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Clóvis Girardi

Bacharel em Ciências e Humanidades e Planejador Territorial

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Engole essa: O que o agronegócio não quer que você saiba sobre o MST

(Foto: Ueslei Marcelino/Reuters)
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Em colaboração com Paulo Marinho

A semana passada foi marcada pela instauração da ‘CPI do MST’, que teve suas primeiras reuniões marcadas por disputas de narrativas, mentiras, desinformação e, em grande medida, por demonstrar que a disputa pela terra segue a maior de toda a história do Brasil. 

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Com o intuito de investigar ”invasões” promovidas pelo MST e suas fontes de financiamento, a CPI já teve seu início conturbado, afinal o presidente - deputado Tenente Coronel Zucco - é investigado pela Polícia Federal por envolvimento nos atos golpistas de 8 de janeiro deste ano e o relator, Ricardo Salles, ex-ministro do Meio Ambiente do governo Bolsonaro, apresentou um Plano de Trabalho que é praticamente um relatório de culpabilidade, deixando evidente que o objetivo central é seguir com a estratégia bolsonarista de geração de caos e, principalmente, de tentar criar uma narrativa de criminalização da atuação do movimento na luta pela reforma agrária.

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, ou, se preferir, MST. É preciso admitir que para parte do imaginário popular brasileiro essa sequência de letras é indigesta. No entanto, propomos mastigar e ingerir com calma, afinal, digerir agricultura familiar é melhor e mais saudável do que engolir e digerir o chamado "Agro-pop".

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Desde as capitanias hereditárias, a distribuição da terra no Brasil é extremamente desigual. Poucos com muito, e muitos com pouco – ou, na maioria dos casos, muitos sem nada. É assim nos grandes centros urbanos e também nas áreas rurais do país. Os que controlam as terras também controlam a riqueza e detém o poder necessário para construir e consolidar narrativas. Assim construíram por décadas a imagem do MST como “invasores de terra” ou “bandidos do solo”, num movimento coordenado de desinformação. É importante lembrar que a Constituição Federal de 1988 prevê que a terra deve cumprir sua função social e de bem-estar coletivo, e as ocupações são legitimadas em terras improdutivas como forma de denunciar latifúndios que por muitas vezes estão irregulares. 

É bem verdade, também, que nas últimas décadas - sobretudo após o primeiro governo Lula - essas narrativas promovidas e elaboradas pelas empresas que comandam o agronegócio e os maiores conglomerados midiáticos brasileiros começaram a ser questionadas, tendo um de seus principais momentos em meados de 2020, durante a pandemia de COVID-19, quando os agricultores sob a bandeira do MST distribuíram toneladas sua produção para pessoas em situação de vulnerabilidade social. Isso resultou, inclusive, em um aumento nas pesquisas sobre agricultura familiar e na desmistificação do movimento, contribuindo para combater a desinformação. 

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Atualmente, o MST não tem representação em três estados (Acre, Amazonas e Amapá), mas está presente no restante do país, com aproximadamente 350 mil famílias em assentamentos produtivos, 100 cooperativas e 96 agroindústrias. Além disso, é responsável pela maior parte da produção de alimentos orgânicos do país.

Se os editoriais enviesados fossem digeridos adequadamente, em um cenário com o oligopólio midiático comprometido com a informação verdadeira, a distribuição de conhecimento para o corpo social seria nutritiva e de qualidade. Como resultado direto, você saberia, por exemplo, que 49% dos agrotóxicos brasileiros são extremamente perigosos e que comprar do pequeno agricultor é mais barato e oferece uma variedade maior de produtos. Nos últimos 11 anos, inclusive, a agricultura familiar vem diminuindo drasticamente o uso de agrotóxicos. Além disso, é importante destacar que os assentamentos de terras não estão à margem da Lei, e os passos legais são conduzidos por um órgão governamental, o INCRA. O "Agro-pop" está mais interessado no mercado externo do que no abastecimento do mercado interno, e a fome ainda é uma consequência da luta pela terra.

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A agenda internacional do presidente Lula nesse início de terceiro mandato vai muito no sentido de garantir investimentos estrangeiros voltados à sustentabilidade, às mudanças climáticas e, fundamentalmente, à erradicação da pobreza. Assim, nos próximos anos, é necessário que estes investimentos sejam também direcionados à agricultura familiar e à distribuição da terra para seu uso produtivo sustentável – algo que o “Agro-pop” brasileiro, até agora, não tem oferecido. 

É imprescindível, também, que sejam direcionados para informar e educar a população, para que o imaginário popular construa uma imagem do agronegócio não como um homem de meia idade com chapéu e espingarda, mas sim como holdings com muito capital, marketing e de grandes intervenções territoriais. É importante também que o pequeno trabalhador da terra não seja encarado como um criminoso, mas como alguém que luta para que a Constituição seja cumprida. 

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Nesse sentido, inclusive, é fundamental lembrar: o campo e a cidade estão cada dia mais próximos. Tendemos a pensar que as áreas de atuação do MST são algo distante do perímetro urbano, principalmente para aqueles que residem nas capitais, recebem informações via rede social ou esperam o horário nobre da TV brasileira. A luta pela terra é simbiótica com a luta por moradia e qualidade de vida nas cidades, havendo um extenso apoio a outros movimentos que estão na cena urbana, como o MTST (Movimento dos Trabalhadores sem Teto), ou o MSTU (Movimento dos Trabalhadores Sem Terra Urbano). O diálogo com essas outras frentes denota que a questão do campo é central, porém a conexão com o periurbano, o rural metropolitano e outros modos de urbanidade é uma unidade fundamental. No campo ou na cidade, disputa pela terra segue firme como a principal disputa brasileira.

O contexto é complexo, o caldo é grosso, e envolve mortes de líderes ambientais, trâmites políticos, debates sociais e uma reforma agrária atrasada, mas devemos mudar os ingredientes. Em vez de "invasor", usemos "cidadão"; em vez de "invasão", falemos em "ocupação"; em vez de "defensivos agrícolas", chamemos de "agrotóxicos"; e ao tratar os grupos que se comportam como castas como "corjas responsáveis por latifúndios devedores, grilados e improdutivos", o caldo fica melhor.

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