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Valéria Dallegrave

Jornalista, escritora e dramaturga

35 artigos

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É preciso expressar emoções nas redes para atingir corações e mentes

A sociedade do espetáculo vai muito além do jornalismo político, envolve a política - em todo o mundo ocidental, não apenas no Brasil

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O uso das redes sociais trouxe a possibilidade de conseguir informações não alinhadas ao poder econômico. Embora alguns tenham aproveitado essas brechas para se informar melhor, outros continuaram recebendo notícias de forma convencional, tornando-se (ou permanecendo) vítimas de uma visão estreita e manipulada de mundo. 

Os tempos haviam mudado e seria necessário pelo menos três horas diárias na busca de fontes confiáveis na internet. Uma dedicação impossível para a maioria das pessoas, em uma vida já cheia de afazeres.

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No modelo de sociedade em que vivemos, é fácil ser seduzido por tudo que o dinheiro pode comprar.

Uma casa na praia, um carro de luxo, uma viagem a... Paris, podem se tornar metas de vida. A classe mais explorada não tem sequer opção, é preciso trabalhar arduamente para conseguir o minimo necessário em alimentação, vestimenta, saúde, moradia e... internet. 

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Assim, como pedir um esforço extra daqueles a quem queremos conscientizar, se o que lhes oferecemos, informações que podem mudar sua visão de mundo e decidir sua vida, é algo cujo valor desconhecem?

Com ocupações exaustivas em cidades repressoras, cercado por cimento, trânsito estressante e violência cotidiana, o trabalhador só consegue usar o pouco tempo que lhe resta para desopilar da vida sufocante. 

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Já sufocante antes mesmo das repressões racistas e da pandemia causarem mais falta de ar. Tudo o que importa, para muitos, é encontrar alguma forma de diversão. Por isso foi necessário criar variantes de divertimento em todas áreas. 

Professores tornaram-se “entertainers”, animadores de auditório. Na sociedade do espetáculo, só o espetacular seduz. Surgiu até o termo “infotenimento”: um híbrido entre informação e entretenimento...

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No jornalismo, a espetacularização tornou-se comum, para capturar a atenção de um público exausto e desinteressado. Em temas considerados extremamente chatos pela maioria, como o jornalismo político, a busca incansável de escândalos de corrupção levou à desinformação e noticias fabricadas ou falsas.

Quando, enfim, a máquina judicial se voltou contra o PT, no chamado mensalão, foi natural que os holofotes se voltassem para essa narrativa...

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E a sociedade do espetáculo vai muito além do jornalismo político, envolve a política - em todo o mundo ocidental, não apenas no Brasil. O caso mais impressionante aconteceu na Ucrânia, que elegeu como presidente o comediante de uma sátira política na TV ( Servo do Povo ), cujo personagem era um professor que acidentalmente se tornava presidente, depois de um vídeo viralizar.

Mas a comédia (ou tragédia) não para aí. O partido político pelo qual Zelensky se elegeu tem nome igual ao do programa, sua eleição foi embasada no sentimento de descontentamento dos ucranianos com a classe política. A campanha ocorreu sem comícios, apenas com o uso de redes sociais e slogans como “se não há promessa, não há decepção”. 

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Chegou ao ponto de diversos veículos de comunicação assinarem uma carta aberta pedindo que o candidato respondesse a perguntas dos jornalistas sobre seu vago plano de governo. Já em nosso país, planos de governo vagos não foram problema nas últimas eleições, em que se naturalizou também a ausência de debates, assim como não foi questionada a falta de experiência no executivo ou a má condição de saúde de quem supostamente havia levado uma facada.

As fake news contra a esquerda e o uso de robôs para espalhá-las entre a população, por sua vez, não foram motivo para o judiciário questionar o resultado das urnas, e o despresidente assumiu o cargo maior do país, continuando a construir seu personagem livremente. 

Espontaneidade, bravura, “porte atlético”, virilidade são algumas características alimentadas por vídeos, falas e performances grotescas, que servem para gerar compartilhamento imediato entre seguidores. Por um ou outro motivo, ele gera audiência nas redes. Alguns o admiram (sem comentários), outros o detestam, e ambos compartilham seus videos, para elogiar ou criticar...

Como o despresidente demonstra interesse na reeleição - embora diga que não sabe o que fazer para tirar o país da crise-, preocupa-se antecipadamente em detonar possíveis concorrentes. 

Não é para menos que considere importante livrar-se de Doria, outro performático que fez sucesso nas redes ao se caracterizar como lixeiro e usar uma cadeira de rodas afim de testar a acessibilidade para cadeirantes nas ruas. Bolsonaro sabe que, hoje em dia, o domínio do show é determinante para manter o poder. O confronto entre ele e Doria não é entre dois políticos, mas dois personagens. Pouco importa se ao redor continue morrendo gente.

O sucesso destes personagens criados por eles depende de explorar, na comunicação, algumas características muito bem delineadas por Ignácio Ramonet em O Poder Midiático, com a denominação de “discurso infantilizante”: emoção, simplicidade e rapidez.

Enquanto isso, a esquerda se expressa quase apenas por textões e vídeos longos, em linguagem pouco popular. Claro que não podemos abrir mão do aprofundamento de debates e reflexões, mas em paralelo precisamos de mensagens que atinjam mais facilmente o público em geral – e, quando for o caso, sejam um convite para encarar textos longos e ideias complexas. Para isso, não precisamos esperar pela iniciativa de uma liderança específica, ou de um Partido. Cada um de nós, indignados, precisa liberar sua expressão nas redes sociais.

O pior mesmo é quanto ao quesito emoção: temos nos apegado à razão a ponto de represar toda e qualquer indignação provocada pelo desgoverno genocida, que a cada dia destrói mais estruturas sociais, conta novas mentiras oficiais e demonstra uma incompetência que é o fim da picada (desculpem a piada sem graça). 

Temos adoecido por isso tudo, sem precisar sequer da ajuda do vírus. Para resgatar a saúde física e mental precisamos deixar a emoção sair, tomar as redes... É ela que pode, inclusive, gerar compartilhamento imediato, e viralizar o #ForaBolsonaro.

Se não for possível sair às ruas (com distanciamento adequado, máscaras e todos cuidados necessários), nada nos impede de fazer vídeos e mensagens individuais, familiares, de pequenos grupos. Vídeos espontâneos ou performáticos. Por que não vemos depoimentos das pessoas que perderam familiares e amigos para o coronavírus, e o que as mesmas acham do despresidente genocida que estimula aglomerações como se nada estivesse acontecendo!?

Precisamos compreender que, na sociedade do espetáculo, às vezes não é preciso sair às ruas para causar comoção popular. Basta um enquadramento fechado, um depoimento ou uma performance que atinja corações e mentes. 

Lembremos do coletivo feminista chileno Las Tesis, cuja música e coreografia de “Um estuprador em seu caminho” tomou o mundo. A primeira performance, parte de uma peça de teatro que não chegou a estrear, contou com poucas participantes, em Valparaíso. Mas o vídeo viralizou, impulsionado pelo sentimento de revolta das mulheres, e a letra foi cantada em diversas línguas, nas principais capitais do mundo.

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