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Ronaldo Lima Lins

Escritor e professor emérito da Faculdade de Letras da UFRJ

289 artigos

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Dobrar ou não dobrar a espinha?

Por sorte, temos no governo alguém que, à maneira do estudante acima citado, não dobra a espinha

Donald Trump e Lula (Foto: Reuters | ABR)

As atitudes de Donald Trump neste seu segundo mandato, o modo como se comporta, lembram o personagem criado pelo grande escritor alemão Heinrich Mann - O Professor Unraat - ainda antes da ascensão de Hitler. Ele fora humilhado desde sua formação na aldeia onde morava. Adulto, assumiu uma cadeira na escola local e pensou em se vingar. Valia-se da sua função e reprimia cada um dos alunos, filhos e parentes dos que o haviam perseguido, utilizando-se das notas na avaliação dos deveres. Ninguém lhe escapava da sanha rancorosa. Passou a ser visto com terror. Como não havia outro educandário, adotou o perfil de tirano e reinou sem contestações. Os estudantes, em contrapartida, o chamavam de Sujeira, num trocadilho que, em alemão, com pequenas alterações, transformava Conselheiro, o seu sobrenome, em coisa ruim, nojenta, asquerosa.

Nada transcorria fora dos eixos até que lhe apareceu um estudante especial, alguém altivo, tão orgulhoso que sequer o chamava de... Sujeira. E o que não suportava nos outros, suportou menos ainda diante daquele que o poupava da agressão. Começou a espioná-lo, imaginando que aprontaria alguma, num cabaré esquecido da cidade. De fato, o rapaz se divertia assistindo uma cantora que lá se apresentava. Foi o bastante para que o supostamente honrado professor, caísse em desgraça. Apaixonou-se pela dançarina. Não via nada à sua frente. Cumpriu as etapas da decadência.

Trump usa as tarifas como aquele se valia das notas: para esmagar os subordinados. Não deve despender um minuto sem elaborar maquinações que esgrimam o roteiro de suas más recordações, agora que possui o poder de brandi-las com liberdade. Age assim na política externa e interna, quando pode e não pode, sejam quais forem os clamores que os resíduos de democracia em suas fronteiras ainda se ergam contra ele. Encontrou, pela frente um primeiro adversário altivo e orgulhoso, a China, para lhe fazer frente. E, em seguida, depois de uma segunda onda de agressividade – com base na tal Lei Magnitsk – mirou Alexandre de Moraes e o nosso Presidente. Contou com a solidariedade de alguns traidores da pátria, Eduardo Bolsonaro e Paulo Figueiredo, o neto do ditador. E, naturalmente, como no desprezível Unraat (Sujeira), exultou de euforia, supondo a extensão dos desacertos que, a seu ver, iria provocar.

Por sorte, temos no governo alguém que, à maneira do estudante acima citado, não dobra a espinha. Aqui também, é verdade, possuímos aduladores de plantão, sempre dispostos a encenar uma boa humilhação e sugerir que a reproduzam. Não adianta. Enquanto viver, Lula não abrirá mão dos seus princípios. Entendimento, conversa, gestos diplomáticos com os opositores, sim. Submissão, jamais. Foi como saímos da situação e continuaremos nos posicionando, com ou sem a Lei Magnitsk.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.