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Pepe Escobar

Pepe Escobar é jornalista e correspondente de várias publicações internacionais

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É o mundo de Nikolai Patrushev-Yang Jiechi

Enquanto a sino-russo-iranofobia se dissolve em sanções e histeria, os cartógrafos constroem a ordem pós-unilateral

Nikolai Patrushev e Yang Jiechi (Foto: Xinhua/Ding Haitao)
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Por Pepe Escobar, para o Asia Times

Tradução de Patricia Zimbres para o 247

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O show é de Nikolai Patrushev-Yang Jiechi – mais uma vez. Esses são os dois atores que comandam a promissora entente geopolítica, em nome de seus chefes, Vladimir Putin e Xi Jinping.

Na semana passada, Yang Jiechi – diretor do Gabinete da Comissão de Relações Exteriores do Comitê Central do Partido Comunista - visitou o Secretário do Conselho de Segurança Russo, Nikolai Patrushev, em Moscou. O encontro fazia parte da 16ª rodada de consultas estratégicas sobre segurança China-Rússia.

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O intrigante é que o encontro Yang-Patrushev ocorreu entre a reunião Blinken-Lavrov  ocorrida nos bastidores da Cúpula do Conselho em Reykjavik e a reunião de escalão mais alto Putin-Biden, a ter lugar em Genebra, em 16 de junho (possivelmente no Hotel Intercontinental, onde Reagan e Gorbachev se reuniram em 1985).

A narrativa ocidental sobre o futuro encontro Putin-Biden é que ele venha a prenunciar algum tipo de retorno à "previsibilidade" e à "estabilidade" nas atualmente hiperturbulentas relações Estados Unidos-Rússia. 

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Ledo engano. Putin, Patrushev e Lavrov não têm a menor ilusão. Principalmente porque, no G7 de Londres, em inícios de maio, o foco ocidental recaiu sobre as "atividades malignas"  da Rússia, bem como as "políticas econômicas coercitivas" da China.

Analistas russos e chineses, em conversas informais, tendem a acreditar que Genebra será mais uma instância do velho dividir e governar kissingeriano, acrescido de algumas táticas sedutoras para atrair Moscou para bem longe de Pequim, na tentativa de ganhar tempo  e sondar oportunidades de armar ciladas geopolíticas. Raposas velhas como Yang e Patrushev estão para lá de conscientes do jogo que está sendo jogado.   

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É particularmente relevante que Yang-Patrushev prepararam o terreno para uma futura visita de Putin a Xi, em Pequim, logo após o encontro Putin-Biden em Genebra – para dar continuidade, mais uma vez, à coordenação geopolítica da "parceria estratégica ampla", na terminologia reconhecida por ambos. 

A visita talvez ocorra em 1º de julho, o centésimo aniversário do Partido Comunista Chinês - ou em 16 de julho, o 2º aniversário do Tratado de Amizade Russo-Chinês.   

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Então, Putin-Biden é a entrada; Putin-Xi, o prato principal.  

Aquele chá para dois de Putin-Luka 

Mais além do comentário "emocionalmente explosivo" do Presidente russo em defesa das medidas tomadas por seu colega bielorrusso, o chá para dois Putin-Lukashenko ocorrido em Sochi revelou mais uma peça do quebra-cabeça do pouso de emergência em  Minsk de um avião da Ryan Air – estrelando um blogger de Belarus que supostamente teria prestado serviços ao  ao ultranacionalista e repleto de nazistas batalhão Azov, que lutou contra as repúblicas populares de Donetsk e Lugansk no Donbass ucraniano, em 2014.

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Lukashenko disse a Putin que havia "trazido alguns documentos para que você possa entender o que está acontecendo". Nada vazou do conteúdo desses documentos, mas é bem possível que eles sejam incandescentes – e relacionados ao fato de que sanções foram impostas pela  União Europeia contra a Belavia Airlines, embora a empresa nada tivesse a ver com a saga da RyanAir – e potencialmente capazes de serem mencionados no contexto do encontro Putin-Biden em Genebra.

O Grande Panorama é sempre a Eurásia contra o Ocidente Atlanticista. Por mais que Washington continue forçando a Europa – e o Japão – a se desacoplarem tanto da China quanto da Rússia, a Guerra Fria 2.0 em duas frentes simultâneas encontrará pouquíssimos compradores. 

Atores capazes de pensamento racional veem que, no século XXI, o poderio científico, econômico e militar de uma parceria estratégica Rússia-China seria algo de totalmente novo em termos de alcance global, comparado à era da antiga URSS/Cortina de Ferro.

E quando se trata de atrair o Sul Global e as reiterações do Movimento Não-Alinhado (MNA), a ênfase em uma ordem internacional calcada na Carta das Nações Unidas e no direito internacional é decididamente mais sexy que a tão propalada "ordem internacional baseada em regras", na qual apenas o Hegêmona dita as regras.

Moscou não tem a menor ilusão quanto ao novo plano de Washington, e o mesmo se aplica a Pequim - principalmente depois do último acesso de ira de Kurt Campbell, ex-secretário de estado adjunto para o Leste Asiático e o Pacífico da era Obama-Biden 1.0, que agora está de volta como chefe do departamento do Indo-Pacífico no Conselho de Segurança Nacional do governo Obama-Biden 3.0. 

Campbell é o verdadeiro pai do conceito "pivotar para a Ásia", da época em que ele estava no Departamento de Estado, em inícios da década de 2010, embora, como observei durante a campanha presidencial norte-americana de 2016, foi Hillary Clinton, como Secretária de Estado, que reivindicou a maternidade do pivotar para a Ásia, em um ensaio de outubro de 2011.

Em um evento promovido pela Universidade de Stanford, na semana passada, Campbell afirmou: "O período que de maneira geral foi descrito como engajamento [com a China] chegou ao fim". Afinal, o "pivotar para a Ásia"  nunca morreu de todo, já que houve uma clara continuidade nos governos Trump-Biden. 

Campbell tentou confundir falando de um "novo conjunto de parâmetros estratégicos" e da necessidade de confrontar a China trabalhando com "aliados, parceiros e amigos". Bobagem: o que está em questão é a militarização do Indo-Pacífico.

Foi isso que o próprio Biden reiterou em sua primeira fala a uma sessão conjunta do Congresso dos Estados Unidos, quando ele se vangloriou de ter dito a Xi que os Estados Unidos irão "manter uma forte presença militar no Indo-Pacífico", da mesma forma que faz com a OTAN, na Europa.

O fator iraniano

Em uma raia diferente, embora paralela a Yang-Patrushev, o Irã talvez esteja na cúspide de uma importantíssima mudança de rumo. Podemos vê-la como parte de um progressivo fortalecimento do Arco da Resistência - que liga o Irã, as Unidades de Mobilização Popular do Iraque, da Síria, o Hezbolá, os Houthis do Yêmen e agora uma Palestina mais unificada. 

A guerra por procuração na Síria foi um gigantesco e trágico fracasso em todos os aspectos. Ela não entregou a Síria secular a um bando de takfiris (também conhecidos como "rebeldes moderados").  Ela não evitou a expansão da esfera de influência do Irã. Ela não tirou dos trilhos o ramo Sudoeste Asiático das Novas Rotas da Seda. Ela não destruiu o Hezbolá.

"Fora Assad"? Continuem sonhando: ele foi reeleito com 95% dos votos sírios, com um comparecimento de 78%.

Quanto às próximas eleições presidenciais no Irã em 18 de junho - apenas dois dias após o encontro Putin-Biden – elas ocorrerão no momento em que, muito provavelmente, o drama da retomada do acordo nuclear sendo encenado em Viena  terá atingido seu estágio final. Teerã vem repetindo enfaticamente que a data final para um acordo é hoje, 31 de maio.

O impasse é evidente. Em Viena, por meio de seus interlocutores da União Europeia, Washington concordou em levantar as sanções sobre o petróleo, a petroquímica e o banco central iranianos, mas se recusa a anular as que atingem indivíduos tais como os membros do Corpo da Guarda  Revolucionária Iraniana.

Ao mesmo tempo, em Teerã, algo extremamente curioso aconteceu com Ali Larijani, antes Presidente do Parlamento, um membro ambicioso de uma família de grande proeminência, mas descartado pelo Conselho Guardião na escolha dos candidatos à presidência. Larijani aceitou imediatamente a decisão do Conselho. Como ouvi de insiders de Teerã, isso aconteceu sem nenhuma fricção porque ele recebeu uma explicação detalhada sobre algo muito maior e mais importante: a grande novidade do pedaço.

Nas atuais circunstâncias, quem está posicionado como o quase inevitável vencedor em 18 de junho parece ser Ebrahim Raeisi, atualmente presidente do Supremo Tribunal - e muito próximo aos Guardas Revolucionários. Há uma forte possibilidade de ele vir a pedir que os inspetores da Agência Internacional de Energia Atômica deixem o Irã - o que significa o fim do Plano de Ação Conjunto Global (JCPOA) tal como o conhecemos hoje, com consequências imprevisíveis. (Do ponto de vista dos Guardas Revolucionários, o JCPOA já está morto).

Um fator adicional é que o Irã vem atualmente sofrendo uma forte seca - antes mesmo do início do verão. A rede de energia será tremendamente pressionada. Os reservatórios estão vazios, de forma que é impossível contar com energia hidroelétrica. Há forte descontentamento popular com o fato de que a Equipe Rouhani impediu que o Irã tivesse acesso à energia nuclear. Uma das primeiras medidas tomadas por Raeisi talvez seja ordenar a imediata construção de uma usina de energia nuclear.

Não precisamos de um meteorologista para saber para que lado o vento sopra quando se trata das três principais "ameaças existenciais" ao Hegêmona em declínio – Rússia, China e Irã. O que já está claro é que nenhum dos velhos e testados métodos usados para manter subjugados os vassalos vem funcionando - pelo menos quando confrontados com potências realmente soberanas.

Enquanto a sino-russo-iranofobia se dissolve em sanções e histeria, cartógrafos como Yang Jiechi e Nikolai Patrushev incansavelmente constroem a ordem pós-unilateral.

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