquerda está crescendo. O apoio que ganharam as corajosas ações de rua de vanguarda. E Boulos cravou 10% em São Paulo.

O Ato de sexta é regressivo. Não é que é somente limitado porque não diz Fora Bolsonaro. Há negociações entre Gilmar e os militares, entre o governo e Alexandre de Moraes, e entre Maia e Bolsonaro, todas públicas. A disputa pela direção da oposição está em aberto. Se não houve derrota histórica a hipótese que devemos apostar é que a apatia política não vai prevalecer, e haverá reação de massas ao governo Bolsonaro. Se esta é a aposta, a luta é pela Frente de Esquerda. Com exigências e denúncias, mas por fora desta armadilha travestida de Frente Ampla. É um abraço de urso.

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