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Leopoldo Vieira

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EUA, 2016: House of hope

Historicamente se diz que o PSDB tem relações privilegiadas com o Partido Democrata. Pois é hora de mudar isso à luz das mudanças de consciência pelas quais os EUA passam hoje

21/03/2016 - Havana, Cuba - Llegada al Palacio de la Revolución del presidente de los Estados Unidos, Barack Obama. Llegada al Palacio de la Revolución del presidente de los Estados Unidos, Barack Obama. 21/03/2016 (Foto: Leopoldo Vieira)

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Barack Obama, o primeiro negro a presidir os Estados Unidos, acusado de ser comunista nas eleições de 2008 e 2012, aterrissou em Cuba, após 88 anos em que um chefe de Estado americano não o fazia e após mais de meio século de hostilidades.

Os Estados Unidos não são homogêneos, assim como o Brasil. Considerá-los um bloco coeso é um erro tão crasso quanto se o Paraguai tomasse o Brasil, a Argentina e o Uruguai desta maneira por causa da guerra da Tríplice Aliança, que dizimou quase toda a população masculina do país e, literalmente, bombardeou o embrião de industrialização que ali se desenvolvia.

E mesmo num governo progressista é claro que há contradições.

Isso conhecemos bem por aqui.

O escândalo da Wikileaks é um caso. Porém, com todas as controvérsias da espionagem da NSA (Agência de Segurança Nacional) e as reações oficiais em relação à Assange, Snowden e Manning, ele revelou ao mundo as entranhas da autonomia política das corporações militares e o lobby poderoso do poder econômico. Obama fez questão de desculpar-se, por exemplo, com o Brasil.

Há a Aliança do Pacífico e, agora, o Tratado Transpacífico (TPP), mas o Chile governado pelos socialistas participa da Aliança do Pacífico e assinou o TPP. O Uruguai, então governado por Pepe Mujica, cogitou aderir ao TISA (Comércio de Acordo de Serviços). O comunista Vietnã aderiu ao TPP. Vladimir Putin, tão festejado em alguns meios por apoiar interesses geopolíticos opostos aos dos EUA, ainda está a hostilizar a população LGBT na Rússia.

No seu último Discurso do Estado da União, além do que já foi tratado no artigo "How I met Bernie Sanders", o presidente americano lançou quatro desafios para o futuro de seu País, que dizem muito ao mundo e à América Latina: 1) "Em primeiro lugar, como darmos a todos uma chance justa de alcançar oportunidades e segurança nesta nova economia?"; 2) "Em segundo, como fazer a tecnologia trabalhar a nosso favor, e não contra nós, especialmente quando se trata de resolver desafios urgentes como as mudanças climáticas?"; 3) "Em terceiro lugar, como podemos manter a América em segurança e liderar o mundo sem nos tornarmos sua polícia?"; e 4) "E, finalmente, como podemos fazer nossa política refletir o que temos de melhor, e não o que temos de pior?".

Regra geral, os governos progressistas latino-americanos têm como marca terem avançado em combinar crescimento econômico, promoção de direitos, diálogo social, políticas sociais inclusivas, que se desdobraram em redução das desigualdades. Isto guarda enorme convergência com a nova síntese programática gestada atualmente no Partido Democrata e com as questões lançadas por Obama.

Ademais, neste momento, o modelo destes governos precisa se reinventar para se aprimorar, pois começa a se firmar um cenário em os países enfrentam restrições fiscais, desaceleração econômica, polarização política que muitas vezes extrapola o bom senso democrático. Nisso, o diálogo com os EUA, após mais de uma década de acúmulo de forças, poderia ser estratégico. A bem da verdade, os EUA ainda devem à América Latina um programa de parcerias econômicas e sociais de igual para igual, voltado ao desenvolvimento, que poderia ajudar a superar os impasses atuais dos governos progressistas.

Por outro lado, se conseguir vencer as eleições americanas, os Democratas também precisarão de suporte internacional para aplicar sua agenda progressista e a América Latina pode ter um papel importante, até para não ser o tema onde os Democratas terão que fazer concessões aos setores mais conservadores da sociedade.

Em escala mundial uma polarização vai se estabelecendo.

De um lado, crescem as forças que fomentam um estado tecnocrático, redutor de direitos civis, contrário aos imigrantes, a favor da desregulamentação da economia, dos ajustes recessivos com foco nos trabalhadores e mais pobres, redução do papel do estado, permeável à ascensão dos fundamentalismos religiosos ocidentais, entusiasta das guerras. De outro, os que desejam que a economia produza distribuição de renda, mais direitos, proteção social, empregos, infraestrutura, soluções diplomáticas, transparência e diálogo social.

A ação internacionalista tem que ser para fortalecer o segundo pólo, unindo os progressistas de todo o mundo, capaz de arrastar aliados para transformações que não se reduzam a sonhar com uma nova Guerra Fria e não permita que o mundo sucumba a um cenário de ascensão de forças conservadoras como nos anos 1930 e 1940. Munidos com a agenda progressista, este é o campo que deve encontrar soluções para o mundo, para as regiões e, mutuamente, para os impasses de cada país, com todas as divergências existentes.

Pelo que se vê, a presidenta Dilma foi correta em sua visita recente aos EUA, quando recebeu o apoio de Obama contra a hostilidade da repórter da Rede Globo sobre ser o nosso país uma potência regional ou mundial, quando o mandatário americano a telefonou para agradecer, nas palavras dele, a parceria imprescindível entre Brasil e EUA para o acordo de Paris na COP 21. Assim como a recente declaração do ex-presidente Bill Clinton aos industriais brasileiros, em encontro da Confederação Nacional da Indústria (CNI), segundo a qual o Brasil está longe do abismo e é um lugar cheio de oportunidade para investidores. Clinton também elogiou os programas sociais como parte da causa de sua afirmação.

O Brasil pode e deve cumprir um papel muito mais profundo do que a agenda oficial de governo. O PT do Bolsa-Família mundialmente reconhecido, da exclusão do Mapa da Fome da ONU, do Minha Casa Minha Vida, do crescimento combinado com distribuição de renda, das bases sindicais, LGBTs, feministas, anti-racistas tem muito a construir com este Partido Democrata que brota das contradições americanas do século XXI.

O PSDB, de sua primeira passagem ao campo neoliberal na economia, quando adotou a defesa das privatizações, redução do emprego para conter a inflação, congelamento de salários, redução do Estado para prestar serviços públicos, reforma trabalhista regressiva aos direitos inscritos desde os anos 1930 na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), agora aderiu à criminalização das mulheres que abortam, resiste aos avanços quanto à criminalização homofobia e proteção dos direitos LGBTs, opõe-se às cotas sociais e raciais nas universidades, prega a redução da maioridade penal, tem lideranças disseminando o ódio aos cidadãos das regiões mais empobrecidas, endossa a intolerância religiosa, o 'justiçamento' de pobres infratores por fora do sistema penal, entre outras pautas que mais se assemelham ao conservadorismo Republicano dos EUA do que a qualquer vestígio social-democrata.

Historicamente se diz que o PSDB tem relações privilegiadas com o Partido Democrata. Pois é hora de mudar isso à luz das mudanças de consciência pelas quais os EUA passam hoje.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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