Entre vidas e mortes: a crise na gestão de saúde do Rio de Janeiro na pandemia
A ineficiência dos governos causa sofrimento diário em nosso povo. A cada vida que perdemos abandonada pelo estado temos uma família destroçada pelo luto. Até quando?
No início deste ano quem poderia imaginar que veríamos espaços que abrigam grandes espetáculos como eventos esportivos, shows e convenções tornarem-se hospitais de campanha. A rápida disseminação do coronavírus aumentou exponencialmente a necessidade de leitos, causando a sobrecarga e o colapso de vários sistemas de saúde do mundo. Até mesmo o Reino Unido, com o mais avançado dos modelos, o National Health Service (NHS), sofreu as consequências da anormalidade sanitária.
Aqui no Brasil, o nosso Sistema Único de Saúde (SUS) enfrentava muitos problemas antes mesmo da pandemia. Quando os casos de COVID-19 se acentuaram, nossa estrutura mostrou fragilidades rapidamente e a construção de hospitais provisórios parecia ser uma solução viável, inclusive recomendada pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Mas a incompetência política e administrativa tem impedido o sucesso dessa estratégia. Em várias cidades brasileiras, saltam denúncias de desvio de verbas, materiais superfaturados e falhas logísticas grosseiras. O drama atinge em cheio o Rio de Janeiro, que soma mais de 4 mil óbitos em todo estado.
As mortes se acumulam e a falta de leitos persiste: já são 24 dias de atraso na construção dos hospitais de emergência prometidos pelo governador Wilson Witzel. É esperada a liberação de 1800 leitos, mas até agora só o hospital do Maracanã funciona parcialmente, com 107 pacientes internados e 35 leitos de UTI. Também é ineficiente a gestão da crise feita pelo prefeito Marcelo Crivella – dos 500 leitos que estariam disponíveis no Hospital do Riocentro, apenas 100 estão em operação, 80 de clínica média e 20 de UTI. Enquanto governador e prefeito gastam desenfreadamente tentando ampliar o atendimento, parecem ter esquecido que o município do Rio possui 1.840 leitos públicos fechados por falta de equipes médicas. Nos últimos três anos, cerca de mil médicos deixaram a rede de saúde pública carioca.
Faltam leitos, sobram denúncias. No dia 7 de maio de 2020, o ex-subsecretário-executivo da saúde do estado, Gabriell Neves, foi preso acusado de assinar contratos suspeitos no valor de quase 1 bilhão de reais com a Organização Social (OS) Instituto de Atenção Básica Avançada à Saúde (IABAS), o mesmo instituto investigado na gestão do ex-prefeito Eduardo Paes por ser beneficiário de contrato fraudulento no valor de quase 188,7 milhões de reais. O IABAS seria responsável pela entrega de insumos médicos e a montagem dos hospitais de campanha. Exonerado por Witzel em 7 de abril, Neves foi substituído por Gustavo Borges da Silva, que também foi preso na mesma operação, acusado de obter vantagem na compra de respiradores destinados a atender pacientes da COVID-19.
Hoje pela manhã, acordamos com a notícia de que o próprio governador foi alvo de busca e apreensão da Policia Federal no Palácio das Laranjeiras, no âmbito da operação placebo, que investiga indícios de desvios de recursos públicos destinados ao enfrentamento da pandemia. Os mandatos de busca e apreensão foram expedidos pelo ministro Benedito Gonçalves, do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Infelizmente, estamos acompanhando a mesma cena de anos anteriores: policiais entrando e saindo da sede do governo do estado com supostas provas criminais.
A ineficiência dos governos causa sofrimento diário em nosso povo. São mais de 400 pacientes no estado em busca de um leito de internação. Muitos não resistem nessa espera dolorosa. É o caso do técnico de enfermagem Alan Patrick do Nascimento, que faleceu aos 38 anos enquanto aguardava um leito na cidade do Rio de Janeiro. O mesmo ocorreu com Fred Gusmão, de 53 anos, que, mesmo com um plano médico, não teve uma vaga garantida na UTI. A cada vida que perdemos abandonada pelo estado temos uma família destroçada pelo luto. Até quando?
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

