CONTINUA APÓS O ANÚNCIO
blog

Dramaturgia judicialesca telejornalizada

Os plenários dos tribunais semelham cada vez mais às bancadas dos telejornais. O exercício da função jurisdicional é menos tentativa de solução técnico-jurídica de uma pendenga real, do que ocasião para a exposição desbragada das visões de mundo dos magistrados, de sua ideologia propriamente dita

09/06/2017- Brasília- DF, Brasil- Sessão plenária do TSE para julgamento da Aije 194358. Foto: Roberto Jayme/Ascom/TSE (Foto: Vinícius Madureira)
CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

✅ Receba as notícias do Brasil 247 e da TV 247 no canal do Brasil 247 e na comunidade 247 no WhatsApp.

Os plenários dos tribunais semelham cada vez mais às bancadas dos telejornais. O exercício da função jurisdicional é menos tentativa de solução técnico-jurídica de uma pendenga real, do que ocasião para a exposição desbragada das visões de mundo dos magistrados, de sua ideologia propriamente dita. Idiossincrásicas, o mais das vezes. Quase todas ela. A Ajufesp já havia gentilmente recomendado a certo juiz, diletante no orgulhoso ofício de comentarista político, que “renunciasse a toga” e fosse dar com os burros n’água furtada doutro palacete. O da imprensa, claro. 

Certa feita, Gilmar Mendes chegou a levar um puxão de orelha, diante de todos no STF, por parte do então Ministro Presidente Nelson Jobim: “Vossa Excelência há de convir que isso não são argumentos jurídicos que possamos debater aqui. Não estamos aqui para julgar o Governo.” (vide ADI n° 3.060). Ignorando de quando em vez o objeto mesmo das ações, qual seja, a cassação ou não da chapa Dilma-Temer, o ambivalente ministro Herman Benjamin (STJ e TSE) julgava-se “subjetivamente capaz” de julgar, antes, ora o sistema, ora o regime de governo. Em suma, repudiou com veemência o tal do “presidencialismo de coalizão”, moeda corrente em qualquer discussão com ares cívicos. No que repetiu, por mero acaso, o procurador Dallagnol. O voto do relator não deveria também ser impresso e, em forma livresca, rivalizar nas bancas com Leonardo Avritzer? Não bastassem os favores feitos à nação com sua destacada atuação na Lava Jato, o pródig(i)o Dallagnol também nos regalou com obra sua. Prefaciada, aliás, por uma conhecida comentarista política de todas as manhãs deste Brasil letrado. Inusitado?

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Quem melhor designa esse fenômeno nada insólito parece ser ainda o meu dileto amigo Ruy Vasconcelos de Carvalho. De resto, o escritor brasileiro que mais me agrada ler. E reler, e não é de hoje. “Telenovealidade”. Difícil ele ser sobrepujado.

Vivemos num país excessivamente comovido, via televisão. E não só pelo cacho diário de telenovelas, pois a linguagem destas “é” a linguagem da televisão brasileira, com alguns empréstimos blockbusters. E há décadas. Essa linguagem, aliás, estende-se aos anúncios. Aos reality shows. E até mesmo ao jornalismo televisivo — não descartando-se aqui sequer o esportivo ou o político — que está impregnado dessa narratividade barroca e telemelodramática. Em especial, o seu mais poderoso bastião: o Jornal Nacional. Será mera coincidência que vem ensanduichado entre duas telenovelas? Será mero acaso que seja apresentado por um casal? E o que dizer das lágrimas de William Bonner quando da morte de Roberto Marinho? E de toda contrafação emocional que ronda o teor dos assunto tocados? Os semblantes dos apresentadores ou âncoras raramente são neutros. Mais isentos, compostos. Porém ou compungidos ou risonhos. Ou então, abertamente cínicos [...]. O adestramento dos, em geral, maus atores de telenovela vazou para jornalistas, que sequer são capazes de uma tarefa simples: “ler” as notícias num teleponto com um tom de voz minimamente neutro ou composto. Comentar essas notícias com um mínimo grau de dignidade [...]*

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Agora transponha-se essa lógica às aparições do full bench. Havia mesmo algo de metalinguístico na longa cobertura do julgamento do TSE pelo Jornal Nacional, ontem à noite. Bonner e Poeta faziam a chamada dos votos proferidos individualmente pelos sete ministros como que se reportando aos “enviados especiais” de sempre. Uma a um. Direto de Brasília. Márcio Losekann como Rosa Weber; Heraldo Pereira Napoleão Maia (2016 como 1992; o sobrinho como o tio...). Faltou apenas dar-lhes o fatídico “boa noite”. Que deselegante! 

Por trás de uma retórica pomposa e obcecada com argumentos de autoridade, num palco moderador marcado pela imoderação, a noite do dia 09/06/17 é mera repetição farsesca da trágica noite congressista de 17/04/16. Em tempos de ira (et studio), arrisco, por fim, uma profecia, à guisa do velho Mouro na conclusão de seu 18 de Brumário. Uma profecia decerto fácil porque, enfim, já até cumprida. Mas se a toga republicana dos ministros não lhes cair dos ombros, a estátua de granito da Justiça de Cheschiatti há de se esboroar a olhos vistos na Praça dos Três Poderes.

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

* Disponível em: http://afetivagem.blogspot.com.br/2010/10/algo-com-uma-telenovealidade.html. 

 

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

iBest: 247 é o melhor canal de política do Brasil no voto popular

Assine o 247, apoie por Pix, inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista:

Carregando os comentários...
CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Cortes 247

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO
CONTINUA APÓS O ANÚNCIO