Enquanto o Rio está em guerra, Gaza continua em chamas
Gaza é manchete global. O Rio também. Mas por motivos diferentes. Lá, chamam de conflito. No Brasil, de operação
Dizem que o Rio de Janeiro vive dias de guerra. E não é metáfora. É tanta sirene. É tanto helicóptero. É tanta gente correndo pra se proteger do próprio Estado. Sessenta e quatro vidas ceifadas e famílias mais uma vez destruídas. E agora o mundo inteiro vê. Falam do Rio em espanhol, em inglês, em francês, em alemão. Nas manchetes dos jornais. Nos comentários apressados algumas mentiras e outras verdades. E Brasil, outra vez, vira o centro do caos urbano. E, ainda assim, segue sobrevivendo como se nada estivesse acontecendo.
Mas enquanto isso, Gaza continua em chamas. Mesmo depois do acordo com aquele teatro político entre Trump, Netanyahu e o Hamas. Troca de corpos, devolução de reféns, fotos com sorrisos forçados. E, nos dias seguintes, os bombardeios voltam. Cento e quatro mortos em um único dia. Quarenta e seis crianças. A defesa civil procura corpos novamente. Ainda estão sem energia. Sem anestesia. Não deu tempo de parar de chorar e tudo começou outra vez.
Eles lá, e nós aqui. Ruínas diferentes. Lá, ruínas de concreto. Aqui, ruínas de confiança. No Rio, há bairros inteiros que parecem territórios ocupados. As operações entraram de madrugada, e se tiver sorte saem ao meio-dia. E o que sobra são paredes furadas, vidas interrompidas. Muitas famílias em luto. Em Gaza ou Rio, o nome muda, mas o som é o mesmo. O estampido. Não interessa se é bomba ou uma bala de fuzil. O choro vem e o silêncio do depois é apenas uma ilusão.
Não se trata de comparar tragédias. Cada uma tem sua história, sua geopolítica, seus culpados. Mas há algo em comum, algo insuportável. A naturalização da morte. A ideia de que há lugares do mundo onde matar virou rotina. Gaza e o Rio se encontram aí. Nessa trágica repetição, na falta de espanto que loga vai virar notícias esquecida com os novos mortos que virão. E os mortos sempre voltam.
Talvez a diferença das duas estejam apenas na escala. Gaza é manchete global. O Rio também. Mas por motivos diferentes. Lá, chamam de conflito. No Brasil, de operação. O nome pode até mudar, mas a dor, essa não. E no fim, o que fica é a pergunta que nenhum acordo resolve. Até quando o poder vai fingir que a violência é solução? Até quando os vivos vão aceitar que a paz é sempre adiada… adiada… adiada…
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.




