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Alberto Cantalice

Diretor da Fundação Perseu Abramo e membro da Direção do PT

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Eleições no PT: a disputa entre a política real e o ilusionismo de garganta

'É o único partido brasileiro a fazer um processo intrinsecamente democrático', escreve o colunista Alberto Cantalice

Membros do PT (Foto: Agência PT/Paulo Pinto )

O Partido dos Trabalhadores realizará no próximo dia 6 de julho suas eleições internas para a composição de suas direções zonais, municipais, estaduais e nacional. É o único partido brasileiro a realizar um processo intrinsecamente democrático, em que o filiado vota em todas as posições em disputa. Sem filtros.

Serão eleitos ainda os delegados e delegadas ao Encontro Nacional do Partido que aprovarão o esboço tático com vistas ao processo eleitoral de 2026.

Partido de massas, com mais de três milhões de filiados, o PT encontra-se espalhado por quase todos os recantos do país e com uma presença sólida nos territórios populares. Crítico do capitalismo e ainda mais de suas vertentes neo e ultraliberais, o PT recorrentemente se debate entre o seu compromisso histórico com a construção de uma sociedade mais generosa: o Socialismo Democrático, e, os compromissos com a governança em um país capitalista.

Essa ambivalência entre desejo e realidade às vezes se confundem- principalmente em períodos de disputas internas - entre o real e o imaginário, trazendo para os debates internos o uso da retórica em detrimento da política real.

Um desses ilusionismos é a chamada “viragem à esquerda” da linha política do Partido. Pregação que apesar de demonstrar-se com potencial de sensibilização, serve em grande medida para ganhar votos dos adeptos de um “retorno às origens”, como se a realidade brasileira de 2025, pudesse se ombrear com as jornadas históricas de 1978/1980. Fazendo pela lógica do desejo a roda da história retroagir. O que é impossível.

Ao transmudar-se de Partido de contestação da ordem para um Partido de governo, as contradições do fazer política resolvendo as sucessivas demandas da população se contrastaram entre o devir da utopia e a premência da necessidade imediata.

Ao ter que construir maiorias para a aprovação de propostas vitais em seus governos tiveram os petistas que era relacionar com a dura realidade do patrimonialismo brasileiro, já de muito ilustrada nas páginas do Os Donos do Poder, de Raymundo Faoro - e que tem sua face mais objetiva nas casas parlamentares da República.

A emergência do bonapartismo bolsonarista fator de coesão da velha direita reacionária, da família militar e de elementos protofascistas, facilitada pela razia promovida pela malfadada operação lava jato, fissurou o tecido social do país e feriu de morte o PT ao depor a Dilma, prender o Lula e criminalizar o Partido.

Essa hecatombe midiático-judicial fez com que a agremiação passasse praticamente sete anos no modo defensivo. No que mais uma vez exigiu que a força de sua militância soerguesse o Partido e mais uma vez pela compreensão da maioria do PT, desse a Lula a condição de construir uma ampla aliança e derrotasse o bolsonarismo. A compreensão da nova realidade posta é que possibilitou a atração de Geraldo Alckmin para ocupar a vice-presidência, fez com que o PDT e Simone Tebet aderissem no segundo turno de 2022, e possibilitaram a vitória de Lula.

Se dependesse da retórica de alguns dirigentes petistas, a aliança seria nós com nós mesmos. Facilitando a consolidação da vitória de Bolsonaro e a implantação do autoritarismo como modo de governo.

A mesma cantilena volta agora. Chegaram a insinuar que os setores majoritários do PT queriam levar o Partido para o centro. Uma mentira. O que esses setores advogam é uma aliança esquerda-centro, que seja capaz de operar algumas transformações no país e possa servir de anteparo à volta da extrema direita.

O que está em jogo nessa disputa interna do Partido dos Trabalhadores, é: queremos continuar agindo como um instrumento efetivo das demandas populares? Queremos continuar construindo um horizonte de democracia substantiva e inclusiva para as maiorias? Queremos dar voz a quem não tem voz e ser por eles reconhecidos como construtores de seus interesses concretos?

Ou voltaremos a ser meros questionadores do sistema de poder com a força da garganta e sem a força do Estado?

Ficaremos isolados no espectro político e sem poder agir como um agente coletivo da transformação social cujo papel no comando do executivo federal é preponderante?

Com a palavra as filiadas e os filiados do PT no dia 06 de julho de 2025.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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