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Hélio Rocha

Repórter de meio ambiente e direitos sociais, colaborador do 247

119 artigos

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Educação (e ciências humanas) é prioridade na China

Enquanto o Brasil reduz investimentos em infraestrutura e, aberrantemente, ataca a educação pública e a previdência social, a China impulsiona ambos os setores num programa que vem sendo religiosamente seguido desde 1997

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Nas últimas duas semanas, dedicamos este espaço à discussão da politica de investimentos externos da China, sobretudo na criação de infraestruturas de logística, absorção de matérias-primas, estabelecimento de parques industriais e transferência de tecnologia em outros países, beneficiando o contato mútuo entre o gigante asiático e, sobretudo, os países subdesenvolvidos ou emergentes, a fim de constituir uma caminhada conjunta. Agora, porém, a proposta segue no campo dos investimentos, mas foca-se nas relações internas entre o Governo e o povo chinês.

O paralelo entre a China e o Brasil, neste aspecto, é diametralmente oposto e alarmante para o gigante do hemisfério sul. Enquanto o Brasil reduz investimentos em infraestrutura e, aberrantemente, ataca a educação pública e a previdência social, a China impulsiona ambos os setores num programa que vem sendo religiosamente seguido desde 1997, demonstrando que não há receita de austeridade que solucione crises econômicas, visto que o crescimento chinês não se interrompe desde que iniciou-se a nova diretriz social do Partido Comunista.

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Para debater o tema, portanto, é necessário entender que processo vem ocorrendo na segunda economia do mundo, desdobrando a discussão do último artigo, quando tratamos da organicidade do Governo chinês por meio do debate de ideias interno ao Partido Comunista, com o contraponto de outros sete partidos que compõem a Frente Unida. Este sistema multipartidário chinês será discutido mais tarde. Importa, agora, saber que esta mesma esponja de absorção de anseios populares que reverbera na Alta Câmara chinesa e faz o contrapeso ao poder do Comitê Central do Partido Comunista, o Politburo, e o atual presidente Xi Jinping, tem por consequências as mais diversas direções historicamente assumidas na política e na economia chinesas, entre elas a doutrina social e de serviços que está em prática hoje no país.

Se em 1978 o líder Deng Xiaoping conseguiu, após a afirmação da soberania nacional conduzida por Mao Tsé Tung, superar as doutrinas econômicas mal sucedidas de seu antecessor e construir a doutrina socialista de mercado, ou com característica chinesas, no princípio dos anos 1990 este modelo parecia esgotado. O sucesso de Deng em multiplicar a renda per capta da China, que passou de oito vezes inferior à da Argentina para uma das mais equalizadas do mundo (ao menos nos grandes centros chineses, ainda privilegiados ante os interiores rurais), mostrou perda de fôlego com a crise no socialismo do final dos anos 1980, que resvalou na China durante as manifestações de 1989, contornadas pelo Governo, mas que acenderam um sinal de alerta junto aos líderes da República Popular.

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Por isso, em 1997, no XV Congresso do Partido Comunista Chinês, as diretrizes deixaram de focar unicamente o fortalecimento econômico com a adaptação do socialismo chinês à economia de mercado, com forte apelo internacionalista, para um retorno ao interior do país e ao contato com sua população, a fim de garantir-lhe melhor qualidade de vida, não apenas acesso a bens materiais. O que deixou a desejar, diga-se, no próprio Governo do Partido dos Trabalhadores no Brasil. Por isso, há mais de vinte anos a China debruça-se em melhorar índices de educação, saúde e conservação do meio ambiente, sobretudo. De saúde e meio ambiente trataremos mais tarde. Hoje, é importante, sobretudo com a situação que se vive no Brasil, discutir como a potência do leste trata a educação pública.

Em primeiro lugar, educação pública é pleonasmo na China. Todas as instituições são geridas pelo Estado. Hoje em dia, o investimento em educação chinês gira em torno de 12% a 15% das despesas públicas nacionais, alto para os padrões mundiais. O presidente Xi Jinping investe, igualmente, na universalização do acesso chinês a idiomas estrangeiros, visto que a barreira linguística é um dos principais entraves à ampliação das relações internacionais e comerciais chinesas. Por outro lado, não submete o país à hegemonia britânica e norte-americana sobre a linguagem, propagada pelo poderio militar das duas grandes potências, respectivamente hegemônicas nos séculos XIX e XX, o que resulta ainda em monopólio da língua inglesa na mídia internacional. Ao contrário, na China prepare-se os jovens para dominar um idioma que mais lhes interesse, habilitando grandes frações do bilhão e meio de chineses a falar em cada idioma do mundo. Neste caso, o país vale-se de sua imensa população para traçar uma estratégia única de capilarização internacional. Uma das universidades que mais recebeu investimentos nos últimos vinte anos foi a Beijing Foreing Studies University, unicamente dedicada ao ensino de mais de 30 línguas estrangeiras, que vão do inglês ao persa, do espanhol ao croata, do português ao africâner.

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No último feriado do Dia Internacional do Trabalhador, que na China é celebrado em atividades cívicas que param o país por quatro dias, de 1o a 4 de maio, o presidente Xi Jinping pediu aos estudantes de seu país que revistam-se da missão de levar a China ao mundo, desenvolvendo suas capacidades sem perder a identidade nacional, utilizando suas competências para atuar internacionalmente não para o enfraquecimento de seus laços nacionais, mas como uma ferramenta de integração soberana da China ao mundo.

Recentemente, a China vem investindo em pesquisas as mais variadas, como já mostramos neste espaço com a iniciativa G60, que pretende estabelecer parques tecnológicos nos arredores de Shanghai, integrando nove municípios para a criação de um espaço propício para gerar novas tecnologias. Mas não para por aí. No campo das ciências humanas, por exemplo, os estudos confucionistas são a base do pensamento filosófico chinês, o qual o povo não abandona e, ademais, segue atualizando-o e rediscutindo-o para, igualmente, rever seu conceito de sociedade à luz de seu pensador basilar. Por isso, as metamorfoses do Partido Comunista e o sistema político diferente da democracia ocidental, porém orgânico e eficaz, discutidos ambos no artigo anterior, têm tamanha aceitação e compreensão pelos cidadãos. Neste caso, notabiliza-se o papel das ciências humanas no desenvolvimento de um país, conferindo à China a estabilidade política e a maturidade social que faltam hoje no Brasil.

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E não para por aí. Cultura também e alvo de investimentos pesados do Governo Xi, que, por exemplo, mantém disciplinas sobre cultivo do chá e suas propriedades benéficas à saúde e ao bem-estar. No Brasil, certamente o tema seria tratado como desperdício de dinheiro em prol de "pós-modernidades exotéricas de esquerdistas universitários que não têm mais o que fazer". Aqui, é valorização da cultura e, mais que isso, das populações e culturas interioranas que ainda são privadas do grande desenvolvimento da costa leste, mas que dos grotões da China impulsionam o crescimento do país com o trabalho no campo.

A pintura tradicional chinesa também tem seu lugar, mobilizando professores, alunos, mostras, publicações, materiais fartos para manutenção da cultura das artes plásticas em consonância com os cânones milenares da arte oriental. Daí, deriva-se também a preservação do patrimônio, escultura, festas tradicionais, gastronomia, dentre outros aspectos materiais e imateriais da cultura chinesa. Geografia? Uma praça inteira de Pequim é dedicada a um importante geólogo que deu contribuições para o desenvolvimento da China a partir da identificação de suas riquezas minerais. Se carece, comparado aos índices do ocidente, o debate sobre questões que nos são caras, como gênero e sexualidade, sobra afirmação da soberania.

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Isto posto, nota-se que o ensino de ciências humanas é assimilado na China como estratégico, sim, para a economia e o crescimento econômico chinês. É parte, inclusive, das diretrizes do XV Congresso do Partido Comunista, de 1997, que estabeleceu as metas do país para o século XXI. Afinal, deste campo do ensino e da pesquisa veio o elo entre o povo e suas tradições, que impediu a aculturação e vinculação ao capital global postulados pelas manifestações de 1989, que muito se assemelham ao nosso "pato amarelo". Portanto, o chamado à consciência crítica para valorização da cultura nacional, desde sua filosofia até sua arte, é pilar da estabilidade política e da unidade nacional, que têm consequências diretas na economia e na geração de riqueza e distribuição de renda. É possível que não vivêssemos no Brasil a crise que vivemos se tivéssemos investido mais em nossa identidade nacional, através das ciências humanas.

E só para constar: armas são proibidas na China para qualquer cidadão civil.

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