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Jean Goldenbaum

Músico, professor da Universidade de Música de Hanôver, Alemanha. É membro fundador do ‘Observatório Judaico dos Direitos Humanos do Brasil’ e fundador do coletivo ‘Judias e judeus com Lula’

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É genocídio sim. Bolsonaro é pessoalmente responsável por dezenas de milhares de mortes

Se a Corte Internacional de Justiça de Haia tomar posse dos documentos mencionados neste artigo, ela pode indubitavelmente acusar Bolsonaro por crime de genocídio

Protestos consagram Bolsonaro como genocida (Foto: Filipe Araújo)
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Jean Goldenbaum

(com a colaboração de Denise Assis)

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Ainda que se tenha ultrapassado a macabra marca de 130 mil mortos no Brasil por Covid-19 (e devemos levar em conta a subnotificação) em um período de aproximadamente seis meses, paira ainda em alguns setores da sociedade o argumento de que o termo ‘genocídio’ não é apropriado a esta situação. Entretanto, muito infelizmente, este termo é correto e neste artigo procuro explicar os motivos pelos quais não temos dúvidas de que não há outro que se aplique melhor às atuais conjunturas do país.

Primeiramente devemos definir o conceito Genocídio com a ajuda de dicionários. O Michaelis descreve o verbete como:

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Destruição total ou parcial de um grupo étnico, de uma raça ou religião através de métodos cruéis.

Eliminação de povos com utilização de prevenção de nascimento, desaparecimento de crianças e condições subumanas de vida.

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O Dicio assemelha-se na definição:

Extermínio que, feito de maneira deliberada, aniquila (mata) uma comunidade, um grupo étnico ou religioso, uma cultura e/ou civilização.

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Massacre que atinge um grande número de pessoas (populações ou povos).

Ação de aniquilar grupos humanos através da utilização de diferentes formas de extermínio como: a pobreza ou a fome em certas regiões do mundo; sequestro permanente de crianças e refugiados etc.

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Pois bem, ambas as descrições deixam claro que o genocídio não necessariamente está relacionado a guerras, como foi o caso do Holocausto, perpetrado pelos alemães nazistas. Também não está forçosamente ligado a uma ação única concentrada em um definido espaço de tempo, como foi o massacre de Ruanda em 1994, que se deu em somente nove dias.

O que as definições acima elucidam é que um genocídio se trata de um extermínio total ou parcial de um grupo humano específico, seja ele caracterizado por sua etnia, religião, cultura ou civilização. E isso pode ocorrer através da “utilização de diferentes formas de extermínio”, ou seja, armas, câmaras de gás, crematórios, não são as únicas possibilidades. Subjugar pessoas a “condições subumanas de vida” também é uma opção. E é exatamente o que ocorre no Brasil, quando tratamos de um governo que nega os direitos universais básicos à maior parte de sua população. Condições subumanas podem não ser fatais em tempos normais, mas em tempos de pandemia o são.

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No Brasil é evidente que há grupos sociais que são especificamente vítimas de um massacre. E quais são eles? Para a surpresa de ninguém, logicamente, pobres (em sua maioria negros ou pardos) e indígenas. Há inúmeros artigos e estudos que comprovam esta terrível realidade e abaixo menciono alguns.

A Revista Galileu apontava já em maio em seu artigo ‘Na pandemia de Covid-19, negros morrem mais do que brancos. Por quê?’ que “em termos de óbitos por Covid-19, pessoas sem escolaridade têm taxas três vezes maiores (71,3%) em relação àqueles com nível superior (22,5%). Combinando raça e índice de escolaridade, o cenário fica ainda mais desigual: pretos e pardos sem escolaridade morrem quatro vezes mais pelo novo coronavírus do que brancos com nível superior (80,35% contra 19,65%). Considerando a mesma faixa de escolaridade, pretos e pardos apresentam proporção de óbitos 37% maior, em média, do que brancos.”

O artigo frisa também que somente a partir de 11 de abril a Coalização Negra por Direitos conseguiu que a cor de pele dos infectados e mortos fosse incluída nas notificações oficiais, argumentando que “a quantidade de notificação sem informação de cor só reforça o racismo institucional, que invisibiliza os negros”. Assim, a partir do momento em que este dado foi incluído, tornou-se incontestável esta realidade.

Em julho o colunista Ricardo Kotscho publicou em seu blog na UOL o artigo ‘Covid-19 mata mais pretos e pobres: a autópsia da desigualdade e do racismo’, no qual salienta baseando-se nas estatísticas (que estão disponíveis na internet para quem quiser averiguar) que “são pretos, pobres e indígenas os que mais morrem nos hospitais, quando conseguem vaga num hospital, excluídos dos direitos mais básicos da cidadania, abandonados ao seu próprio destino”.

Até mesmo a Revista Valor Econômico da Globo (irônico, não?) publicou em 22/08 o artigo ‘Covid-19 continua a avançar em comunidades e mata dois índios por dia’. Neste destaca-se que “considerando os dados da Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil), a mortalidade por um milhão de habitantes dos indígenas é maior do que a registrada no Brasil como um todo. O índice brasileiro é de 510, enquanto o dos indígenas, de 855”. Atentem: de todos os povos do país, os indígenas possuem o mais alto índice relativo de mortalidade.

Enfim, esta realidade não se deu e não se dá espontaneamente. Há ações deliberadas de Bolsonaro que conduziram a conjuntura a este caminho. A partir do momento em que o mundo inteiro entra em estado de alerta e a Organização Mundial da Saúde (OMS) declara oficialmente que são necessárias medidas de prevenção imediatas para que a vida de pessoas seja preservada, quem age contrariamente a isso está obviamente atentando contra a vida. Está agindo em nome da morte. Monstros como Bolsonaro e Trump, ao desdizerem os especialistas e zombarem da Ciência, se tornaram agentes possibilitadores de verdadeiros massacres. Não é à toa que estes dois países lideram a lista mundial de óbitos na pandemia. Eles sabem muito bem que “a corda arrebenta do lado mais fraco”, como diz a expressão popular brasileira. É óbvio que morrerão pobres e não ricos, se o governo não fizer tudo o que estiver ao seu alcance para possibilitar ao pobre aquilo que o rico pode comprar e ele não – no caso, vagas no hospital, leitos de UTI, medicação, assistência médica e condições sanitárias de modo geral. Ou seja, ao saber desde o início qual seria o resultado desta pandemia, Bolsonaro e Trump condenaram à morte aqueles que desejaram condenar. E o fizeram simplesmente através de suas ordens políticas e de suas posturas que incitam que as populações façam justamente o contrário daquilo que é correto e que poderia lhes salvar a vida.

Mas vamos mais adiante, expondo especificamente ordens de Bolsonaro através das quais ele deliberou a morte de pessoas de grupos singulares. Por mais perigosos que os dois últimos ex-ministros da saúde fossem – e o eram de fato –, mostraram-se não tão alucinados como o presidente a ponto de contrariarem completamente a OMS. De certa forma se alinharam ao combate à pandemia. Assim, imediatamente o presidente os demitiu, fazendo com que o Brasil se tornasse possivelmente o único país do planeta a enfrentar esta época ímpar de crise salutar sem um ministro da saúde.

Outra medida de Bolsonaro que caracteriza a concretude do genocídio é o fato de este ter vetado a obrigação do governo em fornecer água potável, higiene e leitos hospitalares às populações indígenas. Estes criminosos vetos estão registrados na lei 14.021, de 7/7/2020 e explicados em diversos artigos de jornais disponíveis na internet (entre eles o do jornalista Daniel Carvalho, na Folha de São Paulo em 8/7).

Em suma, se a Corte Internacional de Justiça de Haia tomar posse destes documentos, ela pode indubitavelmente acusar Bolsonaro por crime de genocídio. Se não pelo massacre geral (algo que pode ser mais difícil de se provar juridicamente), no mínimo pelo genocídio das populações indígenas, sobre os quais há subsídio mais do que suficiente.

E há mais um argumento essencial a ser elencado. Façamos uma comparação entre Brasil e Alemanha, dois países opostos no espectro do cuidado e do respeito às suas populações durante a pandemia. Em fins de janeiro a Alemanha foi atacada pelo vírus. Com postura exemplar o governo federal conduziu o combate à doença da melhor forma possível, fazendo com que após uma primeira onda de óbitos o número tenha se estagnado. A Alemanha possui uma população de cerca de 83 milhões de habitantes e o número de mortes é hoje cerca de 9.400. O Brasil possui cerca de 209 milhões de habitantes, ou seja, duas vezes e meia a mais que a Alemanha, e o número de mortes hoje é de 132.100. Esse número é 14 vezes maior do que o alemão, o que comprova as consequências da postura positiva ou negativa da liderança frente a tamanha crise de saúde.

E este cenário ainda piora se lembrarmos que o vírus chegou ao Brasil somente no final de fevereiro, ou seja, um mês após ter chegado à Europa e no ocidente como um todo. Isso significa que as Américas tiveram muito mais tempo para se preparar para o vírus do que a Europa. E isso só aumenta ainda mais a culpa de Bolsonaro.

Em suma, através da comparação com a Alemanha ou qualquer outro país que tenha agido de forma consciente, científica e, sobretudo, humana, nos fica claro que dezenas de milhares de vidas brasileiras poderiam ter sido poupadas. Ao fazermos uma conta de proporção contrapondo estes países, chegamos à conclusão de que, levando-se em consideração o tamanho do Brasil e a gravidade da doença, cerca de 30 mil mortes seriam realmente inevitáveis. Já as outras cem mil (fora as que estão por vir) estão nas costas de Bolsonaro, o mais vil, cruel e perigoso presidente da história do Brasil.

O futuro dirá se este homem pagará pelos seus crimes. E quem viver – ou melhor, sobreviver – verá.

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