Falta de debate na TV só beneficia picaretas

A História Republicana brasileira é recheada de personagens que controlaram – e ainda controlam - o poder no país pela força dos meios de comunicação. E não falo apenas de Assis Chateaubriand, que entre as décadas de 1940 e 1960 colocou todos os presidentes de cócoras para atender aos seus interesses, alguns inclusive criminosos, conforme relatam seus biógrafos. 

Dispensável também é qualquer citação à influência da família Marinho na vida política nacional, destruindo democracias, manipulando a informação, ocultando fatos, fabricando suas próprias verdades em horário nobre. Os detentores dos meios de comunicação nas cidades do interior também reproduzem fielmente aquilo que, em escala nacional, aprenderam com os grandes tubarões da mídia brasileira. E assim, conjugando interesses comerciais e verbas públicas de publicidade, essas corporações vão corroendo os pilares das instituições democráticas, a começar pela indução do eleitor ao erro na hora de votar.  Indução ao erro, sim! 

É isso que a Globo, o SBT e a Record estão fazendo quando negam aos candidatos a oportunidade de debaterem seus projetos com milhões de telespectadores que, desta vez, estarão privados deste serviço de utilidade pública por uma simples manifestação da vontade dos Marinhos, Macedo e Abravanel da vida. 

No meio desta pandemia, a tecnologia já provou ser capaz de substituir o contato presencial por encontros virtuais sem perda de conteúdo ou substância. O debate na TV é algo tão indispensável na política brasileira, pois é ali que o eleitor tem contato direto com um candidato que não pode se esconder na previsibilidade da estratégia de campanha, onde o que funciona é a cabeça do marqueteiro.  

A Constituição Federal, em seu artigo 175, estabelece condições para a concessão de serviços públicos, o que evidentemente vale para todas as emissoras de TV no Brasil. E a regulamentação desse dispositivo, através da Lei 8987 de 13 de fevereiro de 1995, reafirma a obrigação de as empresas concessionárias prestarem serviços de informação individuais ou coletivos, em defesa dos interesses da sociedade. Está lá no artigo 7º §2, relativo aos direitos e obrigações dos usuários.  

Só candidatos estúpidos, cagões, mentirosos profissionais se beneficiam da falta de debates na TV. Jair Bolsonaro não quis enfrentar Haddad num duelo televisivo por conta disso. 

Assim, usando uma rede criminosa de distribuição de fake news, o povo não teve acesso ao verdadeiro (ou falso) Messias, e o resultado é este pesadelo que estamos vivendo. O bispo Macedo não quer debate em sua emissora de TV para proteger o sobrinho Marcelo Crivella, o atual prefeito do Rio que vai perder já no primeiro turno, tão incompetente foi o seu governo.  

O horário gratuito de rádio e TV, que de gratuito não tem nada, é incapaz de formar opinião junto aos eleitores. Comparativamente falando, o que se vê ali é propaganda de produto, como um sabonete ou uma marca de cerveja, onde os marqueteiros depositam todas as suas experiências  acumuladas de vendas para o varejo, principal atividade profissional da maioria deles.  

A História é repleta de casos que confirmam o que minha experiência em mais de 30 anos atuando no setor comprovou na prática: o que decide eleição é o debate na TV. 

A recusa dos concessionários dos serviços públicos que operam as emissoras de televisão, não pode ser uma mera decisão empresarial. Ela fere princípios constitucionais, contraria os interesses da sociedade, e espero que os partidos políticos prejudicados ingressem com uma ação coletiva no Tribunal Superior Eleitoral para garantir a realização dos debates ainda no primeiro turno.