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Juca Ferreira

Sociólogo, ministro da Cultura

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Extrema-direita tenta destruir cultura para fazer do Brasil uma não-nação

"O Brasil está experimentando a forma como os golpes de Estado estão sendo produzidos nos dias de hoje", escreve o sociólogo e ex-ministro

Bolsonaro e ato golpista (Foto: Marcos Corrêa /PR | Alan Santos/PR)
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Por Juca Ferreira

(Publicado Originalmente no Diálogos do Sul)

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A crise atual

O Brasil está vivendo um momento tenebroso da sua história. Para onde se olhe é destruição, sofrimento, crise, retrocesso e agravamento dos problemas estruturais da sociedade. 

O país está sendo vítima de uma pilhagem e de um parasitismo grosseiro da parte das elites econômicas. Os ativos econômicos do povo brasileiro estão sendo vendidos por valores aviltados como, por exemplo, as reservas de petróleo do Pré-Sal, as empresas públicas etc... 

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Estão pondo abaixo e abastardando o Estado nacional e suas instituições, causando a perda de diversas políticas públicas bem sucedidas e com resultados positivos na vida dos brasileiros e brasileiras. 

Ataques constantes a direitos sociais reconhecidos e institucionalizados, aumento vertiginoso da destruição do meio ambiente, das nossas florestas, da Amazônia, do Pantanal... a tolerância com o monopólio da água pelo agronegócio, deixando, em várias regiões do país, muitas populações rurais e do interior sem acesso satisfatório a esse bem imprescindível para a vida. Contaminação acelerada do meio ambiente, das pessoas e dos rios, por uso indiscriminado de agrotóxicos e mineração com uso de mercúrio.

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Guerra híbrida

O Brasil está experimentando a forma como os golpes de Estado estão sendo produzidos nos dias de hoje. Chamam de guerra híbrida, lawfare, crimes contra o país, contra o povo e a democracia, praticados nas brechas da lei. Os militares não aparecem como os responsáveis pelo processo antidemocrático, apesar de ocuparem mais de oito mil cargos no atual governo. Mais do que na época da ditadura militar. 

Essa dolorosa experiência política vem provocando grandes sofrimentos para todo o povo brasileiro. A fome, que tinha sido extirpada da realidade brasileira, voltou e hoje milhões de famílias estão passando fome. Muitas estão sem trabalho e vivendo na miséria, morando nas ruas.

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Pesquisa de 2020, apontou 19 milhões de pessoas em situação de insegurança alimentar grave (fome) e, ao todo, 117 milhões em diferentes tipos de insegurança alimentar (55,2% dos brasileiros). O Datafolha divulgou pesquisa recente com 25% das famílias em situação de fome. 

A tragédia da pandemia no Brasil, com o escandaloso número dos mortos e contaminados, é resultado trágico do negacionismo contra o conhecimento e a ciência.  

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A cultura, a ciência, o conhecimento, a razão, a inteligência e a criatividade estão entre as vítimas de um fundamentalismo obscurantista pregado por neoliberais autoritários e mercadores da fé, com a participação ativa do atual governo. 

Declaração de guerra    

Bolsonaro e o Governo Federal declararam guerra à cultura e às artes e estão destruindo a estrutura pública construída no decorrer da nossa história para apoiar e incentivar o desenvolvimento cultural do país. 

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Estão inviabilizando as instituições da cultura, as políticas, programas e os serviços públicos, incluindo o sistema de fomento e financiamento da cultura e das artes. 

Estão se utilizando de ameaças e da intimidação de artistas, intelectuais e criadores para tentar restabelecer a censura e reprimir o protagonismo cultural da sociedade. 

A ruptura do processo democrático sem fundamento legal, através do impeachment da presidenta Dilma, começou a ser urdido já em 2003, quando Lula foi eleito pela primeira vez. O golpe contou com o apoio da grande mídia, manipulando a opinião pública, com a cumplicidade dos partidos de direita e centro-direita e com a participação da Justiça e de outras instituições que, paradoxalmente, são responsáveis pela defesa e pelo bom funcionamento da República.  

As limitações cognitivas da classe média e a ignorância e o primarismo político de parcelas da nossa população permitiram que os golpistas realizassem os seus objetivos de curto prazo: afastar a presidenta Dilma, demonizar e prender Lula para tirá-lo da disputa eleitoral e eleger Bolsonaro, um néscio disposto a fazer o trabalho sujo.

 Guerra cultural e disputa de valores

Os neoliberais e toda a direita, querem fazer do Brasil um país sem soberania, atrelado à geopolítica norte americana e aos interesses do capital financeiro global e submetido à usura e à mesquinhez histórica das nossas elites. 

Um país sem direitos, sem cidadania, sem o mínimo de distribuição da riqueza produzida, sem cultura, sem ciência, sem o exercício da crítica, sem democracia, funcionando como um simples entreposto comercial ou como uma grande fazenda. 

Não é por acaso que a barbárie direitista vem atacando a cultura e o conhecimento.  

A Unesco há muitos anos passou a incluir a cultura como pauta estratégica para sociedades humanas que almejam conquistar um patamar economicamente forte, socialmente justo e ambientalmente equilibrado.  

O desenvolvimento de uma nação está diretamente associado à idealização de um modelo de civilização, e todo desenvolvimento material corresponde a um dado desenvolvimento intelectual. Cultura e conhecimento são alicerces imprescindíveis para o desenvolvimento nacional. O conceito de desenvolvimento sustentável é, por si só, uma crítica a um desenvolvimento voltado apenas para a acumulação capitalista.  

A qualidade de vida que todo mundo deseja, enfim, dependerá sempre das ideias predominantes sobre o valor da vida e sobre a maneira como a sociedade se organiza para satisfazer as necessidades e as demandas humanas, da sensibilidade desenvolvida para reconhecer e institucionalizar os direitos sociais. 

Centralidade da Cultura

A cultura é central para o desenvolvimento do país, é parte indissociável do nosso projeto de nação. A disputa de valores é necessária e fundamento da democracia e do processo emancipatório capaz de sobrepor os interesses do povo brasileiro a esse projeto mesquinho, antipopular, antidemocrático e contra nossa soberania, voltado apenas para atender a usura e os interesses do grande capital. 

A cultura também é relevante porque gera uma das economia mais pujantes do planeta. Uma economia complexa, caracterizada por forte associação com o conhecimento, movida pela criatividade e pelas ideias, com conexão com praticamente todas as dimensões da vida humana, impulsionada por um desenvolvimento tecnológico vertiginoso e com altos níveis de monopolização. 

O espantoso desenvolvimento dos meios de comunicação e das tecnologias digitais, desde a segunda metade do século passado, vem modificando os processos culturais e criou as bases para um novo ciclo de planetarização e intercâmbio cultural entre as nações e as culturas do mundo, a cujas consequências ainda hoje estamos a nos adaptar.

Nesse mundo cada vez menor, mais integrado, somente a cultura pode nos distinguir e é um ativo poderoso para o nosso desenvolvimento, para a vida democrática, para a justiça social, para o desenvolvimento econômico e para a sustentabilidade.  

Vista por um outro lado, a cultura em sua diversidade, é a argamassa que dá liga e fundamenta a coesão da nossa sociedade e é a base da identidade do povo brasileiro. É o fundamento sobre o qual está assentado o sentimento de pertencimento à mesma nação. 

Devemos considerar que a cultura é uma instância, uma dimensão da vida social e um direito de todas as pessoas reconhecido como fundamental na Declaração dos Direitos Humanos da ONU. 

A cultura qualifica as relações sociais, dá sentido e razão à vida coletiva e estabelece vínculos entre o passado, o presente e o futuro; satisfaz necessidades subjetivas e faz parte das condições para a plena realização da condição humana. 

A Cultura é policêntrica, multifacetada e pluridimensional e precisa ser considerada, em sua amplitude e complexidade, como dimensão simbólica do país, como direito de todos e como uma economia. 

Destruição de valores e racismo

A extrema-direita representa as energias cáusticas e destrutivas que estão emergindo com força em várias partes do mundo neste início do Século XXI, como consequência da crise e dos impasses do capitalismo, incapaz de resolver os grandes problemas da humanidade. Essa extrema-direita demonstra ter aversão às liberdades conquistadas e às novas emancipações demandadas pela humanidade.  

No Brasil, essa extrema-direita manifesta um racismo atávico e uma tendência a aceitar como natural a desigualdade social herdada do longo período da escravidão. Repudiam e recusam toda a rica contribuição cultural vinda da África com os africanos que aqui chegaram nos porões dos navios negreiros como escravizados.  

Também rechaçam e repelem a importância das contribuições dos povos originários igualmente basilares e fundamentais, sem as quais o Brasil não existiria enquanto nação e enquanto povo. 

Diversidade e singularidade brasileira

Esses legados seminais foram se modificando, se misturando e se amalgamando na vivência do dia a dia em todo o território, desde os primeiros momentos da formação do Brasil. 

Estas contribuições estão presentes em todas as dimensões da vida brasileira, em todo o território, de muitas maneiras e com diferentes intensidades. Estão presentes e se manifestam no jeito de ser, na sensibilidade, no comportamento. 

Se manifestam na alegria corporal, na sensualidade, na criatividade, na religiosidade do povo, na gastronomia, em praticamente toda a cultura deste país de dimensões continentais e nas artes brasileiras, inclusive nas artes e criações contemporâneas. 

É essa riqueza e essa complexidade que chamamos de diversidade cultural brasileira. 

O futuro do Brasil

A direita autoritária e neoliberal compreendeu  às avessas a importância da questão cultural. Eles negam o País e querem apagar nossas heranças culturais e dissolver as múltiplas identidades que compõem a nossa diversidade cultural, nossa maneira de ser. Querem se desfazer da vitalidade e dessa riqueza cultural brasileira e falam em passar o Brasil  a limpo, apagar nossa memória e extinguir nossa singularidade. Querem fazer do Brasil uma não-nação.  

A chamada guerra cultural tem tido um efeito devastador, naturalizando a desigualdade social sem nenhum pudor, estimulando o individualismo, o ódio aos diferentes e afirmando uma visão de mundo desprovida de valores, adotando os paradigmas mais reacionários, muitos deles pré-iluministas.  

Procuram enfraquecer o Estado nacional e apagar, fazer com que deixe de existir, o sentimento de pertencimento a uma mesma nação.  

Estão tentando, como o nazismo e o fascismo fizeram no passado, produzir uma grande inversão de valores. Onde tem vida, pregam a morte. Onde tem democracia, pregam regimes autoritários, onde tem afeto, compreensão, diálogo, solidariedade e integração, pregam e praticam o ódio, a violência e a destruição dos valores construídos pela humanidade no decorrer de sua história.   

Para isso, defendem a morte, a violência, o cerceamento da liberdade de expressão. E, por isso são contra a ciência, a inteligência  e o conhecimento, praticam a discriminação e estimulam o individualismo e os valores mais reacionários. 

Essa extrema-direita é distópica por natureza e representa o instinto de morte. Se choca com tudo que a humanidade vem conquistando, deseja conquistar ou valoriza em termos de liberdade, qualidade de vida, alegria, prazer, paz, ternura, afeto, convivência civilizada, comunhão etc..

 O Brasil que queremos!

Para enfrentá-los com sucesso, os que desejam um país democrático terão o desafio de ampliar e atualizar o conceito de política e o âmbito do diálogo com a sociedade. 

O processo político de afirmação da democracia terá que adquirir uma grandeza e uma amplitude que não se restrinja a uma certa distribuição de renda e ao aumento relativo do poder aquisitivo dos trabalhadores mais pobres. 

O Brasil não será historicamente bem sucedido, uma nação democrática, socialmente justa e ambientalmente sustentável sem um compromisso com uma ampliação e equalização das oportunidades e direitos entre todos e todas. A política deverá promover processos de construção de uma consciência contemporânea que seja capaz de enfrentar os grandes desafios que nos afligem como povo e a questão cultural deverá ser tratada com a importância que tem. Só assim poderemos  empoderar a sociedade de valores, sonhos e desejos e contribuir para um grande movimento libertador que impulsione o Brasil para frente em direção às utopias humanas.  

Além desse processo cultural libertador, será necessário propiciar uma educação igualmente libertadora, qualificada e contemporânea, assim como, uma democratização da comunicação que possibilite o acesso a um outro nível de informação. 

Sem essa ampla renovação e qualificação da política não seremos capazes de avançar nas relações sociais, na garantia de direitos e na inclusão de todo o povo brasileiro para possibilitar a consolidação da democracia entre nós.  

Para retomar e refazer o caminho da construção do projeto coletivo no Brasil, temos que fortalecer no dia a dia da sociedade e no imaginário popular os valores mais profundos de igualdade, fraternidade, solidariedade, justiça social e a afirmação  de uma só humanidade em meio a diversidade. Seres humanos livres, conscientes e felizes, em vez de seres humanos prisioneiros de pobres ilusões e falsas promessas de felicidade do capitalismo, vivendo vidas medíocres enquanto escravos do capital,  sem valores, nem princípios éticos e correndo atrás das miragens como a exacerbação do consumo fútil, a acumulação de riqueza material, o egoísmo, o narcisismo, a disputa e a concorrência com os semelhantes. 

Os movimentos socioculturais, os intelectuais, as organizações políticas da sociedade, os partidos do campo democrático deverão trazer as questões culturais e a disputa de valores para o centro da ação política como expressão da própria democracia e de um projeto de felicidade para todo o povo brasileiro. 

Como um imperativo histórico, vamos ter como desafio no futuro próximo algo que, embrionariamente já está em curso, uma disputa de projetos estratégicos para o país e para a sociedade, a construção de novos paradigmas, chegando até o plano individual, das pessoas, partindo dos direitos e necessidades materiais e incorporando o direito à felicidade e à alegria como um conceito claro do que seria a sociedade que queremos e que possibilita a felicidade  pública e coletiva.

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