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Marcelo Auler

Marcelo Auler, 68 anos, é repórter desde janeiro de 1974 tendo atuado, no Rio, São Paulo e Brasília, em quase todos os principais jornais do país, assim como revistas e na imprensa alternativa.

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Estado mínimo: cobertor mais curto para coronavírus

"A política neoliberal do Estado Mínimo, adotada a partir de 2016 no governo de Michel Temer e que o desgoverno de Jair Bolsonaro continua abraçando, via o ministro da Economia Paulo Guedes, nos causará problemas bem maiores", diz Marcelo Auler, do Jornalistas pela Democracia, sobre a crise do coronavírus no País

(Foto: Marcos Corrêa/PR | ABr)
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Por Marcelo Auler, em seu blog e para o Jornalistas pela Democracia

Em condições normais de pressão e temperatura, a crise provocada pelo coronavirus provoca dificuldades em qualquer sistema de saúde pública. No Brasil tais dificuldades tendem a aumentar, apesar de termos o Sistema Unificado de Saúde – SUS, que em muito nos ajudará.

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A política neoliberal do Estado Mínimo, adotada a partir de 2016 no governo de Michel Temer e que o desgoverno de Jair Bolsonaro continua abraçando, via o ministro da Economia Paulo Guedes, nos causará problemas bem maiores.

Na cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, na expectativa de atender às futuras vítimas do coronavírus, as autoridades da saúde programam suspender diversos atendimentos médicos essenciais – como hemodiálises e transplantes renais – que funcionam, de forma já precária, no Hospital Federal de Bonsucesso (HFB), no Rio de Janeiro. Ou seja, com um cobertor curto, o estado corre o risco de, ao tentar salvar pacientes da pandemia, deixar ao desabrigo outros doentes crônicos.

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É verdade que esta “escolha de Sofia” também ocorreu em outros países, como a China e a Itália. Vítimas mais idosas deixaram de ser atendidas, dando as vagas nos leitos de UTIs para os mais novos. Mas a situação brasileira agrava-se pelo descaso a que foi relegada a saúde pública nos últimos anos.

Bem próximo do Hospital Federal de Bonsucesso está, por exemplo, o Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, da UFRJ, na ilha do Fundão. Ele já vem sendo preparado para atender nessa crise de coronavírus. Muito embora ainda precise também de investimentos para ampliação do número de leitos. Não é o único caso na região de hospital com capacidade ociosa, por falta de investimentos.

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Como bem lembrou Helena Chagas, em artigo nos sites Divergentes e Brasil 247Vírus rico e vírus pobre – nada será como antes – “Se há alguma coisa que o coronavírus parece estar ensinando ao mundo é que o Estado é mais necessário do que muita gente pensava”. Necessário e essencial, desde que funcione a contento. O que já não ocorre entre nós há algum tempo. Por isso, agora, na crise, o prejuízo tende a ser muito maior.

A situação dos hospitais federais do Rio, entre os quais o de Bonsucesso sempre teve posição de destaque, reflete a devastação clara que a política neoliberal provocou na saúde pública. Afinal, estes mesmos hospitais federais, até dezembro de 2017, davam cobertura a 70% da população da cidade do Rio de Janeiro, segundo consta de documento assinado por dez entidades sindicais de trabalhadores no sistema de saúde em geral.

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Trata-se da mesma política que o ministro da Economia, Paulo Guedes, insiste em enfatizar ao, em pleno início de uma crise sem precedente, defender suas pretensas reformas para reduzir o tamanho do estado. O que soa basicamente até como uma espécie de chantagem.

De 2017 para cá, estes hospitais sofreram constantes perdas de profissionais provocadas pela corrida à aposentadoria. Consequência direta do anúncio de outra reforma neoliberal, a da Previdência. Tentada no governo de Michel Temer e executada em 2019, já sob a gestão de Jair Bolsonaro e Paulo Guedes, sem levar em conta os interesses dos trabalhadores.

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Foram profissionais que saíram sem serem substituídos. Ainda de acordo com a cartilha neoliberal, em nome do corte de despesas do governo, a bandeira do estado mínimo prevaleceu. Deixaram de convocar os concursos necessários para o preenchimento das vagas abertas.

“O HFB e os demais hospitais da rede federal do Rio estão há anos judicializados devido à falta de recursos humanos suficiente sequer para o funcionamento normal”, lembra Carlos Vasconcellos, diretor do Sindicato dos Médicos do Rio de Janeiro.

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O preenchimento de vagas em aberto vem sendo pleiteado inclusive por meio de Ações Civis Públicas. Foram iniciativas do Ministério Público Federal, no Rio. Visam o preenchimento dos cargos existentes apenas para o funcionamento normal do hospital, com seus atendimentos especializados. Não previam, como não poderia ser, a criação de outro serviço, como o que se impõe com a crise do coronavírus.

Mesmo com um quadro de pessoal incompleto na rede federal do Rio, no último dia 15, Marcelo Lambert, diretor de Programa do Ministério da Saúde, no Rio, anunciou o fechamento de um pavilhão inteiro do HFB, onde ocorrem atendimentos especializados importantes, para destiná-lo ao atendimento exclusivo de pacientes com coronavírus.

Neste Pavilhão, segundo descrição feita em ofício assinado pelo secretário geral do Sindicato dos Trabalhadores no Combate às Endemias e Saúde Preventiva no Estado do Rio de Janeiro (SINTSAÚDE-RJ),  Sandro Alex de Oliveira Cezar (íntegra abaixo), funcionam serviços importantes que deixarão de ser prestado, tais como: Nefrologia Clínica; Transplante Renal; Hemodiálise; Diálises Peritoneal e Pediátrica; CTI; Cirurgia Vascular; Ortopedia; Clínica Médica; Pneumologia; Hematologia; Endocrinologia; Endoscopia Digestiva; Unidade Coronariana; Eletrocardiograma; Ecocardiograma adulto e pediátrico; Cirurgia Torácica; Cirurgia Cardíaca; Serviço de Cabeça e Pescoço; Urologia; Neurocirurgia; Otorrinolaringologia e Oftalmologia.

O ofício do SINTSAÚDE-RJ é dirigido à Procuradoria da República no Rio, pedindo providências para que não fechem “nenhuma unidade de saúde no Estado do Rio de Janeiro, em especial no caso do Hospital Federal de Bonsucesso”. Defende que “a União possa, de imediato e com a urgência que o tema requer, tomar providências para recompor a força de trabalho dos hospitais federais”. Também requer que se “possibilite a abertura de novos leitos e que, supletivamente, se for necessário lance mão de leitos da rede privada de saúde, nos exatos termos da portaria que regulamenta as ações de enfrentamento da Doença do COVID 19”.

Comunidades cobram

“Eles desmontam um hospital referência de atendimento no subúrbio e depois, onde ficam esses doentes de outras moléstias e traumas?”, questiona João Ricardo de Mattos Serafim, presidente da Associação de Moradores de Vigário Geral, comunidade onde residem cerca de 45 mil pessoas. Não é a única na região. Antes pelo contrário, são muitas comunidades no entorno do HFB.

Na Região há outros hospitais, mas eles também são vítimas do descaso com a saúde pública. O também tradicional Hospital Estadual Getúlio Vargas, no bairro da Penha, como lembra Serafim, hoje é “um hospital de funcionamento precário com número reduzido de atendimento e emergências, pois foi um que mais sofreu com os cortes de verbas e funcionários. É estadual e funciona com funcionários terceirizados que sofrem com atrasos de salários e falta de insumos para trabalharem”.

O presidente da Associação de Moradores lembra que um outro hospital federal, o Francisca Souza Telles, em Irajá, também atendia àquela região que é uma das áreas mais sobrecarregadas, pois abriga as rodovias mais movimentadas como as Linhas Vermelha e Amarela, a Avenida Brasil e a Rodovia Presidente Dutra. O hospital Francisca de Souza Telles, porém, mesmo com emergência, “funciona precariamente, com fechamento constante por superlotação. Por isso, o hospital de Bonsucesso ainda é o local confiável a nível de emergência e de outros procedimentos”, conclui Serafim.

O quadro de desleixo na saúde pública daquela região é consequência da política de Estado Mínimo. Estruturas bem montadas – ainda que antigas – estão sendo subaproveitadas ou quase estão desativadas por falta de pessoal. Na crise do coronavírus, isto sobressai, na medida em que faltarão leitos e profissionais de saúde para o crescimento da demanda, que já não é pequena por ali.

Como o cobertor é curto, as autoridades agora terão que fazer a chamada “escolha de Sofia” diante do crescimento da procura. Mas o problema seria minorado se criminosamente não tivessem deixado a situação chegar onde chegou. Com quadro de servidores incompleto, em nome da redução dos gastos públicos.

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