Educação antirracista: compromisso inadiável para transformar as escolas brasileiras
O obstáculo permanece: a resistência estrutural. A educação antirracista confronta privilégios, questiona narrativas históricas e exige coragem institucional
A chegada do Dia Nacional da Consciência Negra, celebrado em 20 de novembro, é sempre um chamado à reflexão - mas também à responsabilidade. Não se trata apenas de uma data da memória coletiva brasileira, e sim de um marco que nos obriga a encarar, com honestidade, como estamos enfrentando o racismo em nossas instituições, especialmente nas escolas. A educação é, desde sempre, um dos espaços mais potentes para a transformação social. E, justamente por isso, é também onde o racismo - estrutural, histórico e persistente - mais precisa ser combatido.
Quando falamos em educação antirracista, não estamos mencionando um conjunto de atividades pontuais aplicadas no mês de novembro. Estamos falando de um compromisso institucional profundo, capaz de orientar decisões pedagógicas, práticas de gestão, contratação de profissionais, clima escolar e até a forma como famílias e estudantes são acolhidos. A escola não pode ser apenas transmissora de conteúdo: ela precisa ser promotora de dignidade, pertencimento e equidade.
Ao longo dos últimos anos, trabalhando com escolas de diferentes perfis, tenho observado um movimento crescente de instituições que desejam avançar nesse tema - e que, simultaneamente, revelam o tamanho dos desafios. Muitas escolas ainda reproduzem, sem perceber, materiais didáticos que reforçam estereótipos; não têm protocolos para lidar com casos de racismo; e contam com equipes pouco preparadas para acolher vítimas ou agir diante de conflitos raciais. Sem formação continuada e sem políticas claras, o racismo escolar se mantêm silencioso, naturalizado, frequentemente subnotificado.
É por isso que defendo uma abordagem estruturada. Diagnósticos de clima escolar, formação em letramento racial, revisão de acervos, criação de Comissões Antirracistas e protocolos de acolhimento são ferramentas fundamentais. Também é urgente ampliar a diversidade racial nos quadros de professores e gestores, criar programas de bolsas que considerem desigualdades de renda e território, e transformar o currículo para que estudantes negros se vejam representados não apenas como resistência, mas como produção intelectual, política e cultural.
Quando essas ações são implementadas, os resultados aparecem. Escolas registram diminuição de conflitos raciais, aumento da confiança dos estudantes na instituição e melhora significativa na autoestima de crianças e adolescentes negros. Professores passam a atuar como multiplicadores, questionando práticas e ampliando repertórios. E a comunidade escolar reconhece a escola como espaço de ética, futuro e justiça.
O grande obstáculo, no entanto, permanece: a resistência estrutural. A educação antirracista confronta privilégios, questiona narrativas históricas e exige coragem institucional. Em um país que insiste em sustentar o mito da democracia racial, ainda há quem veja esse debate como excessivo ou divisório. Não é. Pelo contrário: é o único caminho possível para oferecer uma educação de qualidade para todos.
Neste 20 de novembro, meu convite é direto: que as escolas parem de tratar a educação antirracista como um adendo e passem a colocá-la no centro do seu projeto pedagógico. Se queremos uma sociedade mais justa, precisamos começar pela sala de aula. E precisamos começar agora.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

